Os pilotos que estavam no comando do Airbus da Air France que caiu no Oceano Atlântico em 1º de junho em 2009 podem não ter compreendido corretamente que a aeronave entrou em stall (perda de sustentação) e por isso adotaram procedimentos equivocados que podem ter levado à queda do avião, segundo especialistas e técnicos em investigação de acidentes aéreos ouvidos pelo G1.
Conforme dados divulgados nesta sexta-feira (27) pelo BEA (Escritório de Investigações e Análises da França), que apura a tragédia, o alarme de stall tocou várias vezes durante os 3 minutos e 30 segundos que durou a queda. Primeiro, houve uma falha nos pitots, sensores de parâmetros, como altitude e velocidade, que passaram a enviar informações erradas à cabine.
Segundo o BEA, o último registro da caixa-preta é que o Airbus estava a uma velocidade de cerca de 200 km/h (10.912 pés por minuto).
onforme o presidente da Associação Brasileira de Pilotos e Proprietários de Aeronaves, George Sucupira, a tendência do piloto quando o avião está em stall é jogar o nariz da aeronave para baixo, ganhando assim velocidade e conseguindo obter a sustentação.
Mas os pilotos do AF 447 fizeram um procedimento diferente do padrão entre os pilotos em caso de estolagem da aeronave, conforme especialistas e técnicos em investigação de acidentes aeronáuticos ouvidos pelo G1. Os pilotos do Airbus do AF 447 determinaram em todos os momentos que fosse elevado o nariz da aeronave, segundo o BEA.
Os pilotos receberam duas indicações de velocidade diferentes por pouco menos de 1 minuto, possivelmente devido ao congelamento dos pitots.O texto divulgado pelo BEA não faz nenhuma análise sobre os fatos, apenas descreve como os pilotos agiram após o congelamento dos pitots, quando teve início a tragédia.
Informações erradas de velocidade
Como a caixa-preta registra informações de apenas dois pitots, o BEA divulgou que dois dos três pitots do Airbus congelaram. O terceiro pitot, que fica no lado direito da aeronave, possivelmente também deve ter tido problema. Eles passaram a enviar informações erradas à cabine. Neste instante, às 2h10min05s, o piloto automático desliga-se automaticamente e o alarme de stall dispara pela primeira vez.
Os pilotos perceberam que estavam com informações erradas sobre a velocidade e assumem manualmente o comando da aeronave. O piloto fala “eu tenho o comando” e sempre comanda a aeronave para subir. Onze segundos depois, diz: "perdemos as velocidades".
A velocidade nos mostradores caiu muito, conforme o BEA. Em seguida, o piloto que estava no comando da aeronave tentou chamar várias vezes o comandante de bordo, que estava dormindo.
“O piloto percebeu que as velocidades informadas estavam erradas e achou que, para evitar o stall, talvez por achar que a velocidade estava aumentando ou que o nariz estava baixo, pode ter colocado o nariz para cima”, diz Sucupira.
Perda de sustentação
Às 2h10min51s, o alarme de perda de sustentação tocou várias vezes. Às 2h11min40s, o comandante de bordo retornou à cabine, mas não chegou a assumir o comando. E, nessa ocasião, os valores de velocidade pararam de ser registrados. O Airbus entrou em stall totalmente e o avião começou a cair em uma velocidade vertical de mais de 10 mil pés por minuto, sempre mantendo a posição horizontal. Às 2h12min02s, o piloto no comando disse: “eu não tenho mais nenhuma indicação”.
Em alguns instantes, conforme explicam especialistas, o piloto faz ações de pique e comanda a aeronave para baixo, mas sempre mantendo a tendência de elevação do nariz.
A investigação não divulgou o motivo de os pilotos subirem a aeronave para mais de 38 mil pés e continuarem determinando que o nariz da aeronave se mantivesse para cima quando o Airbus entrou em situação de stall. O BEA não informou se os pilotos entenderam de forma errada o alarme de stall e se haviam recebido treinamento para atuar em situações anormais e de pane como essa. Em nenhum momento os pilotos conseguem recuperar a perda de sustentação da aeronave.
O presidente da Associação Brasileira de Pilotos e Proprietários de Aeronaves comenta um outro fato que pode ter contribuído para a queda. Um voo da Ibéria que fazia o mesmo trecho e havia decolado pouco antes do AF 447 deslocou para leste, pouco antes da tempestade. Já o avião da Air France virou para oeste, mais para dentro da tempestade.
O comandante de Boeing Élnio Borges, que integra uma associação de pilotos, aponta também que, "a reação imediata, quando há perda de velocidade em situações de stall, é abaixar o nariz da aeronave, para ganhar velocidade". Ele aponta outros fatores que podem ter interferido na tragédia, como a composição da cabine no momento em que acidente ocorreu. Segundo o BEA, apenas os dois co-pilotos estavam no local e o comandante, descansando.
A Força Aérea Brasileira informou que não iria se manifestar sobre o relatório divulgado pelo BEA. O Ministério da Defesa não respondeu ao questionamento do G1 sobre se iria comentar os dados.