J. GUZZO
Revista OESTE
28 Abril 2023
O presidente da República e os extremistas que mandam e desmandam em seu governo têm um projeto de ditadura para o Brasil; na prática, é o único projeto que têm. Podem não ter ainda um plano de operações para isso, nem formulado de uma maneira coerente o que querem. Podem, neste momento, não estar fazendo reuniões para discutir a questão em termos concretos — o que realmente vai ser feito, quando, como, onde e por quem. Pode ser mais um conjunto de desejos do que um plano objetivo, realista e inteligente para se fazer uma coisa desse tamanho.
Com certeza, exige uma competência, coragem e noções básicas de eficácia que Lula não tem, nem o PT, nem a extrema esquerda que está à sua volta. Pode ser, também, que isso tudo exija um volume de trabalho que nenhum deles está disposto a encarar — ou apresente riscos que não querem assumir. Pode ser, enfim, que muita gente gorda do governo esteja mais preocupada em acumular dinheiro, já, do que em enfrentar as dificuldades de se meter num negócio desses. Acima de tudo, pode ser que não dê certo; querer é uma coisa, conseguir já são outros 500. Mas é isso o que eles estão querendo, pelo que mostra tudo o que têm feito até hoje em seus atos concretos no governo — uma ditadura no Brasil, com a máquina do Estado transformada em propriedade privada do PT e demais facções da esquerda, os interesses materiais da elite-pirata protegidos pelo novo regime e Lula promovido às funções de presidente vitalício, ou coisa parecida. Ele, e só ele — sem Lula, é claro, nada disso existe.
A demonstração mais recente, mais óbvia e mais didática dessa ditadura em construção é o projeto de censura que o presidente da Câmara, o PT e os partidos de esquerda, num desses cambalachos que dão ao deputado médio brasileiro a fama que ele tem, acabam de preparar para aprovação. (Leia a reportagem Censura a Caminho na Revista OESTE.) O relator do projeto sobre a “Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet” (é esse o nome oficial que deram para a lei da mordaça) é um deputado comunista. É preciso dizer mais alguma coisa? Como é possível achar que um deputado comunista seria capaz de defender alguma lei em favor da liberdade? Isso não existe — nunca existiu na história do comunismo, e não vai começar agora. De qualquer jeito, mesmo que o relator fosse o Arcanjo Gabriel, o veneno seria o mesmo para a democracia — a lei, para se falar em português claro e sem a muralha de hipocrisia que levantaram em torno dela, cria e entrega para o governo um mecanismo de censura no Brasil. Através dele o “Estado”, o que na prática quer dizer Lula e todo o seu Sistema, ganha o poder de decidir o que o cidadão pode ou não pode dizer na internet — e o que pode ler e ouvir. O governo fica autorizado a proibir, multar e punir qualquer postagem que classificar como sendo fake news, ou “desinformação”, ou portadora de conteúdo “nocivo”. Fica anulado, para todos os efeitos práticos, o artigo 5 da Constituição Federal, na parte em que garante a livre manifestação do pensamento. É o pior ataque à liberdade que o Brasil sofre em mais de 50 anos — desde o AI-5 do regime militar.
Do dia 1º de janeiro para cá já fez quatro viagens ao exterior. Sua mulher conseguiu gastar 200.000 reais de dinheiro público comprando móveis. Seu ministro das Comunicações pega jato da Força Aérea para ver exposição de cavalo
A esquerda diz que não é assim, claro; diz que quer levar ordem à “selva da internet”, eliminar a publicação de mentiras no Brasil, acabar com as “notícias falsas” e realizar outros objetivos virtuosos. Não é nada disso. Como poderia ser, se o próprio título da nova lei é uma fake news em estado bruto? Dizem lá: “Lei da Liberdade”, etc. etc. etc. — mas a partir da primeira linha já começam a cortar a liberdade. Por trás do seu palavrório pretensioso, semianalfabeto e desprovido de sinais de vida inteligente, o texto, para resumir esta ópera, não cria nenhum direito: só impõe obrigações, proibições e penalidades. Abre-se caminho, como órgão executor da censura, para uma aberração — um “Conselho Nacional” que passa a decidir o que é verdade ou mentira no Brasil. Na vida real, vai ser uma Delegacia de Polícia para proibir que se publique tudo aquilo que o governo não quer que seja publicado — ou você acha que o “Conselho” vai ser uma autoridade imparcial, com integrantes da oposição e livre de influências políticas?
Alguém pode acreditar, sinceramente, que um negócio desses vai abrir a boca quando Lula disser, por exemplo, que a investigação sobre os planos do crime organizado para assassinar o senador Sergio Moro e outras autoridades, executada pela Polícia Federal e Ministério Público, foi “uma armação do Moro?” E quando ele disser que a economia do Brasil não cresceu “absolutamente nada” em 2022 — vai ser fake news? Uma pista: o inquérito perpétuo do STF sobre as fake news já dura quatro anos inteiros, mas até agora nenhum militante de esquerda, nem um que seja, foi indiciado, ou sequer chamado para depor. Outra: nenhuma democracia do mundo tem lei para controlar a internet; todas as ditaduras, de Cuba à China, têm a sua. A pergunta que fica é muito simples. Estão querendo construir uma democracia ou uma ditadura, com a sua lei que instala a censura no Brasil?
A ideia de Lula e do seu Sistema não é dar um golpe de Estado, no estilo comum dos golpes de Estado que você conhece. Não haverá tanque de guerra na rua, nem tropa de fuzileiro naval tomando a central de luz elétrica, nem fechamento do Congresso ou de qualquer outra “instituição”. Não haverá sessão conjunta da Câmara e Senado para anunciar o novo regime — a ser descrito oficialmente, claro, como um esforço de heróis para salvar a “democracia” no Brasil. A intenção é construir a ditadura passo a passo, com atos administrativos, portarias do Supremo Tribunal Federal e da sua coleção de “tribunais superiores” de Brasília, de decretos-lei baixados pelo presidente e assim por diante. Vão anular leis aprovadas de forma legítima pelo Congresso — todas as que estiverem atrapalhando. Vão anular, por via do STF, até decisões anteriores do próprio STF, alegando que “o tempo passou” e a realidade agora é “outra”.
Vão multiplicar “medidas provisórias” dando mais poderes a si próprios, criar serviços de repressão na estrutura do Estado e impor a censura nas redes sociais, como exposto acima. Vão “interpretar” a Constituição de forma a tornar legal tudo o que querem e ilegal tudo aquilo que não querem. Vão eliminar direitos, enfiar adversários na cadeia por atos de vontade do Poder Judiciário e expropriar propriedade privada, através de bloqueios de contas bancárias, multas e providências de “desmonetização”. Em suma: vão construir, com despachos do Palácio do Planalto, sentenças do STF e trapaças no Congresso, uma ditadura legal — e, a partir daí, exigir que todos obedeçam à legalidade que eles próprios criaram. É isso, exatamente, o que têm feito há anos seguidos e, mais ainda, depois que foram para o governo. Tem toda a cara de tirania — ou algo tão parecido que não dá para notar a diferença.
As ações concretas de Lula como presidente não mostram um político no curso normal de sua atividade no comando do país — ou seja, tentando mostrar serviço, atrair apoio e ser reeleito na próxima eleição em cima das obras que entregou, das melhorias concretas que trouxe para a população ou dos resultados que o seu governo obteve. Lula e o Sistema “L” fazem o exato contrário de tudo isso. Por que estão agindo assim? A impressão é que o presidente não demonstra, no mundo das realidades visíveis, o mais remoto interesse em fazer um bom governo. Não trabalha, positivamente. Em quatro meses no Palácio do Planalto, conseguiu não gerar uma única boa notícia para a população, ou começar a obra sequer de um abrigo de ônibus. Seu governo é uma usina que produz desastres diários, está construindo uma crise econômica comparável aos grandes momentos de Dilma Rousseff e não tem a confiança de ninguém, a não ser de si próprio e da Rede Globo. Não fez o menor esforço para colocar no governo as forças que ficaram do seu lado por serem contra Bolsonaro — colocar mesmo, não fingir “consenso” nomeando nulidades como a ex-senadora a quem chamava de “Simone Estepe” e que, para efeitos práticos, não manda nem no quarteirão em volta do seu ministério. Cria inimigos que não tinha, e problemas que não existiam, a cada decisão que toma. Se está fazendo isso tudo é porque quer — ou, mais exatamente, porque não tem nenhuma vontade de fazer diferente. E se não tem vontade é porque acha que não é preciso.
Para que, de fato, esse perrengue todo de fazer um governo eficaz e de resolver problemas concretos, ou de dar atenção à maioria do eleitorado, se Lula acredita que pode ficar lá até o fim da vida com sentenças do STF, a delinquência dos presidentes da Câmara e do Senado e edições do Diário Oficial? Desde que foi tirado da cadeia, teve seus processos penais anulados por erro de endereço, e se viu transformado em presidente da República pelo STF, Lula tem certeza de que é Deus. Por que não teria? Ele sabe que nunca mais será processado, e muito menos condenado, pela justiça brasileira — faça o que fizer. Acha, em consequência, que tem direito a tudo, e que não deve e não vai dever nada; muito pouca gente, aliás, não acharia a mesma coisa se estivesse na mesma situação. É por isso que tem se comportado da maneira como vem se comportando. Não dá mais nenhuma atenção à opinião pública — um sintoma clássico do início de paixões pela ditadura. Do dia 1º de janeiro para cá já fez quatro viagens ao exterior. Sua mulher conseguiu gastar 200.000 reais de dinheiro público comprando móveis. Seu ministro das Comunicações pega jato da Força Aérea para ver exposição de cavalo. Colocou o Brasil como aliado aberto das duas maiores ditaduras do mundo, China e Rússia. Não gerou um único emprego, nem um centavo de investimento. Não resolveu um único problema, e não demonstra nenhuma vontade de resolver — e nem poderia mesmo resolver alguma coisa, com o ministério que escolheu e com as decisões que toma. Acha que pode dirigir pessoalmente a economia do Brasil — e até do mundo. Desenvolveu uma obsessão em armar vexames e falar coisas estúpidas em público. Um presidente assim, obviamente, está pouco ligando para o eleitorado; dá a impressão de que perdeu o interesse por isso, por ter coisas melhores em vista.
Lula, no mundo das realidades, tem tido o apoio sistemático do STF, que deu a si próprio poderes absolutos, é obedecido de joelhos, em tudo, pelos presidentes do Senado e da Câmara e governa o Brasil em todas as questões que chama para si — das conversas pelo WhatsApp à criação de crimes não previstos na lei. Inventou o flagrante perpétuo, o inquérito que anula a Constituição e o julgamento por “lotes” de acusados. Prendeu um deputado federal por nove meses; vai dizer, depois de prender de novo, se o indulto legal que ele recebeu do presidente da República vale ou não. Pode tirar esse mesmo presidente da vida pública — e, se quiser, jogar o homem na cadeia.
Mantém preso o ex-secretário de Segurança de Brasília, que estava nos Estados Unidos no dia 8 de janeiro, e deixa solto o general de Lula que estava dentro do Palácio do Planalto no mesmo dia, em convívio manso e amigável com os invasores. Dá razão a Lula, ou tem dado até agora, em 100% das decisões que toma, ou praticamente isso; atende a quase todos os pedidos que lhe são levados por facções da esquerda. Quer ressuscitar o imposto sindical que o Congresso aboliu por lei, e que Lula exige de volta — embora ele próprio, o STF, tenha confirmado em 2018 que a decisão do Legislativo foi legal. A lista não acaba mais. A verdade é que a ditadura em processo de montagem no governo Lula não recebeu até agora nenhuma contestação séria por parte do Supremo. Se tem sido assim até aqui, por que começaria a ser diferente?
Lula conta também com o apoio das Forças Armadas; não é daí que os seus planos estão esperando problemas. O comandante do Exército, que depois de assumir o cargo recebeu 700.000 reais a título de ajudas de custo e indenizações pecuniárias, diz, sempre que julga oportuno, que é a favor da legalidade. A legalidade é o que o STF diz que é legal, seja isso lá o que for — e o fato, hoje, é que ela coloca o Exército, objetivamente, do lado do MST e das suas invasões de terras (inclusive de propriedade do Estado, como ocorreu com a Embrapa), de extremistas políticos e, num caso especialmente curioso, de um político comunista que dirige o Gabinete de Segurança Institucional, nome atual da antiga Casa Militar da Presidência da República. A legalidade na qual o general Tomás Paiva insiste, na verdade, coloca o Exército Brasileiro a favor de tudo o que Lula está fazendo — do “desencarceramento” à aliança com China e Rússia, das promessas de dar dinheiro do BNDES para ditaduras de esquerda à sua declaração de que “a Amazônia não é só nossa”. Não há registro de que algo parecido tenha acontecido da história militar do Brasil.
Às Forças Armadas, ao STF e ao resto se juntam a OAB, a CUT, o sindicato dos bispos, os advogados “garantistas”, os “estudantes”, os “movimentos sociais”, os empresários socialistas e a maior parte da mídia. Todos são a favor da ditadura que já existe hoje, em tanta coisa; não está claro por que ficariam contra o mesmo tipo de ditadura amanhã. Não é por falta de apoio, com certeza, que Lula vai deixar de fazer o que estiver nos seus planos.
Leia também “Declaração de amor à tirania” na Revista OESTE
O presidente da República e os extremistas que mandam e desmandam em seu governo têm um projeto de ditadura para o Brasil; na prática, é o único projeto que têm. Podem não ter ainda um plano de operações para isso, nem formulado de uma maneira coerente o que querem. Podem, neste momento, não estar fazendo reuniões para discutir a questão em termos concretos — o que realmente vai ser feito, quando, como, onde e por quem. Pode ser mais um conjunto de desejos do que um plano objetivo, realista e inteligente para se fazer uma coisa desse tamanho. Com certeza, exige uma competência, coragem e noções básicas de eficácia que Lula não tem, nem o PT, nem a extrema esquerda que está à sua volta. Pode ser, também, que isso tudo exija um volume de trabalho que nenhum deles está disposto a encarar — ou apresente riscos que não querem assumir. Pode ser, enfim, que muita gente gorda do governo esteja mais preocupada em acumular dinheiro, já, do que em enfrentar as dificuldades de se meter num negócio desses. Acima de tudo, pode ser que não dê certo; querer é uma coisa, conseguir já são outros 500. Mas é isso o que eles estão querendo, pelo que mostra tudo o que têm feito até hoje em seus atos concretos no governo — uma ditadura no Brasil, com a máquina do Estado transformada em propriedade privada do PT e demais facções da esquerda, os interesses materiais da elite-pirata protegidos pelo novo regime e Lula promovido às funções de presidente vitalício, ou coisa parecida. Ele, e só ele — sem Lula, é claro, nada disso existe.