Jailton de Carvalho
BRASÍLIA E SÃO PAULO – O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciou ontem a criação de uma força-tarefa para apurar e julgar casos de violência em manifestações de rua. Batizada de Pronto Atendimento Judicial, a força-tarefa deverá atuar nos mesmos moldes dos juizados especiais instituídos em estádios de futebol no país. Cardozo fez o anúncio depois de se reunir coom o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e com os secretários de Segurança Pública do Rio de janeiro, José Mariano Beltrame, e de São paulo, Fernando Grella.
A criação da força-tarefa judicial faz parte do pacote de medidas que o governo federal começou a preparar depois do recrudescimento da violência em protestos de rua, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. A reunião de ontem teve a participação também do desembargador Flávio Sirangelo, representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e do advogado Cláudio Pereira de Souza, um dos dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A proposta de criação do Pronto Atendimento Judicial partiu de Sirangelo e teve imediata acolhida.
— A proposta que nós trouxemos é encaminhar soluções, dar agilidade à persecução penal das pessoas que cometem esses delitos, esses atos de vandalismo, de modo a que se encerre um período de impunidade que possa, eventualmente, ter acontecido — disse Sirangelo. O desembargador participou da reunião em nome do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa.
Segundo Cardozo, a proposta será submetida agora à apreciação dos presidentes dos tribunais de Justiça do Rio e de São Paulo. Os magistrados poderão fazer sugestões para ampliar a linha de atuação das forças-tarefas.
Mas a ideia é que os grupos reproduzam a estrutura operacional dos juizados instalados em estádios de futebol para conter os excessos de torcidas organizadas em meio às multidões de torcedores. Nesses casos, abusos são apurados e julgados em tempo recorde. Não está claro, no entanto, se as forças-tarefas terão poderes de estabelecer medidas judiciais drásticas como penas de prisão ou se apenas medidas cautelares, como restrições de direito. Cardozo reafirmou que o Estado tem o dever de garantir a liberdade de manifestação, mas não pode tolerar, em nenhuma hipótese, a violência e a depredação de patrimônio, como aconteceu em alguns dos mais recentes protestos.
FÓRUM EM BUSCA DE DIÁLOGO
Ele também anunciou a criação do Fórum Social de Diálogos das manifestações. O fórum deverá servir de espaço para que cidadãos comuns ou agentes públicos apresentem queixas contra excessos contra violência ou desrespeito de garantias individuais. A sugestão foi apresentada pelo procurador-geral e foi inspirada nos fóruns de debate sobre conflitos agrários. Durante a reunião, Janot disse que os fóruns serviram para facilitar decisões sobre posse de propriedades rurais e, com isso, reduzir tensões no campo.
O procurador-geral se comprometeu a apresentar os detalhes da proposta até o final do mês. Na semana passada, Cardozo anunciou a primeira parte do pacote de medidas anti-violência nas manifestações. Entre as propostas está a criação de um padrão de atuação das polícias militares do Rio e de São Paulo durante os protestos. O chamado protocolo de atuação das polícias dos dois estados, palcos das maiores manifestações até o momento, deverá servir de modelo para outras unidades da Federação.
O protocolo deverá definir questões que vão de posicionamento das tropas aos tipos de armas a serem usadas nas ações policiais. Na reunião da semana passada, surgiu a ideia de se aumentarem penas para quem comete danos ao patrimônio público e privado e para quem atacar agentes do Estado, especialmente policiais. Todas as sugestões deverão ser arrematadas até o final deste mês por um grupo especial formado por representantes do Ministério da Justiça, das secretarias de Segurança Pública do Rio e de São Paulo, do Conselho Nacional de Justiça, do Conselho Nacional do Ministério Público e da OAB.
ACUSADO DE AGREDIR CORONEL EM MANIFESTAÇÃO É SOLTO EM SÃO PAULO
A Justiça de São Paulo concedeu ontem liberdade ao estudante universitário Paulo Henrique Santiago dos Santos, suspeito de participar do espancamento do coronel da Polícia Militar (PM) Reynaldo Simões Rossi, durante protesto no último dia 25 na região do terminal Parque Dom Pedro II, no centro de São Paulo.
A soltura, segundo o juiz Alberto Anderson Filho, da 1ª. Vara do Júri, acontece após diligências que contribuíram para a elucidação do caso e pelo fato de o Ministério Público não oferecer denúncia contra o suspeito. Uma semana apos o fato, o mesmo magistrado alegou, após pedido de liberdade da defesa, “manutenção da ordem pública" para manter Santos preso.
"Tendo em vista que não foi oferecida denúncia pelo Ministério Público e que foram requeridas novas diligências para perfeita elucidação do caso, a fim de não causar constrangimento ilegal para o indiciado, com excesso de prazo que certamente ocorrerá, mediante compromisso de com- parecer mensalmente em juízo para informar e justificar suas atividades, bem como endereço, de estar presente a todos atos processuais e ainda de não participar de qualquer atos ou manifestações públicas, não frequentar bares, casas noturnas, locais de reunião e aglomeração de pessoas, exceto a faculdade que está cursando, concedo liberdade provisória ao indiciado disse o juiz na decisão desta quinta-feira.
Santos foi preso indiciado por tentativa de homicídio e associação criminosa após um protesto organizado pelo Movimento Passe Livre (MPL), pela adoção da tarifa zero no transporte público. Rossi teve a clavícula quebrada e ferimentos na perna e na cabeça. Santos nega ter participado das agressões. Ele era o único sem máscara entre os suspeitos de envolvimento no espancamento.
A defesa do estudante, feita pelo escritório Braga Martins Advogados, diz, em nota, que “em nenhum momento ele pode ser visto em cenas de agressão ou depredando o patrimônio público” e “quem aparece agredindo o policial é um indivíduo desconhecido e que está mascarado, sendo que Paulo estava sem máscara (por não pertencer aos Black Blocs) e inerte”.
Ação dos Black Blocs é reprovada por 93% da população, diz pesquisa
Direito às manifestações, porém, é defendido por 82% dos entrevistados no levantamento
BRASÍLIA – Pesquisa encomendada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) à MDA Pesquisa e divulgada ontem indica forte rejeição da população aos protestos violentos de ruas: 93,4% declararam que não apoiam a ação dos black blocs nas últimas manifestações no Rio de Janeiro e em São Paulo. De acordo com o levantamento, 91,5% acreditam que a forma de protesto dos mascarados não é legítima. Apesar disso, 81,7% defendem o direito às manifestações.
Dos entrevistados pela pesquisa CNT/ MDA, 53,8% acham que é necessário fazer uma reforma política e 83% estão muito preocupados com a corrupção — assuntos que mobilizaram as primeiras manifestações de ruas por todo país, em junho. O setor que mais precisa de melhorias, na opinião de 87,4% dos entrevistados, é a Saúde. Um percentual maior, de 91,5%, afirma grande preocupação com a violência. A pesquisa avaliou ainda outros assuntos. Um dos trunfos eleitorais da presidente Dilma Rousseff, o programa “Mais Médicos que trouxe profissionais de outros países para atuar no Brasil, é apoiado por 84,3%.
Em setembro, esse percentual era de 73,9%. Ao lado do Bolsa Família, o Mais Médicos teve destaque na última propaganda de TV do PT e deve ser utilizado não só para alavancar a reeleição de Dilma, mas também a campanha do ministro Alexandre Padilha (Saúde) ao governo de São Paulo. Apesar da polêmica com as entidades médicas, como o Conselho Federal de Medicina, 66,8% acreditam que os profissionais estrangeiros estão capacitados para atender a população brasileira, mas 46% acham que o programa está cumprindo apenas em parte seus objetivos.
Dos entrevistados, 90,6% afirmaram não conhecer ninguém que já foi atendido por um profissional estrangeiro do “Mais Médicos”. Foram entrevistadas 2.005 pessoa5 em 135 municípios de 21 unidades da federação, das cinco regiões, entre os dias 31 de outubro e 4 de novembro. A margem de erro da pesquisa é de 2,2%. (Fernanda Krakovics).