Por Marina Koren – Texto do Defense One
Tradução, adaptação, edição e título por Nicholle Murmel
Sempre no segundo semestre do ano, Estados Unidos, Canadá e Rússia conduzem exercícios militares no Polo Norte, próximo ao estado do Alasca. Dentro do cenário fictício, aeronaves de caça dos três países interceptam um avião comercial “sequestrado”, que passa do espaço aéreo russo para o americano.
Mas neste ano as manobras conjuntas não vão acontecer – é o que afirma o Comando de Defesa Aeroespacial da América do Norte (NORAD), organização conjunta das autoridades americanas e canadentes. Segundo o jornal canadense Fairbanks Daily News-Miner, as atividades foram canceladas pelo Departamento de Defesa (DoD) dos EUA e pelo primeiro-ministro canadense, Stephen Harper, por conta da intervenção de Moscou na Ucrânia.
O topo do planeta se tornou rapidamente um espelho das tensões globais bem mais ao sul. Na mesma época, no ano passado, o secretário de Defesa americano, Chuck Hegel, declarava que as forças militares dos EUA reforçariam os laços com a Rússia – um plano que não parecia tão absurdo. Afinal, em 2013 o Ártico supostamente não era mais campo de batalha político da Guerra-Fria.
Porém, em 2014, relações desgastadas entre Washington e Moscou por conta da situação ucraniana congelaram os planos de cooperação entre as duas partes no Ártico. Logo após a Rússia ter anexado a península da Crimeia, em março deste ano, os EUA suspenderam excercícios navais que aconteceriam no Oceano Ártico, cancelaram um encontro bilateral para operações com Guardas Costeiras e deixaram em aberto a parceria para resgate de submarinos na região.
Uma ruptura na cooperação com nações do Ocidente, no entanto, não desacelerou a busca russa por interesses nacionais. Moscou já tem o maior contingente militar de todos os países com litoral voltado para o Polo Norte, e está reforçando essa presença em ritmo bem mais veloz que EUA e Canadá. A Frota do Norte da Marinha russa contará com novos submarinos de ataque nucleares, e já está em andamento a restauração de instalações militares da era soviética. Segndo o jornal Moscow Times, nesta semana, o governo do país anunciou o início da construção de um complexo de bases militares na região – as primeiras estruturas novas desde que os postos soviéticos foram abandonados no fim da Guerra Fria.
Esse último desdobramento preocupa algumas autoridades americanas por conta dos interesses dos EUA na região, como a senadora republicana Lisa Murkowski, cujo estado de origem, o Alasca, é bem próximo às futuras bases russas. “Ainda que o investimento de Moscou em infraestrutura militar não signifique necessariamente hostilidades futuras, é mais do que evidente que os Estados Unidos não estão agilizando apropriadamente seus trabalhos no Ártico e investindo nessa área do globo onde atividades comerciais e internacionais estão aumentando”, declarou a senadora ao National Journal. Nesta semana, Murkowski compareceu à Conferência dos Parlamentares da Região do Ártico, um encontro semestral de representantes das nações polares sediado no Canadá.
Nenhuma das cinco nações com litoral no Ártico – Estados Unidos, Rússia, Canadá, Noruega e Dinamarca (via Groenlândia) – têm reivindicação propriamente dita sobre a área, que guarda 15% do petróleo mundial e um terço das reservas de gás ainda inexploradas. Porém, a Rússia já tentou expandir sua soberania, o que exige pedido junto às Nações Unidas comprovando que a plataforma continental do país avança mais de 230 milhas adentro do Oceano Ártico. O Canadá também considerou fazer o pedido formal.
No ano passado, China, Índia, Itália, Japão, Coreia do Sul e a União Europeia – também pensando em oportunidades econômicas – pediram formalmente por um lugar no Conselho do Ártico – um fórum para as nações polares. A senadora Lisa acredita que o interesse dessas nações deva forçar o governo americano a tomar uma postura mais séria acerca da prórpia política para o Ártico. “Estou preocupada com o fato de nós, como nação, estarmos rumo a um novo “momento Sputnik”, ela diz, se referindo à corrida espacial da década de 1960. “mas dessa vez estamos atrás de todos os países da região e mesmo de nações fora do Ártico, como China e Índia, que já investem em navio quebra-gelo e reconhecem o valor da região”, completa.
Os quebra-gelos da Guarda Costeira dos EUA, projetados para navegar e cortar águas congeladas, operam há anos além da via útil prevista de 30 anos, e estão deteriorando-se lentamente. Especialistas navais preveem que a frota de quebra-gelos expire até 2020.
Mas, os Estados Unidos já tomaram medidas para reforçar as políticas para o Polo Norte neste ano, em preparação para assumir a chefia do Conselho do Ártico em 2015. Em julho, o Departamento de Estado apontou o ex-comandante da Guarda Costeira, almirante Robert Papp, como representante do país para a região. Em agosto, o deputado do Partido Democrata, Rick Larsen, do estado de Washingrton e o republicano Don Young, do Alasca, pediram às autoridades, empresários e formadores de opinião das áreas ambiental, de segurança nacional, petróleo e gás para que atuem como conselheiros nas questõe nas propostas do Conselho do Ártico.
Para Larsen, não é surpresa que os russos invistam pesadamente no norte do globo. “Els reconhecem o potencial e as oportunidades lá”, declarou em entrevista por e-mail. “Os EUA continuam atrás… Os canadenses estão trabalhando em uma nova base naval e estão muito à frente de nós em termos de navios quebra-gelo”, explica.
Já Young – que insistiu para que se nomeasse um embaixador americano para o Ártico, não apenas representante – se dirigiu ao governo de Obama para aumentar os investimentos nas questões da região. “Infelizmente, quando tomarmos nosso assento na chefia do Conselho do Ártico em 2015, estaremos chefiando numa situação de atraso”, declarou o parlamentar por email.
Os Estados Unidos ainda não ratificaram a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, o que significa que, diferente de Rùssia e Canadá, o país não pode emitir reivindicações formais sobre o Ártico. A chefia de dois anos sobre o Conselho, no entanto, pode dar aos americanos alguma influência acerca do que os russos podem ou não fazer na região polar – coisa que não conseguem fazer em outras partes do globo.
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