Alberto Komatsu
Depois da greve de controladores do tráfego aéreo, em 2006, e, mais recentemente, escalas de pilotos no limite, que causaram transtornos aos passageiros em todo o país, agora é a vez, quem diria, de porcas e parafusos ameaçarem a operação de aviões e helicópteros. Uma norma do governo para coibir a importação desses produtos fabricados na China já afeta empresas de táxi aéreo e preocupa as companhias aéreas de voos regulares.
Maior empresa de táxi aéreo da América Latina, com 87 aeronaves, a Líder Aviação está com quatro aviões no chão, à espera da liberação da importação de porcas e parafusos de aço, certificados pelas fabricantes de aviões e componentes, que não têm similar fabricado no Brasil.
O diretor de materiais e logística da empresa mineira, José Luiz Lollato Malheiro, não soube estimar o prejuízo com os aviões parados. Como exemplo, cita que o maior helicóptero, para 18 passageiros e 2 tripulantes, custa R$ 3 mil por hora parada. São equipamentos voltados para o setor de petróleo, especialmente para as plataformas marítimas da Petrobras na região do pré-sal. O estoque de parafusos e porcas da empresa está em 20 mil peças, suficiente para cobrir 50% de sua necessidade.
De acordo com Malheiro, o gargalo teve início no dia 9 de maio. Foi quando o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) baixou uma norma enquadrando porcas e parafusos de uso aeronáutico num processo que pode levar até 15 dias para liberar a sua importação. Isso porque o Banco do Brasil tem de fazer uma análise desses produtos, que antes entravam automaticamente no país, sem burocracia ou procedimentos que atrasassem o seu desembaraço.
O MDIC informa que as importações de porcas e parafusos estão sujeitas ao regime de licenciamento não automático "para fins de acompanhamento estatístico das compras externas dos produtos desde o dia 24 de agosto de 2010".
Ainda conforme o ministério, no dia 9 de maio "houve, de fato, mudanças no tratamento administrativo aplicado às importações das mercadorias em questão". O MDIC extinguiu 16 destaques administrativos "que eram requeridos no momento da confecção das Licenças de Importação (LI)".
Malheiro conta que até o dia 9 a indústria aeronáutica conseguia importar porcas e parafusos porque um dos 16 destaques (uma espécie de classificação do tipo de produto) permitia que esses itens entrassem automaticamente no país sem a necessidade de análises ou procedimentos. Ano passado, o país importou em torno de 110 mil toneladas de porcas e parafusos das categorias incluídas nas normas do MDIC, sendo que 46% vieram da China.
No dia 9 de maio, o executivo da Líder diz que a extinção desses destaques colocou "todos as porcas e parafusos na mesma situação", exigindo a análise de técnicos do Banco do Brasil no prazo de 10 dias úteis. "Esse problema não é exclusivo da aviação, vai afetar outros segmentos da indústria, como de envasadoras de alta velocidade, que têm prazo de 24 horas para consertar uma máquina fabricada na Alemanha, por exemplo", diz Malheiro.
O diretor técnico do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea), Ronaldo Jenkins, diz que há risco de aeronaves da aviação comercial ficarem no chão. "É um absurdo essa resolução. Está todo mundo preocupado. Como fomos pegos de surpresa, as empresas não têm estoque regulador", afirma ele.
A Gol informou que não será afetada porque seu estoque de porcas e parafusos é maior do que a sua necessidade. A companhia tem 115 aeronaves. A TAM foi procurada, mas não retornou até o fechamento desta edição.
O Sindicato Nacional de Táxi Aéreo (Sneta) também está preocupado. O superintendente da entidade, Fernando Alberto dos Santos, afirma que o risco abrange tudo o que voa. "A necessidade desse tipo de produto (porcas e parafusos) é diária. Essa norma não está sendo racional. E estamos sujeitos a uma avaliação da filial do Banco do Brasil em Blumenau", afirma ele, questionando se essa agência terá capacidade para atender a demanda. O Snea e o Sneta têm audiência com o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, no dia 22 de julho. As duas entidades, contudo, defendem que a solução para esse problema é "para ontem".