Ana Beatriz Magno,
André Hippertt e Fernanda da Escóssia
Publicado site da ADUFRJ
Associação dos Docesntes da UFRJ
Inverter a intervenção. Trocar os blindados e fuzis pela força da educação, do conhecimento, da arte e da ciência. Rejeitar soluções frágeis e temporárias e investir em políticas públicas com resultados sólidos e duradouros. Sem ingenuidade ou oportunismo.
Essa é a resposta que emerge da Universidade Federal do Rio de Janeiro para a intervenção militar que há duas semanas mobiliza tropas e espalha incerteza na cidade. A direção da Adufrj aponta os limites do modelo de segurança pública criado pelo governo Temer e quer mais do que apenas dizer não. Conclama a comunidade acadêmica a intervir na intervenção usando as armas – e os verbos – que ela pesquisa e nos quais acredita: educar e conhecer.
Inspirada por essa convicção, a Adufrj começa uma grande campanha. A primeira iniciativa já ocupa os muros do Canecão e conquistou o apoio de todas as entidades representativas de estudantes, professores e técnicos. Desde quinta-feira, uma faixa de 24 metros quadrados assinada por Adufrj, Sintufrj, DCE, APG (Associação de Pós-Graduandos) e Andes propõe, com criatividade, a inversão dos modelos de ação das forças de segurança. A ideia é ser uma obra aberta às diversas interpretações que a complexidade do tema exige. Com a parceria da reitoria, a campanha ocupará outros espaços da universidade e da cidade.
A Universidade é múltipla e seus pesquisadores atuam historicamente em áreas conflagradas pela ausência do Estado. Hoje existem 98 projetos de extensão mantidos pela UFRJ em comunidades. “Precisamos mais. O Rio de Janeiro precisa mobilizar todos os saberes para construir a paz e garantir a democracia”, resume o vice-presidente da Adufrj, professor Eduardo Raupp. A seguir, um boletim especial com oito páginas, seis delas dedicadas a imagens e reflexões que mostram a urgência de inverter a intervenção e intervir de modo ativo na construção da paz.
O PROCESSO DE CRIAÇÃO DA CAMPANHA n É da rua que vem a inspiração para a campanha da Adufrj contra a intervenção no Rio de Janeiro. Mais exatamente, dos grafites do artista britânico Bansky. Num deles, uma menina revista um soldado, mudando a perspectiva de quem é alvo e autor da revista. Diante das cenas frequentes de revistas de moradores, inclusive crianças, em comunidades, o designer André Hippertt juntou ao soldado de Bansky uma aluna de escola pública no Rio. No aniversário de 453 anos da cidade, a proposta de inverter a intervenção através do conhecimento é a perspectiva da campanha da Adufrj. A faixa da Campanha já está nos muros do Canecão. |
Uma intervenção no caminho da escola
As imagens capturadas pelo fotojornalista Fernando Souza gritam o que as autoridades não escutam: que há escolas, estudantes, professores no meio do caminho da intervenção. Ou, com a licença de Drummond, que a intervenção é a pedra no caminho do colégio. Por quatro horas, no dia 27, o repórter fotográfico percorreu a comunidade da Coreia, em Senador Camará, na Zona Oeste. Flagrou blindados e fuzis convivendo numa assustadora normalidade com estudantes uniformizados. É uma violência banalizada que já assusta estudantes da UFRJ moradores de áreas conflagradas. Bárbara Melo, aluna de Gestão Pública, não se conforma com o que vê da janela em Senador Camará.
Essa é a inversão de valores no Brasil! No RJ parece que esse trabalho está quase completo! Quando o povo de bem do Rio vai começar a revidar e expulsar esses defensores de Bandidos? Parabéns para quem gravou o vídeo
Local: frente do Clube do Botafogo, depois do shopping Rio Sul) pic.twitter.com/veW6k2oQrR
— Raphael Panichi (@PanichiRaphael) 3 de março de 2018
“Nunca morei numa casa que não tivesse uma marca de bala no portão”, lamenta. Perto de sua casa, por coincidência – ou por nenhuma coincidência – o grafite que inspira a campanha da Adufrj contra a intervenção se repete na cena de um menino de uniforme e mochila passando ao lado de soldados do Exército, em frente a um muro, emoldurado pelo abraço do Cristo Redentor.
Depoimentos:
As violações de direitos humanos são constantes na favela. Toda nossa rotina gira em torno do medo e da angústia. Isso altera nosso cotidiano e afeta nossa saúde mental. Hoje teve tiroteio. Minha mãe foi revistada na rua. São cenas cotidianas.
MATHEUS ROCHA, 22, aluno de Jornalismo e morador da Cidade de Deus
Está assustador, vejo as pessoas sendo abordadas na rua. Olham para todo mundo, a gente tem uma sensação de medo. Eu me pergunto como vai ser quando as aulas da faculdade começarem.
ANDREW MOURA DE AGUIAR, 23, aluno de Licenciatura em Dança e morador do Complexo do Alemão
Nota DefesaNet
Recomendamos a leitura dos arftigos:
Cel Montenegro – Segurança de Estado X Segurança Humana DefesaNet 2018 Link
GenEx Pinto Silva – Intervenção das Forças Armadas na Segurança Pública DefesaNet 2017 Link
GenEx R1 Pinto Silva – O Brasil e a Guerra Híbrida no Pós Guerra Fria DefesaNet 2017 Link
Boletim ADUFRJ – Inverter a intervenção: uma forma de construir a paz by Scribd