Danielle Nogueira
CIDADE DO CABO
O diretor geral da Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês), o egípcio naturalizado britânico Tony Tyler, se diz preocupado com os problemas de infraestrutura no Brasil. Em entrevista ao GLOBO, na Cidade do Cabo (África do Sul), onde participou da 69ª Conferência Anual da organização, ele afirmou que privatizar aeroportos não é necessariamente a solução. Para ele, que está à frente da Iata desde julho de 2011, é preciso uma estrutura de regulação eficiente para evitar abusos nas tarifas. Ele critica o modelo de concessão brasileiro, pelo qual as outorgas pagas pelos concessionários serão investidas em aeroportos regionais. O subsídio cruzado, diz, fere princípios da Icao, órgão das Nações Unidas para o setor da aviação, da qual o Brasil é membro.
As duas principais companhias aéreas brasileiras tiveram prejuízo de mais de R$ 1 bilhão cada em 2011. O que explica um resultado tão ruim?
Os preços altos do combustível no Brasil são um grande problema. Cerca de 75% do combustível consumido no país são produzidos localmente. Então, por que é tão caro? No Brasil, o combustível representa 43% do custo total das aéreas. No resto do mundo, a média é de 33%. As empresas sofrem com isso. As taxas aeroportuárias (que as aéreas pagam) também tiveram alta significativa. Numa situação como essa, é muito difícil fazer dinheiro. Há ainda problemas de infraestrutura.
O governo brasileiro decidiu conceder alguns aeroportos para resolver falhas na infraestrutura. A concessão à iniciativa privada é a solução?
Não somos a favor nem contra a privatização em si. Há aeroportos bem-sucedidos que são controlados pelo governo (como o de Cingapura) e aeroportos bem-sucedidos controlados por consórcios privados. O ponto é que as receitas (de aeroportos privados) devem ser reguladas. No Brasil, foi pago um valor de outorga muito elevado nos leilões. A pergunta é: como os investidores terão retorno? Eles podem começar a cobrar tarifas maiores das aéreas, o que vai encarecer as viagens. Tem de deve haver uma robusta estrutura de regulação no Brasil para manter as tarifas em um nível racional. E, até agora, não temos visto isso. Estamos preocupados.
No Brasil, o vencedor é quem paga a maior outorga, e o dinheiro vai para um fundo cujos recursos serão usados na construção e reformas de aeroportos regionais e para subsidiar a atividade das aéreas que atuarão nesses aeroportos. O que pensa disso?
Está claro nos princípios da ICAO (órgão das Nações Unidas que fixa diretrizes para o setor de aviação e do qual o Brasil faz parte) que as aéreas devem pagar pelo uso dos aeroportos que usam, não para estimular aeroportos para outras empresas usarem. Algumas companhias que atuarem nos aeroportos privados brasileiros terão de pagar taxas ao concessionário para que ele tenha o retorno do dinheiro investido. E esse dinheiro será usado para viabilizar a atuação de outras empresas em outros aeroportos. Isso não está certo.
Como viabilizar os aeroportos regionais, então?
Estamos felizes que o dinheiro da outorga não será usado para pagar dívidas ou construir rodovias, por exemplo. Entendemos que ele será reinvestido no setor. Menos mal. Mas, se o governo brasileiro entende que construir aeroportos regionais será bom para o desenvolvimento local, então deve arcar com os custos e não fazer com que as empresas paguem por isso. As aéreas não são instituições de caridade.
A América Latina passa por uma onda de consolidação. Um menor número de empresas é ruim para os passageiros?
Isso é bom para o passageiro porque há competição em mercados-chave. E porque as empresas precisam ter saúde financeira para investir em novos equipamentos e serviços. O pior cenário é aquele em que as empresas estão lutando para sobreviver e a qualidade do serviço cai. As perspectivas para a região são boas. Estimamos lucro de US$ 600 milhões este ano, o dobro de 2012. E crescimento na demanda de passageiros de 9,8%
Há a perspectiva de alta das receitas auxiliares. Serviços antes gratuitos agora serão cobrados?
As pessoas estão dispostas a pagar por serviços adicionais. Se querem um assento mais espaçoso, podem pagar por isso. Antes, podiam reservar o mesmo assento de graça, mas ele poderia não estar disponível, já ter sido reservado. Agora, pagam e sabem que terão o serviço. As empresas identificaram como oferecer um produto melhor.
O plano de neutralização de emissões de CO² prevê metas diferenciadas para as companhias em função de seu crescimento. Em que categoria estariam as brasileiras?
Suspeito que as aéreas latino-americanas estariam na categoria de crescimento rápido, que terão tratamento diferenciado. Os detalhes serão acertados na reunião de setembro da ICAO.
– Ao retomar o crédito, o consumidor sabe que o mercado de trabalho não vai mais ter o mesmo boom de cinco anos atrás. As pessoas estão preocupadas em honrar os compromissos que já têm e estão preocupadas com a inflação – afirma Travassos.