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Cel Montenegro – Responsabilidade da Imprensa no Contraterrorismo

 

Coronel Fernando Montenegro

Forças Especiais do Exército Brasileiro, ex-oficial de Inteligência do

Destacamento de Contraterror, Auditor de Defesa em Portugal,

Professor da Universidade Autónoma de Lisboa

O terrorismo transnacional, considerado como uma das principais ameaças à segurança internacional, é um tema de grande relevância sobre o qual é necessário refletir e  buscar as respostas adequadas  e sensibilizar a opinião pública, que é  elemento fundamental na legitimação do processo de decisão em regimes democráticos. Nesse cenário, o papel da mídia tem participação decisiva no sucesso ou fracasso no combate à ciberjihad.

Como sabe-se, o terrorismo não é um fenômeno recente, as alterações estão nos objetivos, métodos, meios utilizados e, nesse sentido, no seu impacto estratégico. O terrorismo transnacional, materializado recentemente pelos atentados de Istambul, Paris, Bruxelas e Nice, caracterizam essa evolução. O escopo é a provocar alteração no estilo de vida e nos valores das sociedades democráticas, fomentando o terror através da utilização de violência em larga escala e apresentando potencial capacidade de atuação a nível global.

Os métodos passam pela utilização das redes de contatos transnacionais, muitas vezes em associação com a criminalidade organizada e pelo recrutamento dos designados “foreign fighters” normalmente jovens radicalizados num contexto de desintegração social nas sociedades ocidentais.

Ao observar o contexto, também constata-se que a utilização dos meios apresentam mudanças. Depois da utilização de aeronaves civis nos atentados de 11 de setembro de 2001, aproveitando meios do próprio país alvo, destaca-se agora em complemento do discurso, a utilização acessível de recursos de redes criminosas.

Esse contexto, acrescenta uma dimensão muito relevante, o aproveitamento de novas tecnologias de informação e comunicação, que se manifesta de várias maneiras: propaganda imediata das ações realizadas atuando na componente psicológica da difusão do terror e do medo e utilização das redes sociais como meio de comunicação entre operacionais e instrumento de prospecção, recrutamento e radicalização.

Em face de esse cenário, fica claro que não há país imune a esta ameaça global e que a sua prevenção e combate exige cooperação internacional entre os estados, serviços de informação eficazes (essenciais para prevenir atentados terroristas) e o emprego de estratégias de resposta integradas, quer pelos Estados, quer pelos os órgãos de cooperação internacionais.

O combate ao terrorismo não se esgota apenas no isolamento desarticulação de redes terroristas e na destruição de sua capacidade criminosa, ele requer também uma política de cooperação internacional multifacetada, capaz de combater eficazmente o subdesenvolvimento, miséria e ausência do estado de direito, que são os contextos favoráveis ao devenvolvimento de muitas lógicasterroristas. Isso exige estratégias integradas que combinem ações diplomáticas, militares e policiais; abrangendo também ações de informação pública, de natureza econômica, financeira e social.

 

No tocante às estratégias de comunicação como forma de prevenção e resposta ao terrorismo transnacional, será necessário refletir sobre as necessárias linhas de ação para fazer face. Desde logo, merecem destaque as ações de propaganda que visam o desenvolvimento dos processos de radicalização e recrutamento e a contenção do impacto da violência que visa provocar o terror e o medo. Nessa matéria, os meios de comunicação social assumem um papel fundamental. 

 

O terrorismo jihadista, que já é em si uma forma de comunicação, corporiza a violência ao qual está associado em uma mensagem dirigida ao poder político, à população e aos simpatizantes da jihad. Essa mensagem possui objetivos diversos como condicionar o Estado às suas políticas, obter financiamento, aterrorizar as populações, instalar o ódio entre comunidades, condicionar ou influenciar o exercício do direito de voto, recrutar combatentes ou levar ao reconhecimento da liderança na jihad global.

 

A era da informação, com as televisões por satélite, acesso a todos os meios de comunicação através da internet e as redes sociais deu uma capacidade e eficácia assustadoras a essa estratégia. Por essa razão, Abu Mussab al-Zarqawi, um dos mais proeminentes teóricos do jihadismo global, no princípio dos anos 80 do século passado, já assinalava a necessidade do recrutamento de engenheiros, químicos, técnicos de informática e outros especialistas bem como uma forte necessidade em investir na capacidade de comunicação. Mais de 20 anos depois em julho de 2005, Ayman Al Zawahiri declarava estar a Al Qaeda em guerra, e mais da metade da mesma, tinha lugar no campo de batalha da mídia.

 

Desde então, as capacidades no domínio da comunicação aumentaram exponencialmente e os especialistas da Al-Qaeda são aprendizes comparados com seus rivais do Estado Islâmico. Por sua vez, a comunicação de massa gerou profundas alterações nas formas de comunicação dos terroristas, alargando novamente o palco de sua atuação e os destinatários de sua ação violenta, ampliando a mensagem dos seus autores e simplificando a logística necessária para diversas ações.

Previamente à chamada era da informação, um ato terrorista só tinha verdadeiro impacto internacional quando dirigido contra o poder político ou poder econômico e tinha tanto mais força quanto mais próximo atingia os núcleos do poder.

As vítimas eram em geral elementos com responsabilidade no governo, nas forças armadas, forças de segurança, serviços de informações, altos funcionários do estado ou destacadas figuras do mundo empresarial. Com a comunicação de massa, as organizações terroristas atingem os seus objetivos onde quer que atuem, desde que façam um grande número de vítimas e recorram ao uso da violência. Esta questão transporta-nos para outro plano, que é o da relação entre o terrorismo e a mídia.

É uma velha discussão que envolve temas complexos relacionados com Direitos Fundamentais como: direito à informação, direito da liberdade de imprensa, proibições legais (principalmente  à propaganda, apologia ou mesmo, a cumplicidade com o terrorismo), mas essencialmente,  uma questão ética e de ideologia dos profissionais da informação e da inteligência na filtragem das informações a serem difundidas  no tocante aos fatos e, principalmente, de imagens.

Os terroristas tendem a dar à mídia justamente o que a mesma deseja, sensacionalismo e audiência. Entretanto, se a postura da imprensa, em relação aos atentados atos terroristas minimiza a transmissão de imagens violentas, particularmente nas redes sociais, a verdade é que a capacidade de projeção das redes terroristas será significativamente diminuída.

O essencial é que se entenda que o atentado terrorista só por si e o imediato não tem outro efeito além daquele que é produzido sobre as vítimas, considerando-se que a violência terrorista é apenas o primeiro canal de comunicação. Aquilo que os terroristas procuram: a exploração política, econômica ou social do atentado; será tanto mais vantajosa quanto maior e mais detalhada a divulgação dos atentados.

Nesse contexto, os países democráticos deparam-se com o desafio de desenvolver uma consciência ética nos diversos órgãos de comunicação e na gigantesca massa que utiliza as redes sociais na tentativa de impedir ou reduzir a propagação da mensagem terrorista. Essa é uma ação altamente estratégica uma vez que, exercer um controle sobre os meios de comunicação, inclusive da internet, é obviamente incompatível com os princípios de suas sociedades.

                                                         

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