E a situação se deteriora…
Sandro Schmitz
Assessor de Relações Internacionais do Movimento Despertar Patriótico. Analista e Consultor Internacional. Doutorando em Economia pela SMC/Genebra. Especialista em Direitos Humanos, Transparência e Políticas contra a corrupção pela Fundação Henry Dunant/Chile, Especialista em “Gestão de Conflitos e Negociação” pela Junta Interamericana de Defesa/OEA.
Em preliminar... Quando há alguns anos o General Heleno comprou uma briga com o Governo Federal na demarcação da reserva “Raposa Serra do Sol” para que a mesma fosse demarcada afastada das áreas de fronteira do país, o mesmo foi chamado de preconceituoso, racista, anti-indígenas, dentre outras coisas. Mal sabem os detratores do General que o Comando Militar da Amazônia [CMA] é composto, em sua maioria, por indígenas em suas tropas. O General Heleno, com a sensatez que lhe é típica, apenas não queria que as populações indígenas da região ficassem expostas a riscos desnecessários, além de melhor guarnecer a fronteira.
Hoje. A oposição denuncia a morte de uma mulher indígena da comunidade de Kumarakapay, da etnia Pemona, na fronteira de Brasil e Venezuela e quinze feridos pelas Forças Armadas da Venezuela. O crime cometido por eles: estavam fazendo um corredor humanitário para a ajuda humanitária para seu país. O nome da indígena morta pelas Forças Armadas da Venezuela é Zoraida Rodríguez. Apesar deste crime haver sido cometido na Venezuela o mesmo ocorreu em zona de fronteira, portanto uma área de segurança de ambos os países.
Fica no ar o aviso dado há anos pelo General Heleno e tão rechaçado por muitos: os indígenas brasileiros estão sobre risco e caso ocorra algo com eles, em virtude das demarcações mal fadadas em área de fronteira, fica a pergunta: as Organizações Não-Governamentais [ONG´s], partidos [dentre eles, PT, PSOL etc], e, entidades que defenderam estas demarcações estão dispostos a assumir a culpa pelo sangue de indígenas que morrerem pelas suas políticas indigenistas?
Não bastasse este fato, a Venezuela posicionou misseis de defesa anti-aérea S-300 VM de fabricação russa a 15 km da fronteira com o Brasil. Estes são mísseis terra-ar com alcance operacional de até 400 km e opera com radar semi-ativo/ativo. Da localização onde estão posicionados, Santa Elena de Uairén, os mísseis tem plena capacidade de atingir Boa Vista/RR, pois a distância entre as duas é de 231km, abaixo da média de alcance dos mísseis que é 250km. Portanto, um verdadeiro ato de guerra, nos termos do Direito Internacional Público.
A contar deste momento, o Governo Brasileiro já pode se considerar em estado de Guerra [“status bellum”], pois este tipo de atitude do Governo Venezuelano se constitui em declaração de guerra. De acordo com a III Convenção de Genebra relativa a abertura de hostilidades de 1907, em vigor no Brasil pelo Decreto nº 378 de 15 de outubro de 1935, em seu art. 1º afirma que: “As Potências Contratantes reconhecem que as hostilidades entre si não devem começar sem aviso prévio e explícito, na forma de uma declaração de guerra fundamentada ou de um ultimato com declaração condicional de guerra”.
Logo, a atitude da Venezuela ao posicionar mísseis na fronteira com o Brasil, ato preparatório a guerra, viola frontalmente a Convenção e torna crível o direito a legítima defesa ao nosso país frente ao Direito Internacional, tendo em vista estar expressamente previsto na Carta de São Francisco [Carta da ONU] em seu art. 51 que possui a seguinte redação:
“Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. As medidas tomadas pelos Membros no exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em qualquer tempo, a ação que julgar necessária à manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais”.
Além disso, frente ao disposto em nossa Constituição Federal/88 o Governo Brasileiro está plenamente autorizado a revidar este tipo de hostilidades, pois nosso diploma Constitucional prevê expressamente, em seu art. 84, inc. XIX, que compete ao Presidente da República: “declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional”. O ato perpetrado pela Venezuela pode e deve ser considerado um ato de agressão estrangeira, e, nosso país tem por obrigação revidar, ou, ao menos declarar formalmente um ultimato, nos termos do art. 1º da III Convenção de Haia de 1907.
Não obstante isto há a evidente violação ao Tratado Interamericano de Assistência Recíproca [TIAR] que determina que se acione o Órgão de Consulta da OEA para validar a ação do TIAR que prevê em seu art. 3º o seguinte: “As Altas Partes Contratantes concordam em que um ataque armado de qualquer Estado contra um Estado Parte será considerado como um ataque contra todos os Estados Partes e, em conseqüência, cada uma deles se compromete a ajudar a fazer frente ao ataque, no exercício do direito imanente de legítima defesa individual ou coletiva que reconhecido pelo artigo 51 da Carta das Nações Unidas.”
Observe o fato que a Venezuela se retirou do TIAR em 2013, portanto se tornando Estado hostil ao tratado sob qualquer hipótese. Um dos fatos mais graves da atitude do Governo Maduro é que legitimou, frente ao Direito Internacional, qualquer possibilidade de intervenção do Governo dos Estados Unidos usando como base jurídica o previsto no TIAR. Ao tentar demonstrar mais força do que realmente possui o Governo Maduro apenas legitimou ações contra si mesmo e evidenciou o quanto não se importa com sua população ao matar sua própria gente.
Temos ainda os aspectos de política continental, posto que existe um bloco regional, o MERCOSUL, e, uma organização regional, a OEA, a se considerar. No primeiro caso, os parceiros devem se manifestar em breve sobre os fatos recentes, e, no caso inclui países como Argentina e Chile que possuem capacidade de causar sérios problemas a Venezuela. No caso da OEA, se acionado o TIAR, além do problema com os Estados Unidos da América, não podemos desconsiderar um envolvimento mais intenso da Colômbia o que iria se constituir em uma das complicações mais sérias deste conflito para a Venezuela. Em outras palavras, a Venezuela está provocando uma enorme tensão sub-regional e a deterioração das relações sul americanas.
Infelizmente, a situação está se deteriorando a cada dia que passa, assim como a população do país sofre com cada vez mais intensidade. O que as lideranças dos países envolvidos, Brasil, Chile e Estados Unidos da América, tem de ter a sensibilidade de entender é que não podem se permitir ficar em uma situação onde não haja mais saída, pois transformar a Venezuela em um novo Mogadício é tudo que nenhum dos três países deseja.
Devemos lembrar que boa parte da tragédia humanitária em Kosovo se deu pela demora na ação dos EUA e da OTAN. Tomar uma atitude é algo que se impõe a cada dia que passa. Logo, irá ser inevitável.