Tahiane Stochero
"[O Gripen] É uma nova dimensão. Não é como trocar um carro velho por um novo. É mudar radicalmente, completamente. É como sair de um carro para um avião. É uma nova geração, são novos conceitos, novas táticas, novas possibilidades", diz, em entrevista exclusiva ao G1, o tenente-coronel Carlos Afonso, piloto da Aeronáutica que testou e deu aprovação ao caça da empresa sueca Saab que será a nova aeronave de combate do Brasil.
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Segundo o oficial, o alcance de visão propiciado por diversos sensores e radares é o diferencial do caça: na cabine, a mais de 30 km do alvo, o piloto consegue ver na tela a aeronave que, por exemplo, deve abater.
"[Com o Gripen] Eu não estarei mais limitado ao meu alcance de visão, mas poderei ver muito mais longe de mim, tendo uma consciência antecipada do que está acontecendo", afirma o tenente-coronel.
Anunciado em dezembro de 2013 pela presidente Dilma Rousseff como o vencedor do projeto FX-2, após 15 anos de negociações, o Gripen passará a voar nos céus do Brasil a partir de 2018. Ao todo, serão comprados 36 aviões por US$ 4,5 bilhões (R$ 10,8 bilhões). A decisão ocorreu em virtude da aposentadoria, em 31 de dezembro de 2013, do avião mais potente que o país tinha até então: o Mirage 2000.
O Gripen concorreu com o F-18, da norte-americana Boeing, já usado pelos Estados Unidos nas guerras do Iraque e Afeganistão, e com o Rafale, da francesa Dassault, experimentado pela França nas intervenções no Mali, Líbia e República Centro-Africana. Mesmo com a novidade que trará ao país, ele leva desvantagem em relação aos ex-concorrentes. Além da reduzida experiência, não possui tecnologias já testadas em combate pelo Rafale e o F-18, que contam com maior capacidade de carga de armas e de combustível, que alcançam alvos muito mais distantes.
Adquirido por países sem tendência bélica, como República Tcheca, Hungria e África do Sul, o Gripen pousa em pistas mais simples e foi construído pela Suécia para que conseguisse fazer ataques a um alvo a até 700 km e retornar a base.
Apesar dos fatores negativos, o modelo sueco foi escolhido pelo governo Dilma devido ao menor custo de produção e manutenção, menor que o dos demais, e devido à transferência de tecnologia que, segundo o Ministério da Defesa, permitirá que o Brasil conheça e produza seu próprio caça e possa fazer as modificações que quiser no Gripen, colocando nele armamento nacional e aprendendo como se faz o avião.
Foi o coronel Afonso que recebeu a missão de verificar as capacidades do modelo e fazer um relatório detalhado, que passou pelas mãos do alto comando da Aeronáutica, do Ministério da Defesa dos governos de Lula e Dilma. Ele testou por 10 horas com o modelo D, uma versão anterior do NG (new generation), que o Brasil comprará, durante duas semanas em Linköping entre abril e maio de 2009. Antes disso, foram mais seis horas em simulador. Outros pilotos da FAB avaliaram o desempenho dos concorrentes.
Dizem que o Gripen NG é um conceito [porque o avião ainda será produzido]. Eu digo exatamente o contrário: estamos saindo na frente. Ele está na vanguarda de desenvolvimento, não estamos correndo atrás de nada. Ele é a evolução de todas as capacidades”, afirma o coronel, que atualmente comanda o esquadrão de F-5 da FAB em Canoas (RS)
“É uma arma de guerra, com certeza. É um possibilidade de dissuasão muito grande. E de projeção de poder”, afirma o coronel.
Alcance de visualização é diferencial
Entre os diferenciais do caça que o oficial destaca está a quantidade de informações, radares e sensores disponíveis ao piloto no Gripen. O avião tem sensores de guerra eletrônica, que além de captarem a presença de outros aviões, conseguem também identificá-lo.
O Gripen também pode receber ao mesmo tempo informações de sensores e radares que estão no chão muito distantes dele, ou até mesmo em outras aeronaves, permitindo que, ao se aproximar do alvo, o piloto já saiba de tudo. Essas tecnologias nunca foram usadas antes no Brasil: nas atuais aeronaves de caça do país, o alcance de visão do piloto nos céus está limitado a só o que o radar do avião consegue ver.
Ao decolar de Anápolis (GO) com a missão de abater uma caça de um país vizinho pela fronteira, mesmo ainda bem distante dela o piloto pode receber vídeos, imagens de radares e de sensores instalados no chão, nos aeroportos ou até mesmo de outros aviões civis e militares que estão na área, para saber com antecedência quais armas e qual tática empregará no abate.
Outra tecnologia que chamou a atenção do coronel Afonso foi um radar com zoom que, mesmo a 10 mil metros de altitude, permite que o piloto veja, por exemplo, uma pessoa caminhando na rua ou o prédio que deva ser atacado, em caso de conflito.“As empresas falam muito sobre a capacidade de armamento, mas o piloto de caça tem uma concepção diferente. O que deslumbra você é a eficiência e a eficácia. Não precisa ter muitas armas, mas é preciso ter precisão”, diz o piloto da FAB.
Ao contrário do F-5, que foi comprado na década de 1970 pelo Brasil F-5 como um caça tático e atinge em média até 1,7 vez a velocidade do som (cerca de 2 mil k/h), o Gripen chega a até mais de 2.450 km/h (2,2 vezes a velocidade do som). Segundo o coronel, consegue atingir até 10 mil metros de altura mantendo a velocidade alta. "É um avião que acelera muito rápido e consegue chegar a altas altitudes com alta performance, mantendo a velocidade alta”, afirma.
“Satisfação”
Segundo o oficial, o Gripen é "um avião muito fácil de se pilotar e de se controlar".
"Quando se está no ar, avaliar o que precisa ser feito demanda muita energia. O avião tem um software que percebe o que o piloto está fazendo e nos fornece as informações necessárias”, afirma o piloto.
“Em termos práticos, eu, que não tinha treinamento de reabastecimento em voo (uma mangueira liga dois aviões passando combustível de um para outro), consegui fazer isso no Gripen na Suécia. Para você ver como é fácil pilotar o avião”, acrescenta Afonso.
“Pessoalmente, foi uma satisfação muito grande voar uma aeronave como esta. É uma responsabilidade grande, porque suas capacidades e campo de visão são ampliadas. Você tem plena superioridade. É supremacia aérea completa”, garante ele.
“Você pode perguntar a todos os pilotos de caça o que eles querem: é a sensação de dever cumprido. E isso eu tive com o Gripen".