Oficial da Aeronáutica e engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Ozires Silva é um dos fundadores da Embraer e já foi ministro da Infraestrutura, nos anos 1990. Hoje aos 82 anos, é reitor do Centro Universitário Monte Serrat (Unimonte), em Santos (SP), e tem duras críticas ao sistema educacional brasileiro quanto à formação de seus profissionais.
Na última semana, em Porto Alegre (RS), Ozires proferiu a palestra “Criar, inovar e empreender – Ousar e avançar sobre o futuro”. O tema central foi inovação, área que permeou sua extensa experiência profissional, que inclui ainda a liderança do grupo que projetou e construiu o Bandeirante, primeiro avião comercializado pela empresa que hoje é uma das maiores da indústria aeroespacial. Foi duas vezes presidente da Embraer, além de ter ocupado o cargo também na Petrobrás e Varig. Além de estar à frente do Unimonte, dirige a empresa de engenharia tecidual Pele Nova e é presidente do Grupo Ânima de Educação e Cultura.
Para ele, o desenvolvimento brasileiro depende de educação, inovação, empreendedorismo, lideranças e competência administrativa. “As oportunidades estão abertas a todos, não podemos perdê-las”, disse. Como exemplo, cita a Coreia do Sul, cujo crescimento econômico se deu através da educação. “Produtos coreanos estão em todos os lugares do mundo, mas não encontramos produtos brasileiros nas ruas coreanas nem de muitos outros países”, comparou.
Para melhorar o nível de formação dos brasileiros, ele sugere eliminar a tributação sobre estudantes, instituir estímulos para as doações, eliminar encargos sociais de empresas que educam seus colaboradores, além de fornecer aberturas legais para empresas e pessoas físicas que contribuam para o avanço da educação. Confira, a seguir, trechos da entrevista concedida ao Terra após a palestra na capital gaúcha.
Terra – Qual é a sua opinião sobre a educação oferecida no Brasil atualmente? Ela propicia a formação de profissionais inovadores?
Ozires Silva – Absolutamente não. O processo educacional que prevalece no Brasil é ineficiente, não estimula o crescimento, a inovação, não estimula a busca de soluções. Infelizmente, por aqui, a educação é mais voltada ao controle da população pelas autoridades do que ao crescimento efetivo dos alunos.
Terra – Qual é o papel das escolas e universidades no incentivo ao empreendedorismo?
Ozires – Essa é uma pergunta para a qual tenho procurado respostas. Ao refletir sobre o assunto me surge outra questão: se pode ensinar empreendedorismo? Não sei se é possível ensinar alguém a ser empreendedor, inovador. O que pode ser feito, e é necessário que se faça, é trabalhar para criar um “ambiente de empreendedorismo” nas instituições de ensino, e, a partir daí, convidar os alunos a entrar nesse meio. É preciso que primeiro se dê os exemplos e as condições para que os talentos se formem; incentivar, e não reprimir as iniciativas inovadoras.
Terra – Como o senhor avalia as políticas governamentais de incentivo à formação e especialização em áreas ligadas à ciência e tecnologia, como o Ciência Sem Fronteiras?
Ozires – Várias medidas têm sido úteis e todas somam um pouco. Mas eu gostaria que, além de um Ciência Sem Fronteiras, houvesse também um “Ciência Com Fronteiras”, para que se formassem professores e alunos aqui, em vez de dar bolsas para um só. Trazer de fora professores de talento também seria mais benéfico. A China é um país que faz bastante isso, manda pessoas para estudar no exterior, mas leva para lá bastante gente de fora. Mas me parece que as universidades brasileiras são bastante corporativas, e os professores não gostam que se traga gente de fora, se sentem incomodados.
Terra – De sua experiência como ministro da Infraestrutura e diretor de grandes empresas, o que se aplica à sua atual função, à frente de uma instituição de educação?
Ozires – A experiência se aplica em tudo. A melhor coisa que existe é trabalhar com gente competente e talentosa, e eu procuro fazer isso onde quer que esteja. Certa vez foi perguntado ao presidente da General Electric, Jack Welch, o que um homem tão importante como ele fazia com o seu tempo para aproveitá-lo bem. A resposta dele foi uma lição importante que guardo até hoje: ele disse que passava a maior parte do tempo observando, buscando e selecionando talentos.
Terra – Sua carreira sempre foi marcada pela inovação, desde a fundação da Embraer, passando pela criação do Bandeirante e, mais recentemente, da empresa de engenharia tecidual Pele Nova. A que atribui essa vocação para o pioneirismo?
Ozires – Quando comecei a me envolver no processo que fez com que o Brasil pudesse começar a fabricar aviões, naquela época não sabíamos no que ia dar. A partir de lá, sucessivas coisas aconteceram que me permitissem ser quem sou. Um avião é um aglomerado de equipamentos difíceis, então tivemos que encontrar soluções para problemas que nem conhecíamos.
Eu diria que não é nada inato, é mais fruto de trabalho e experiência. Claro que também há a parte da capacidade criativa, existem pessoas que já nascem com isso, com o talento para inventar coisas, como Thomas Edison, que criou centenas de inventos sensacionais graças à sua capacidade criativa, mas não sou uma dessas pessoas, sempre que a sorte bateu à minha porta, me encontrou trabalhando, não é coincidência.