Cel Maurício José Lopes de Oliveira
A importância de uma Nação possuir Forças Armadas modernas, bem equipadas e preparadas, e possuidoras de tecnologia militar independente ficou bem caracterizada nos conflitos do século XX, particularmente observada na Guerra das Malvinas (1982) e na I Guerra do Golfo (1991). Já no século XXI, pode-se observar cada vez mais como preponderante que as Forças Armadas possuam capacidades específicas para saírem vitoriosas de um conflito armado.
A tecnologia inovadora existente nos Materiais de Emprego Militar (MEM), principalmente os pautados por capacidade de guiamento inercial, Global Positioning System (GPS), TERCOM (guiamento por imagens de solo); as bombas termobáricas, os Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (SARP), alguns já com capacidade de abarcar inteligência artificial, além da “antiga”, mas temida bomba nuclear ou as modernas armas de destruição em massa são, atualmente, essenciais para que as potências de primeira grandeza possam efetivar a projeção de poder em suas áreas estratégicas.
Neste cenário do combate moderno, vários geopolíticos apontam o Atlântico Sul como uma área estratégica de grande interesse mundial no futuro, como se pode observar neste trecho abaixo:
No momento em que uma potência militar hostil ao Brasil ocupar a costa atlântica da África, em qualquer ponto – desde Marrocos até a África do Sul – começaremos a sentir, no nosso país, um clima de inquietação e de pressão bélica sem precedentes na nossa história. Isso porque, hoje, até mesmo uma base de foguetes médios instalada no saliente do oeste africano poderá ameaçar, facilmente, larga faixa do saliente nordestino (MATTOS, 2011, p.160).
Desta feita, percebe-se que o Brasil necessita, de fato, ter a capacidade de dissuasão por parte de suas Forças Armadas, principalmente em seu entorno estratégico, no intuito de preservar suas imensas riquezas, o seu povo e o seu território, em prol da soberania da Nação brasileira.
A costa brasileira é de grande importância para a Nação, na qual se encontram as riquezas minerais e marinhas, a vasta biodiversidade de valores incalculáveis; jazidas de petróleo do pré-sal ainda não totalmente exploradas, além de ser local para o escoamento de 95% do comércio exterior.
- Esta afirmação se consolida na Política Nacional de Defesa:
Por sua vez, a natural vocação marítima brasileira é respaldada pelo seu extenso litoral, pela magnitude do seu comércio marítimo e pela incontestável importância estratégica do Atlântico Sul, o qual acolhe a denominada Amazônia Azul, ecossistema de área comparável à Amazônia territorial brasileira e de vital relevância para o País, na medida em que incorpora elevado potencial de recursos vivos e não vivos, entre estes, as maiores reservas de petróleo e gás do Brasil (BRASIL, 2020, p.14).
- Já a Estratégia Nacional de Defesa ressalta que:
O Atlântico Sul é uma área de interesse geoestratégico para o Brasil. A proteção dos recursos naturais existentes nas águas, no leito e no subsolo marinho sob jurisdição brasileira é uma prioridade para o País. A dissuasão deve ser a primeira postura estratégica a ser considerada para a defesa dos interesses nacionais. A exploração e a explotação da Amazônia Azul e a utilização das linhas de comunicações marítimas do Atlântico Sul continuarão a ser vitais para o desenvolvimento do Brasil, exigindo a intensificação das capacidades de prover Segurança Marítima (BRASIL, 2020, p.33).
Alfred Thayer Mahan, historiador naval e geoestrategista norte-americano, ressaltava em suas obras a importância do poder naval para as Nações em um “jogo do poder” no tabuleiro geopolítico mundial. Conseguia prever a necessidade dos EUA e da China e demais países que possuem fronteiras marítimas darem uma grande importância às suas Marinhas de Guerra, como forma de se projetarem no mundo.
- Estudiosos no assunto reforçam a Teoria de Mahan e ressaltam a importância do Brasil estar preparado para o contexto geopolítico do futuro:
Em suma, a competição geopolítica contemporânea, com sua tendência duradoura a tensões e conflitos interestatais, enfatiza o caráter estratégico dos sistemas produtivos nacionais. Ao Brasil, um duplo e enorme desafio: retomar o vigor da atividade industrial e avançar nas áreas cruciais que possibilitam as condições materiais à estratégia de dissuasão extrarregional (AZEVEDO; RAMOS, 2022, p.37).
A soberania de nossa Amazônia Azul será alcançada com a interoperabilidade entre as Forças singulares, pautada na consolidação da doutrina de emprego conjunto e de estratégia, que empregue diversos meios que causem danos a um inimigo, desde o mais longe possível do litoral brasileiro. Esses meios precisarão ser adequados e possuir alto valor tecnológico, no sentido de as demais nações desistirem de uma investida sobre o nosso território pela capacidade de dissuasão causada por materiais de emprego militar, cada vez mais modernos e poderosos. Logicamente, as presenças de meios como aeronaves de 4ª e/ou 5ª geração, modernas fragatas e meios navais multipropósitos, navio aeródromo; mísseis antinavios e antissubmarinos instalados em plataformas terrestres, navais e aéreas, sistemas antiaéreos de médio e curto alcance, modernas aeronaves remotamente pilotadas e sistemas de comando e controle que abarquem as Forças singulares são vitais para o combate travado desde o mar.
Dito isso, nota-se que possuir uma fortalecida Base Industrial de Defesa (BID) é de extrema importância nos dias atuais e apresenta-se como fundamental para que o País, através da tecnologia e da inovação, obtenha a capacidade de dissuasão para a defesa da costa e do litoral brasileiro na Amazônia Azul que possui vastas riquezas marinhas, petrolíferas e de insumos de toda ordem, além de ser primordial para o comércio brasileiro.
Verifica-se, portanto, que as políticas públicas do Estado brasileiro devem cada vez mais incentivar a Base Industrial de Defesa brasileira e levantar soluções factíveis para garantir que as Empresas Estratégicas de Defesa (EED) possam garantir o sucesso dos projetos estratégicos, que conduzirão as Forças Armadas brasileiras a um outro patamar em seu entorno geoestratégico. Algumas dessas empresas de grande importância para a defesa do País precisam de apoio financeiro, no intuito de se evitar a falência e o desperdício de anos de desenvolvimento tecnológico e inovação. Iniciativas como o fortalecimento do Plano de Articulação e Equipamento de Defesa (PAED) que planeja e executa as compras associadas aos projetos estratégicos de defesa, ao mesmo tempo em que organiza e sustenta, com esses investimentos, o setor industrial de defesa no País, também é outra solução para este complexo tema. O desenvolvimento de projetos grandiosos no Brasil com a participação de empresas nacionais e estrangeiras e transferência de tecnologia também deve ser motivado e percebido como casos de sucesso, conforme os desenvolvidos atualmente pela Marinha do Brasil na construção de quatro fragatas classe Tamandaré, gerando empregos e desenvolvimento no Brasil.
Por fim, percebe-se que o tema é complexo e de relevância para o País já que é fator preponderante para a geração de poder nacional. Cada vez mais, o fortalecimento da indústria de defesa de uma Nação será diretamente proporcional ao quanto de tecnologias e inovações as suas Forças Armadas apresentarão em um campo de batalha no futuro, possuidor de aeronaves e mísseis com velocidades hipersônicas, veículos aéreos não tripulados cada vez mais versáteis, bombas inteligentes, materiais militares baseados em inteligência artificial e tropas possuidoras de demais meios robóticos. Investir na Base Industrial de Defesa será corroborar a geração de “força” e “poder” para a soberania da Amazônia Azul.
Cel Maurício José Lopes de Oliveira
O Cel Maurício José Lopes de Oliveira foi declarado Aspirante a Oficial da Arma de Artilharia, em 1999, pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Realizou o Curso de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) nos anos de 2014-2015. Após o curso da ECEME, foi instrutor da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (ESAO) nos anos de 2016-2017, quando foi designado para ser Assessor no Colégio Interamericano de Defesa, em Washington D.C., Estados Unidos da América. Ao retornar dos EUA, o oficial foi instrutor da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) nos anos de 2019 e 2020. Foi Comandante da Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea (EsACosAAe) nos anos de 2021 e 2022. Atualmente é aluno do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE) da Escola Superior de Guerra.