Na Sérvia, Bósnia e Kosovo, os políticos voltam a falar de guerra e divisão. Palavras de derrotados, para justificar o próprio apego ao poder. Vazias, mas, ainda assim, perigosas, opina o correspondente Frank Hofmann.O presidente da República Sérvia, Milorad Dodik, foi incluído pelo governo dos Estados Unidos numa lista negra, por obstruir a implementação do Acordo de Dayton, assinado em 1995, visando a paz na pequena nação balcânica da Bósnia-Herzegovina.
Em sua campanha pela separação do território que governa, uma região autônoma da Bósnia, Dodik parece apreciar a atenção dos diplomatas americanos, a qual pode até reforçar sua imagem de salvador dos sérvios. Agora ele está buscando validação na forma de um referendo pela independência.
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Para entender o que está por trás dessa manobra política, ajuda refletir suas consequências até o fim. Se a região autônoma da Republika Srpska se separar da Bósnia-Herzegovina, é provável que a outra metade do país, formada pelas minorias bósnia e croata, vá protestar.
O resultado seria um conflito, culminando provavelmente em derramamento de sangue. Em pouco tempo as forças policiais bósnias seriam dominadas, e as forças da União Europeia Eufor Althea, estacionadas no aeroporto de Sarajevo, provavelmente pediriam reforços.
As tropas militares da UE visam garantir a segurança e estabilidade na região, apoiando assim as autoridades bósnias. Casos elas não se vejam capazes de cumprir essa missão, a Eufor Althea pode rapidamente convocar o reforço de unidades de intervenção nos países participantes da missão. Num prazo de dias, um total de 1.200 soldados, em alerta nos países da Otan, poderá estar patrulhando as ruas de Banja Luka e Sarajevo, e, pior dos casos, intervindo militarmente.
Isso significaria a derrota dos planos de Banja Luka de soberania bósnio-sérvia. Para o líder sérvio Dodik, isso significaria provavelmente o fim político, já que seus apoiadores sérvios em Belgrado não mais poderiam assumir qualquer responsabilidade pelas ações do agitador.
O fato de o primeiro-ministro da Sérvia, Aleksandar Vucic, perseguir um curso pró-UE não parece impedir os políticos de Belgrado de falar de guerra. O presidente e supremo comandante militar Tomislav Nikolic recentemente ameaçou enviar o Exército nacional à cidade de Mitrovica, no norte do Kosovo, cuja minoria sérvia se sente em perigo.
Com a ajuda de doações russas, Belgrado planejava expedir um trem coberto de ícones ortodoxos e ostentando a mensagem "Kosovo é Sérvia", em 20 idiomas. O gesto foi interpretado como provocação, num território com 90% da população de etnia albanesa.
Agora os jornais de Belgrado voltaram a cogitar a separação, do resto do Kosovo, da área de dominância sérvia ao norte do rio Ibar. Também aqui, uma crise regional poderia redundar em violência.
O presidente kosovar, Hasim Thaci, tem igualmente adotado uma retórica beligerante nas últimas semanas: sem rodeios, ele comparou a política de Belgrado para o Kosovo com a anexação da Crimeia pela Rússia.
Se Belgrado tentasse tomar pela força o norte de Mitrovica, de predominância sérvia, os manifestantes albaneses tomariam imediatamente as ruas em outros enclaves sérvios incapazes de ser protegidos. Lá, eles enfrentariam forças de segurança sérvias à paisana, que as autoridades aparentemente já equiparam com armas leves.
O resultado seria um banho de sangue, com as tropas lideradas pela Otan sendo forçadas a pedir reforços, para proteger amplas áreas kosovares. Caso Belgrado mobilizasse seus militares, as forças da Otan rebateriam, o que desembocaria numa guerra sem vencedores.
O que todos esses cenários hipotéticos de crise têm em comum é que o desenvolvimento econômico das nações afetadas retrocederia pelo menos dez anos. Consequentemente, as sociedades nacionais não só se tornariam mais politicamente dependentes de sua grande vizinha, a União Europeia, como também passariam a precisar ainda mais dela, do ponto de vista econômico. As elites governantes, que vêm empregando uma retórica nacionalista, seriam despojadas de seu poder, alcançado o contrário de suas aspirações atuais.
A nova guerra de palavras nos Bálcãs é, portanto, mais do que uma coleção de slogans anacrônicos e vazios. Ela é feita das ameaças vazias de uma geração de políticos projetada para o poder nos anos 1980, quando a ex-Iugoslávia estava em pleno colapso.
O Estado socialista multiétnico entregou os pontos após quatro décadas de regime totalitário, porém seus caçadores de ouro nacionalistas sobrevivem até hoje. Pode ser que o tempo deles tenha chegado ao fim. No entanto, eles tentam distrair seus respectivos eleitorados da precariedade do próprio desempenho político, no tocante a empregos e prosperidade, usando uma retórica totalmente dissociada da realidade. No momento, não existem alternativas políticas. Mas isso pode mudar.