O que fazer com Donbas, a região das províncias separatistas da Ucrânia? Mesmo que a trégua entre o governo em Kiev e os separatistas pró-russos na região carbonífera seja frágil, a questão do futuro das regiões do leste ucraniano em torno de Donetsk e Lugansk deverá vir à tona em breve.
O acordo assinado em 5 de setembro, em Minsk, não fornece uma resposta clara. A Ucrânia compromete-se simplesmente a executar uma "descentralização do poder". O Parlamento em Kiev deverá aprovar uma lei sobre um status especial para as duas regiões. Ainda não se falou sobre detalhes.
Os separatistas parecem entender que isso implica uma independência de facto. Foi o que o "vice-chefe de governo" da "República Popular de Donetsk", Andrei Purgin, deixou claro em entrevista à agência russa de notícias Interfax, na última segunda-feira: "Não se trata de um retorno como parte da Ucrânia".
O governo ucraniano vê a situação de outra maneira. A posição de Kiev pode ser descrita por meio da fórmula: mais autonomia, sim; independência, não. As razões para isso são óbvias.
Após a anexação da península da Crimeia por parte da Rússia, Donbas seria mais uma perda de território. Com mais de 3 mil mortos, de acordo com a ONU, a Ucrânia já pagou um preço alto para manter Donbas. Se abdicar dessas províncias, essas mortes poderiam ser vistas como "em vão". E Donbas, com sua riqueza de carvão e gás, é uma região importante para o abastecimento energético da Ucrânia. O país também depende da indústria pesada de Donetsk.
Sombras da Transnístria
Mas o fato é que a Ucrânia não conseguirá recuperar por meios militares as regiões separatistas – pelo menos não enquanto os separatistas forem apoiados com equipamento militar pesado e combatentes provenientes da Rússia.
Diante desse impasse, os acordos de Minsk podem levar a um "congelamento" do conflito, avaliam muitos observadores, e a Ucrânia compartilharia do destino de outras ex-repúblicas soviéticas. Particularmente a Transnístria é mencionada com frequência, uma região que se separou belicosamente da República da Moldávia desde o início da década de 1990. Internacionalmente, a Transnístria não é reconhecida, mas ela existe já há mais de 20 anos devido à ajuda econômica da Rússia.
O risco de um "congelamento" do conflito é grande porque isso é de interesse do presidente russo, Vladimir Putin, argumenta o especialista ucraniano Volodymyr Fesenko.
Já o especialista russo Fyodor Lukyanov vê a situação de maneira diferente. "Uma situação como na Transnístria traz muitas desvantagens para Moscou", afirmou à DW. Por um lado, a Rússia tem de apoiar financeiramente as províncias separatistas ucranianas. Pelo outro, isso leva a constantes tensões com o Ocidente. Ele avalia que a Rússia prefere manter Donetsk e Lugansk como regiões autônomas na Ucrânia.
Abdicar de Donbas pela Europa?
Os ucranianos estão agora diante de um doloroso debate sobre o futuro da região de Donbas. O debate não começou agora. Já em julho de 2010, o escritor ucraniano Yuri Andrukhovych causou sensação ao afirmar que, se forças pró-ocidentais assumirem novamente o poder em Kiev, então "à Crimeia e a Donbas deve ser dada a oportunidade de se separar". Na época, o ex-presidente pró-russo Viktor Yanukovytch, originário de Donbas, estava havia poucos meses no poder.
Para Andrukhovych, as pessoas na Crimeia e em Donbas seriam "parte de uma nação política russa" e a Ucrânia lhes seria "estranha e desinteressante". Ele foi duramente criticado por essas afirmações e, mais tarde, as relativizou.
Mas, quatro anos depois, quando a Crimeia já havia sido anexada pela Rússia e a guerra estava em pleno andamento em Donbas, Andrukhovych voltou a falar em prol da exclusão da região do território ucraniano. "Pode-se manter Donbas como parte da Ucrânia somente à custa de concessões fatais para o nosso futuro europeu", disse o escritor ao semanário ucraniano Dzerkalo Tyzhnia.
Em outras palavras: a região de maioria populacional pró-russa seria um freio para as pretensões da Ucrânia de se aproximar da Europa. Ele pediu um referendo. Caso haja uma separação, isso não deveria ser entendido como uma capitulação, mas como uma rejeição, sugeriu o escritor.
Ainda não existe nenhuma pesquisa de opinião sobre qual solução seria endossada pela maioria dos ucranianos. Na mídia há cada vez mais vozes que demonstram compreensão pela estagnação do conflito – como o conhecido blogueiro e jornalista Serhiy Leshchenko, do jornal online Ukrainska Pravda. Cuidadosamente, ele defendeu um "congelamento" do conflito. "Caso contrário, o resto da Ucrânia seria freado em seu caminho em direção à Europa", escreveu Leshchenko.
Poroshenko sinaliza concessões a rebeldes
O presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, sinalizou nesta quarta-feira (10/09) que está disposto a conceder certo grau de autonomia a regiões controladas pelos rebeldes no leste do país, mas não especificou detalhes. Ele anunciou que, ainda na próxima semana, enviará um projeto de lei sobre "autonomia temporária a distritos individuais nas regiões de Donetsk e Lugansk" ao Parlamento.
Poroshenko descartou com veemência, porém, a ideia de federalização e reiterou a integridade territorial da Ucrânia. "Não há nem pode haver conversações sobre federalização ou algum tipo de separação [territorial]", afirmou o presidente durante uma reunião de governo.
Ele reiterou que o acordo de paz assinado em Minsk na semana passada assegura que a Ucrânia é um Estado soberano e unificado dentro de suas atuais fronteiras. Isso vale também para as regiões controladas pelos rebeldes.
O presidente ucraniano não detalhou seu projeto de lei, mas um plano apresentado em junho incluía a proteção de língua russa, patrulhas conjuntas da polícia local e federal e a submissão de governantes à aprovação de representantes locais.
Essas concessões não são nada perto do que os rebeldes exigem. Eles buscam a total independência de Kiev, mas mesmo a proposta menos radical de federalização implica segurança própria e eleições para governantes.
Poroshenko também reconheceu dificuldades na manutenção do cessar-fogo, iniciado na última sexta-feira, mas creditou isso a provocações de "terroristas". Ele disse ainda que, de acordo com informações do serviço secreto ucraniano, cerca de 70% das tropas russas deixaram a Ucrânia desde o início da trégua, o que favorece os esforços de paz.
Apesar de vários indícios contrários, a Rússia nega estar apoiando os separatistas com armas e pessoal.