Rodrigo Lopes
Zero Hora
Um possível elo entre terroristas e traficantes brasileiros preocupa a Europa. O alerta é do embaixador francês Michel Miraillet, que esteve no Estado nos últimos dias visitando empresas e buscando parcerias. A África é nova rota do tráfico de drogas produzidas na América Latina. Intermediários em países como a Líbia, que se dedicam a introduzir a droga na Europa, pertencem a organizações criminosas com relações diretas com grupos como Al-Qaeda e o Boko Haram.
De setembro de 2007 a julho de 2013, Miraillet foi diretor de Assuntos Estratégicos e de Política de Defesa no Ministério da Defesa francês. Ele vê com bons olhos a criação da nova pasta dedicada à Segurança Pública no Brasil.
Como França e Brasil podem trabalhar juntos para combater a aliança entre grupos terroristas e traficantes?
A França e o Brasil trabalham juntos há muito tempo contra o terrorismo. E isso se desenvolveu de forma substancial na época dos Jogos Olímpicos no Rio. Podemos beneficiar o Brasil com um certo número de informações sobre vários indivíduos. E essa relação vai se intensificar. O que nos interessa, neste momento, são alguns grupos terroristas que tentam encontrar refúgio na América Latina.
De quais facções brasileiras e de que grupos terroristas estamos falando?
O Livro Branco da Defesa da França (que traz a estratégia do governo para segurança) tem como foco o combate a esse tipo de aliança. O PCC e o Comando Vermelho são grandes fatores de desestabilização no Brasil. O tráfico de drogas e sua projeção no continente africano são uma ameaça para a União Europeia e para a própria África. A cocaína alimenta as finanças de grupos como o Boko Haram e a Al-Qaeda.
O senhor acredita que o Estado Islâmico (EI) também recebe apoio do narcotráfico latino-americano?
Talvez. A droga passa pela Líbia. É muito difícil identificar, mas o Boko Haram e a rede Al-Qaeda com certeza. Esses grupos são uma ameaça para o Brasil. A criação do Ministério da Segurança Pública é, para nós, uma medida importante. A França e nossos serviços estão felizes em trabalhar com o ministro Raul Jungmann.
O senhor trabalhou bastante tempo no Ministério da Defesa francês. Podemos dizer que o país está mais seguro do que antes dos atentados de 2015?
Não sei se mais seguro, mas nunca baixamos a guarda. O problema hoje é que atos de terror são cometidos por indivíduos, o que é muito mais difícil de identificar. Não são mais grandes organização, como o EI, mas indivíduos. É preciso vasculhar mídias sociais. Os esforços nos últimos três anos foram enormes. Estamos mais seguros? Não posso dizer, porque amanhã podemos encarar outro (atentado).
Um problema histórico na França é o fato de muitos imigrantes não se sentirem integrados à sociedade. Isso abre as portas para serem cooptados por extremistas. Como resolver a questão?
Não é só isso. É também a crise econômica, como o Brasil sabe bem, as frustrações e preocupações dos jovens com o desemprego. Mas há uma vontade do governo de combater a utilização do Islã como fator de desestabilização. O governo pensa em uma reforma para melhorar as relações e identificar mesquitas onde há líderes extremistas. Mas é uma luta longa.