Ruben Berta, Renata Mariz, Carolina Brígido e Silva Amorim
O surgimento de novas facções criminosas, algumas dispostas a alianças mas também ao confronto com grupos antes hegemônicos, como Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, e Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, vem tornando os estados do Norte e do Nordeste grandes barris de pólvora. Das 25 facções identificadas dentro de penitenciárias federais, em levantamento feito pelo Ministério da Justiça no ano passado, 12 (48%) eram dessas regiões.
No caso do Norte, a posição estratégica na rota da droga, vinda de países na fronteira, como o Peru, torna a relação entre facções ainda mais complicada.
— O quadro de convivência harmoniosa entre o PCC e o CV foi quebrado no ano passado. Em seus estados de origem e nas regiões mais próximas, há um controle maior por parte dos chefes, que não querem confrontos de grande proporção, que chamem a atenção da mídia. Isso só resulta em prejuízo para os dois lados.
No Norte e no Nordeste, ainda que haja um pacto de convívio, as facções locais têm suas regras próprias. E, como são novas, ainda não têm a mesma experiência de grupos já consolidados, como os do Rio e de São Paulo — analisa Roberto Porto, promotor de Justiça de São Paulo, professor de Direito Processual Penal na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e autor do livro “Crime organizado e sistema prisional”.
Pelos dados do Ministério da Justiça, que constam da pesquisa “Mapa de Ocupação por Facção Criminosa”, o grupo Família do Norte (FDN), protagonista da chacina ocorrida em Manaus, é o sexto com maior número de chefes presos nas quatro penitenciárias federais de segurança máxima, com 13 integrantes. Ao todo, foram listados 504 detentos.
Apesar de a facção amazonense ter um pacto de convívio com a carioca — dois chefes chegaram a ser presos juntos, em 2015, em uma favela do Rio de Janeiro —, o grupo que comandou a chacina em Manaus segue regras próprias, como acontece em outras capitais do Norte e do Nordeste.
Medo de reação do PCC
Mestre em antropologia social pela Universidade Federal Fluminense e ex-integrante do Batalhão de Operações Especiais (Bope) do Rio, o pesquisador Paulo Storani teme uma reação forte do PCC no Norte, devido à importância estratégica da região. Nos últimos anos, a rota de cocaína vinda do Peru para a Amazônia ganhou força.
— O PCC funciona como uma grande franquia, que precisa manter o controle do mercado, da origem à distribuição. Vencer é eliminar a concorrência. E ali há uma relevância estratégica, é uma grande porta de entrada da droga.
Em estados como a Paraíba, já há duas facções locais. No estado nordestino, há a Estados Unidos e a Okaida, cujo nome é uma referência à organização terrorista Al Qaeda. Em 2013, a Okaida declarou guerra ao PCC, que tinha um pacto com o grupo rival local.
Apesar da presença dos grupos locais, as facções paulista e carioca seguem presentes na maioria dos estados. Os reflexos da ruptura ocorrida no ano passado refletiram-se com motins em prisões de Boa Vista, em Roraima, e Porto Velho, em Rondônia. As rebeliões culminaram num total de 18 mortos, alguns deles decapitados, como ocorreu em Manaus.