I – CONTEXTO DO EMPREENDIMENTO
A FAB adquiriu dos Estados Unidos 12 aeronaves P-3 C Orion, em substituição aos aviões de patrulha marítima P-16, desativados há seis anos. Como as aeronaves foram compradas "vazias", a Força Aérea iniciou o "Programa de Modernização das Aeronaves de Patrulha Marítima P-3 Orion" que passa pela contratação dos melhores sistemas a serem instalados a bordo e em terra para suprir os requisitos operacionais das missões de patrulhamento marítimo de superfície e anti-submarino, de operações de busca e salvamento, de combate ao contrabando e ao narcotráfico, de combate à exploração pesqueira ilegal, de apoio em situações de calamidades, de apoio à Marinha Mercante, e de suporte a operações do SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia).
A aeronave P-3 C Orion, um clássico da Patrulha Marítima, tem sua eficiência comprovada por mais de 400 unidades em operação em 16 países, entre eles EUA, Holanda, Espanha, Austrália e Canadá, sendo capaz de realizar missões acumulando até 20 horas de vôo contínuo sem necessidade de reabastecimento, apresentando grande capacidade de sobrevivência em caso de falhas e, portanto, , totalmente adequada às necessidades das missões de patrulha ou vigilância marítima.
Em 30 de maio de 2001, a FAB fez a entrega do Pedido de Oferta (RFP) às empresas interessadas em participar do programa de modernização das aeronaves de patrulha P-3 C Orion. As empresas interessadas foram: Alenia Difesa, da Itália; BAE Systems, da Inglaterra; Boeing Company, Lockheed Martin e Raytheon, dos Estados Unidos; e EADS-CASA, da Espanha.
Naquela oportunidade, a Embraer declinou de participar da concorrência justificando que não é sua atividade-fim a integração de sistemas em aeronaves usadas. Embora participe de programa de modernização (aeronaves F-5), este está vinculado à produção da aeronave batizada de "Super Tucano" (ou ALX) que possuirá os mesmos sistemas do F-5. Este raciocínio entretanto não se aplica necessariamente ao P-3 Orion. Em contrapartida, a Embraer apresentou uma solução própria: a aeronave P-99, baseada na plataforma ERJ-145, mas que segundo analistas da Força Aérea, não atinge todos os requisitos necessários ao cenário operacional brasileiro.
II – A POLÍTICA DE COMPENSAÇÃO COMERCIAL
A compensação comercial ("off-set") está sendo utilizada também no programa P-3 C Orion, respaldada na política e diretrizes estabelecidas pelas Forças Armadas, em especial pela Força Aérea, que tem feito exigências de compensação comercial, industrial e tecnológica nas suas aquisições de grande vulto.
Todos os projetos do programa de fortalecimento do controle do espaço aéreo brasileiro contribuem, por meio de acordo de compensação, para o desenvolvimento do parque industrial de defesa. De uma maneira, geral a Força Aérea tem incentivado a apresentação de ofertas que contemplem um "mix" de compensações diretas aplicadas ao projeto, compensações indiretas aplicadas ao setor aeroespacial de defesa, e de compensações não relacionadas, direcionadas para as demais áreas econômicas, industriais e de pesquisa e desenvolvimento do País.
A aquisição de produtos de tecnologia avançada, validados e consolidados, como é o caso dos P-3 C Orion, firmada através de contratos que contemplam cláusulas de transferência de tecnologia e executada com a participação de empresas nacionais de reconhecida experiência neste tipo de processo, proporcionam ao comprador a obtenção de competência tecnológica e à sociedade benefícios que são, na maior parte das vezes, superiores ao valor da própria compra.
A prática da compensação comercial possui em si um positivo aspecto psicossocial ao enfraquecer a contumaz crítica da imprensa de procurar contrapor os gastos com defesa à necessidade (real) de mais escolas, postos médicos e casas populares. Esquece-se de que a missão das Forças Armadas não é a guerra, mas a defesa de seu território centrada na dissuasão, e que esta é alcançada não somente pelas armas e sistemas de defesa, mas também pelo desenvolvimento científico, tecnológico e do domínio do processo da engenharia em sistemas de defesa.
III – A INDÚSTRIA NACIONAL
Processos bem sucedidos de transferência de tecnologia, como no caso dos Projeto SISCEA e SIVAM, já garantiram ao País a obtenção de status de independência em relação a outros países e grandes empresas internacionais, tendo proporcionado geração e multiplicação de conhecimentos e posicionado empresas brasileiras como integrantes de seletos grupos de fornecedores de tecnologia a nível mundial, trazendo economia de recursos e importantes ganhos econômicos e sociais para o país.
Por outro lado, as enormes dificuldades impostas ao desenvolvimento e à capacitação tecnológica das empresas nacionais de materiais e de serviços de defesa, tanto em razão do mercado internacional desbalanceado e muitas vezes excludente (acesso negado a tecnologias classificadas como estratégicas) como pela compreensível insuficiência de recursos governamentais para atendimento das necessidades de defesa, decorrentes da compatibilização com as demandas, igualmente importantes, dos campos econômico e social do País, constituem os principais óbices a serem vencidos.
IV – COMENTÁRIOS FINAIS
O Brasil necessita de uma solução rápida e de baixo risco para a Patrulha Marítima. Neste contexto, o "Programa de Modernização das Aeronaves de Patrulha Marítima P-3 Orion" da Força Aérea cumpre todos os papéis a que se destina: seu objetivo primário de atender a Patrulha Marítima no Brasil e do qual não deve e não pode se afastar, como também cumpre seu objetivo de fomentar a indústria de tecnologia nacional, alavancando exportações de bens e serviços de tecnologia dos quais hoje o Brasil depende externamente.
Os ganhos comerciais, científicos e tecnológicos resultantes dos processos organizados e controlados de gestão de transferência de tecnologia e contratos de compensação ("off-set"), previstos na solução P-3 C Orion, permitirão a um grande número de empresas nacionais e a outros setores da indústria e da sociedade, benefícios como desenvolvimento de tecnologias e negócios, criação de empresas, geração de empregos, intercâmbio tecnológico e científico com universidades e empresas nacionais e internacionais, desenvolvimento das relações comerciais entre países, diminuição da dependência tecnológica em áreas ligadas à soberania nacional, aumento das exportações de bens e serviços de tecnologia e maior participação de nossas empresas no mercado mundial de tecnologia e defesa.
O programa P-3 Orion deve ser entendido e praticado nesse contexto de tecnologias críticas a serem assimiladas e dominadas pelo país, bem como uma oportunidade estratégica para o fortalecimento da indústria nacional, nas suas mais variadas vertentes de atuação, sendo capaz de juntamente com outros projetos do governo, criar condições e sinergia para a formação de uma saudável rede (ou "cluster") de empresas fornecedoras (e exportadoras) de tecnologia, e como tal deve ser objeto de atenção, incentivo e de valorização por parte do MD, MDIC e de todo o Governo Brasileiro.