Ação contra o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, dizem, acontece em meio a esforço para despolitizar as Forças e retomar um clima de estabilidade interna
Marcela Mattos
Veja
3 Maio 2023
Militares do Alto Comando relataram a aliados estar perplexos e irritados com a operação da Polícia Federal deflagrada na manhã desta quarta-feira, 3, que teve entre os alvos o tenente-coronel Mauro Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.
A prisão de Cid, dizem, se dá num momento em que as Forças Armadas trabalham para criar um clima de estabilidade e despolitização após quatro anos de governo Bolsonaro. O trabalho vinha sendo feito principalmente “para dentro”, com o objetivo de recuperar os canais internos, já que há uma avaliação geral de que houve uma contaminação do bolsonarismo dentro das tropas.
A Operação Venire, da PF, cumpriu dezesseis mandados de busca e apreensão e seis de prisão na apuração de uma suposta associação criminosa que teria fraudado cartões de vacinação de Bolsonaro e seus assessores. O objetivo seria alterar os dados do Ministério da Saúde, de modo a indicar que o ex-presidente e seus auxiliares teriam sido imunizados com a vacina contra a Covid-19 e, dessa maneira, poderiam emitir certificados de vacinação para entrar nos Estados Unidos. Cid, conforme as investigações, seria um dos supostos fraudadores.
A operação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito das milícias digitais.
Segundo interlocutores, o comandante do Exército, Tomás Paiva, não foi previamente informado da operação. Tomás e Moraes mantêm um bom canal de diálogo – a decisão do ministro do Supremo de incluir os militares na Justiça Civil, no âmbito do inquérito do 8 de Janeiro, por exemplo, foi pactuada com a cúpula das Forças. Dessa vez, no entanto, não teria havido nenhuma combinação, o que foi recebido também como uma ação com o objetivo de criar instabilidades.
A comunicação ao Exército teria ocorrido apenas por volta das 6h, já com a PF na rua. Militares afirmam que a operação deveria ter sido feita em conjunto, de modo a minimizar o impacto nas Forças e criar uma “contenção de danos” entre os fardados. De última hora, um coronel foi alçado para acompanhar a operação.
A avaliação, por outro lado, não cria uma camada de proteção a Cid. Sob reserva, militares admitem que há indícios de que o tenente-coronel de fato cometeu irregularidades e merece ser investigado.
Prova disso seria o fato de que, logo ao tomar posse, o novo comandante do Exército impediu Cid de assumir um batalhão militar e o deixou “encostado”, para se dedicar a responder às acusações e também para desvincular as Forças Armadas das investigações. O entendimento, no entanto, é que a prisão preventiva de Cid, um militar da ativa, é uma medida extrema e também uma “provocação”.
Exército inquieto
Militares da reserva e da ativa mostram irritação com ofensiva do Ministério da Justiça e da Polícia Federal contra as Forças Armadas. Militares do Exército alinhados a Lula também estão incomodados
Edilson Salgueiro
Revista OESTE
04 Maio 2023
Militares do Exército alinhados a Lula também estão incomodados
A operação da Polícia Federal (PF) que culminou na prisão do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, causou irritação no Alto Comando do Exército.
Sob a condição de anonimato, militares da reserva e da ativa relataram a Oeste desconforto em relação à maneira como a PF conduziu a operação. Mas não para aí. Integrantes das Forças Armadas entendem que a escalada do Ministério da Justiça contra militares deve aumentar a temperatura na caserna.
“As Forças Armadas, alinhadas com o Ministério da Justiça e por um instinto de sobrevivência, estão adotando uma estratégia de entregar os anéis para preservar os dedos”, disse um coronel, referindo-se à operação que também resultou nas prisões de ex-seguranças de Bolsonaro: o ex-major do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros e o policial militar Max Guilherme.
A lista dos incomodados também inclui oficiais alinhados ao presidente Lula. Eles avaliam que o Ministério da Justiça e a PF desrespeitaram o Estatuto dos Militares. Segundo o artigo 74, por exemplo, somente em caso de flagrante delito o militar poderá ser preso por autoridade policial, “ficando esta obrigada a entregá-lo imediatamente à autoridade militar mais próxima, só podendo retê-lo, na delegacia ou posto policial, durante o tempo necessário à lavratura do flagrante”. “Por que prisão, e não intimação pra prestar depoimento?”, interpelou um general, referindo-se a Cid.
Os militares também se incomodam com o fato de o comandante do Exército, general Tomás Paiva, ter participado de um almoço com Lula no mesmo dia em que houve a operação da PF. “Faltou sensibilidade ao comando do Exército”, disse um general. “Isso gerou mal-estar na caserna.”
As cenas desta semana devem provocar o distanciamento entre os generais e as tropas, disseram os militares. “Ninguém aceita submissão, omissão e covardia”, indignou-se um coronel. “O que todos concordam é que se hoje a imagem do Exército está ruim, a culpa é dos generais.”