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Na África, China busca mais que matéria-prima

A visita de ano novo do ministro chinês do Exterior à África já é uma tradição. Neste janeiro o roteiro de Wang Yi pelo continente inclui Madagascar, Tanzânia, Zâmbia, Congo e Nigéria.

A Zâmbia, por exemplo, pretende se tornar um centro de transporte e logística no sul da África – agora contando com a ajuda prometida por Wang. Citado pela agência de notícias Xinhua, o ministro chinês afirmou, após um encontro com seu colega de pasta zambiano, Harry Kalaba, em Lusaka, que a "China é o parceiro mais importante e mais confiável da Zâmbia a caminho de um desenvolvimento independente e sustentável".

A África é o lugar em que a China mais investe. Segundo um porta-voz do Ministério do Exterior chinês, somente no primeiro semestre de 2016 Pequim fechou 245 novos acordos no valor de 50 bilhões de dólares no continente africano. O Império do Meio já superou, há muito, os EUA e as antigas potências coloniais europeias como principal parceiro comercial dos africanos.

No fim de 2016, foi inaugurada a ferrovia entre a Etiópia e Djibuti, construída por empresas chinesas; obras semelhantes estão em execução no Quênia e na Nigéria. Elas são tudo, menos altruístas, e sim parte do projeto Rota da Seda, com o qual a China pretende expandir suas vias de comércio com vista a se tornar a maior potência econômica mundial.

China como pacificadora?

Além de projetos de infraestrutura e acordos sobre matérias-primas, Pequim aposta cada vez mais em iniciativas militares, tendo estabilidade como palavra-chave. "Na estratégia da China para a África, agora a segurança também desempenha um papel importante. Isso reflete o pensamento chinês sobre temas e interesses globais", explica Angela Stanzel, especialista em assuntos chineses do Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), em Berlim.

Atualmente, Pequim tem participação em sete de um total de nove missões de paz das Nações Unidas na África: mais do que qualquer outro membro do Conselho de Segurança da ONU. A potência asiática está envolvida no Sudão do Sul, Sudão e Mali. Em Djibuti, no leste africano, atualmente constrói sua primeira base naval no continente, apoiando a partir de lá as missões de combate à pirataria no Golfo de Áden. Os EUA e a França também operam grandes bases militares em Djibuti.

Lucro à custa dos seres humanos?

De acordo com Stanzel, ao mesmo tempo em que visa proteger seus cidadãos na África, a China também quer enviar um sinal para o mundo. "Durante muito tempo o país teve uma imagem muito ruim, tendo sido criticado não somente pelos Estados ocidentais, mas também na África. Com o aumento de esforços, Pequim quer mostrar que é um agente global responsável."

Com ajuda econômica e mesmo fornecimento de armas, Pequim tem apoiado até agora também países que desprezam a democracia e os direitos humanos. "Se futuramente a China se empenhar ainda mais na África, então haverá o risco de as estratégias políticas e os valores europeus serem seriamente prejudicados", adverte a analista.

A prática das empresas chinesas na África é igualmente alvo de críticas. "Já houve muitas violações, por exemplo na proteção e segurança do trabalho nas minas. Os investidores se aproveitam dos nossos cidadãos, fazendo com que trabalhem por tempo demais, muitas vezes sem roupas de proteção", aponta o analista político zambiano Vince Chipatuka.

"Além disso, os muitos chineses que passam pelo nosso país, nossas cidades e vilarejos, tiram os empregos dos zambianos. Se a China quer investir por aqui, isso não deve acontecer à custa dos cidadãos." Chipatuka apela ao governo em Lusaka para que avalie os acordos com os chineses e para que haja mais projetos em parceria com empresas nacionais.

Possibilidades de cooperação

Angela Stanzel diz ver nas ambições chinesas também oportunidades para os europeus, por exemplo nas missões de paz. "Acredito que a China estaria até mesmo interessada, já que não tem nenhuma experiência nesse tipo de missão e em operações no exterior. Então se poderia reforçar os treinamentos conjuntos."

Segundo a especialista alemã, outras possibilidades de cooperação seriam as ações de evacuação em situações de emergência – como na Líbia, em 2011, quando Pequim teve que retirar milhares de seus cidadãos do país africano.

Também na cooperação para o desenvolvimento, os chineses poderiam recorrer à expertise dos países do bloco europeu. A estabilidade na África é um interesse comum de europeus e chineses, devendo ser discutida muito mais intensamente no futuro, frisa a Stanzel.

Imprensa chinesa fala em guerra após ameaça de Tillerson

A imprensa estatal chinesa reagiu com fúria nesta sexta-feira (13/01) às declarações de Rex Tillerson, indicado pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, para ser o próximo secretário de Estado. Durante sua audiência de confirmação no Senado, Tillerson ameaçou bloquear o acesso da China às ilhas artificiais que os chineses estão construindo no Mar da China Meridional e comparou a ação chinesa à invasão e anexação da Crimeia pela Rússia, no auge da crise política na Ucrânia.

"Você precisa enviar um sinal claro à China de que, primeiro, a construção de ilhas deve parar e, segundo, seu acesso a essas ilhas não é algo a ser permitido", afirmou Tillerson aos senadores. "O limite máximo é que águas internacionais são águas internacionais", disse.

Em resposta, o jornal estatal China Daily alertou que uma interferência americana "traçaria o rumo para um confronto devastador" entre China e Estados Unidos. Ao mesmo tempo, observou que Tillerson estaria "meramente buscando receber favores dos senadores e aumentar as chances de sua confirmação ao demonstrar intencionalmente uma postura rígida em relação à China".

Imagens de satélite revelam que a China trabalha intensamente na construção de instalações militares numa região cuja soberania é reivindicada por diversos países, como as Filipinas e o Vietnã.

Durante o governo do presidente Barack Obama, Washington alertou diversas vezes que as atividades chinesas são uma ameaça à liberdade de navegação. Aeronaves americanas realizaram diversos sobrevoos no local, o que Pequim considerou provocação. Washington, porém, não chegou a tomar uma posição sobre a questão da propriedade do arquipélago. O ex-presidente da petrolífera ExxonMobil, porém, afirmou que as ilhas "não são da China por direito".

"A menos que Washington planeje iniciar uma guerra em larga escala no Mar da China Meridional, quaisquer medidas para bloquear o acesso da China às ilhas serão idiotas", afirmou o jornal chinês Global Times em editorial. O jornal, que tem a reputação de refletir o ponto de vista dos membros mais beligerantes do Partido Comunista chinês, afirmou ainda que Tillerson deve "renovar suas estratégias nucleares se quiser forçar uma grande potência nuclear a se retirar de seus próprios territórios".

O Global Times já havia apelo ao governo em Pequim para que aumentasse seu arsenal nuclear após a ameaça de Trump de suspender a chamada "política de uma só China", considerada pelos chineses como a base das relações bilaterais sino-americanas, após uma controvérsia gerada por um telefonema entre Trump e a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen.

As reações das autoridades chinesas às declarações de Tillerson foram mínimas. Um porta-voz do Ministério chinês do Exterior observou que a tensões no Mar da China Meridional se acalmaram. "Esperamos que os países não regionais respeitem o consenso, que é do interesse fundamental de todo o mundo", afirmou.

O Global Times afirmou que, por enquanto, Pequim continuará a ignorar os comentários de Tillerson, mas alertou que, "se a equipe diplomática de Trump tratar as futuras relações sino-americanas do modo como faz agora, os dois lados devem se preparar para um confronto militar".

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