Rebeldes sírios liderados por radicais islâmicos anunciaram na televisão pública da Síria a queda do presidente Bashar al-Assad e a “libertação” da capital Damasco, após uma ofensiva fulminante que pôs fim a mais de cinco décadas de regime da família Assad. Na manhã deste domingo (8), o paradeiro do presidente é desconhecido.
(RFI) Várias dezenas de pessoas reuniram-se no centro de Damasco para celebrar a queda do regime, mostram imagens da AFPTV. Elas derrubaram e pisotearam uma estátua do pai do presidente Bashar al-Assad, Hafez, que governou a Síria de 1971 até sua morte, em 2000.
Na Praça Umayyad, o som de tiros em sinal de alegria mistura-se com os gritos de “Allah Akbar” (“Deus é maior”). “Há muito tempo que esperávamos por este dia”, disse Amer Batha, contatado por telefone pela AFP na Praça Umayyad. “Não acredito que estou vivendo este momento”, afirmou o habitante, que começou a chorar: “É uma nova história que está começando para a Síria”.
Na televisão pública, os rebeldes anunciaram a queda do “tirano” Bashar al-Assad e a “libertação” de Damasco. Na sua declaração, afirmaram ter libertado todos os prisioneiros “detidos injustamente” e apelaram à salvaguarda dos bens do Estado sírio “livre”.
Eles haviam anunciado anteriormente no aplicativo Telegram “a fuga” de Bashar al-Assad e proclamaram “a cidade de Damasco livre”. “Assad deixou a Síria pelo aeroporto internacional de Damasco antes que membros das forças armadas e de segurança deixassem” o local, disse à AFP o diretor do Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH), Rami Abdel Rahmane.
A AFP não conseguiu confirmar imediatamente a partir de uma fonte oficial o paradeiro do presidente que governou a Síria com mão de ferro durante 24 anos e que reprimiu duramente as manifestações pró-democracia em 2011. Os protestos se transformaram em guerra civil, uma das mais violentas do século 21.
“Os acontecimentos extraordinários” em curso na Síria estão sendo acompanhados “atentamente” pelo presidente norte-americano Joe Biden, informou a Casa Branca.
Fim de uma era sombria
Desde o início da sua ofensiva em 27 de novembro, no noroeste da Síria, os rebeldes conquistaram rapidamente várias cidades importantes à medida que as forças do governo entravam em colapso. Os insurgentes lançaram um apelo aos sírios deslocados no exterior para voltarem “à Síria livre”. Desde 2011, o conflito causou meio milhão de mortes e dividiu o país em zonas de influência, com beligerantes apoiados por diferentes potências estrangeiras.
Em um vídeo publicado na sua conta do Facebook, o primeiro-ministro sírio, Mohamed al-Jalali, disse que estava pronto para cooperar com qualquer nova “liderança” escolhida pelo povo, especificando que estaria nos seus escritórios na sede da República Árabe Síria neste domingo de manhã para qualquer procedimento de “transferência” de poder.
“Depois de 50 anos de opressão sob o partido governante Baath, e 13 anos de crimes, tirania e deslocamentos, anunciamos hoje o fim desta era sombria e o início de uma nova era para a Síria”, disseram os rebeldes que infligiram um revés doloroso às forças pró-governo.
O líder do grupo radical islâmico Hayat Tahrir al-Sham (HTS), Abu Mohammad al-Jolani, à frente de uma coligação de rebeldes apoiada pela Turquia, apelou aos seus combatentes para não se aproximarem das instituições públicas, acrescentando que elas permanecem sob o controle do primeiro-ministro até à “transferência oficial”.
O Hezbollah libanês, um dos principais aliados de Bashar al-Assad, retirou simultaneamente as suas forças dos arredores de Damasco e da região de Homs (oeste da Síria), segundo uma fonte próxima do movimento.
Avanço inédito em poucos dias
A coligação de grupos rebeldes liderada pelo HTS, um grupo do antigo braço sírio do grupo Al-Qaeda, fez um avanço surpreendente em cerca de dez dias, capturando as grandes cidades de Aleppo e Hama antes de anunciar, na noite de sábado para domingo, ter tomado controle de Homs, a terceira maior cidade do país, e entrado na capital, Damasco.
Os rebeldes aproveitaram a retirada das forças do governo de várias regiões após a ofensiva lançada em 27 de novembro a partir da província de Idlib, o seu reduto no noroeste da Síria, apesar dos ataques aéreos realizados com o apoio da Rússia, aliada do regime, e operações terrestres contra setores insurgentes.
Ao sul da capital, perto da fronteira com a Jordânia, as tropas do governo também perderam o controle da cidade de Daraa, berço da revolta de 2011, para as forças locais, segundo o OSDH.
Em outra frente, na província de Deir Ezzor (leste), as forças do regime retiraram-se dos territórios sob o seu controle e as Forças Democráticas Sírias (FDS), dominadas pelos curdos, foram mobilizadas para lá. Com o apoio militar da Rússia, do Irã e do Hezbollah, al-Assad retomou uma grande parte do país em 2015 e, em 2016 toda Aleppo, cuja parte oriental havia sido ocupada em 2012 pelos rebeldes.
Um cessar-fogo estabelecido em 2020, viabilizado por Ancara e Moscou, trouxe uma tranquilidade relativa ao noroeste sírio.