O que está em jogo para a Rússia na Venezuela

Uma troca de poder está ocorrendo na Venezuela, e o regime de Nicolás Maduro, que há muito tempo tem contado com o apoio da Rússia, está ameaçado.

A pergunta que surge é o que a perda desse aliado de longa data significaria para a Rússia. No momento, todos os olhares têm se voltado para a empresa petrolífera estatal russa Rosneft, cujo conselho de administração é comandado pelo ex-chanceler federal da Alemanha Gerhard Schröder.

A Rosneft possui participação em cinco projetos da estatal venezuelana de petróleo e gás PDVSA, com fatias entre 26% e 40% nos empreendimentos. Qual é a probabilidade de perda desses ativos?

Se Maduro for mesmo alijado do poder, é pouco provável que um novo governo faça desapropriações de ativos que tenham sido adquiridos legalmente por estrangeiros. Assim, é também possível que os investidores que venderam ações da Rosneft na bolsa de valores de Moscou, na quinta-feira passada, tenham agido rápido demais.

Em 2017, a Rosneft concedeu um empréstimo à Venezuela no valor de 6 milhões de dólares. Esse crédito é reembolsado pelas participações nos cinco projetos e pela extração de petróleo.

Recentemente ocorreram atrasos na entrega, e o presidente-executivo da Rosneft, Igor Setchin, precisou voar para Caracas em novembro de 2018 para negociar a situação. O contrato expira em 2019, mas a maior parte do valor já deve ter retornado à estatal russa.

Mais complicada que essa questão são os empréstimos concedidos pela Rússia para a compra de armamentos pela Venezuela. De acordo com a mídia russa, Moscou pode ter transferido cerca de 11 bilhões de dólares para Caracas nos últimos 20 anos.

Não se sabe ao certo quanto Caracas devolveu a Moscou, mas há relatos de que a dívida venezuelana foi restruturada e assumiu condições mais favoráveis. Não está claro se um possível novo governo venezuelano pagaria de volta esses créditos. Afinal, a Rússia apoiou o regime de Maduro.

A Ucrânia, por exemplo, se nega até hoje a pagar um crédito de 2013 à Rússia, dado o apoio russo ao antigo presidente ucraniano Viktor Yanukovytch.

Mesmo assim, o dinheiro investido na Venezuela não teria sido totalmente perdido para a Rússia, pois ele foi gasto em fuzis Kalashnikov, aviões de combate, helicópteros, tanques e outros equipamentos de guerra de fabricação russa.

No total, é possível assumir que as perdas russas no caso de uma troca de poder na Venezuela chegariam a cerca de 11 bilhões de dólares. Mas isso não seria nada em comparação com as consequências de um eventual aumento da produção de petróleo venezuelana, o que pressionaria os preços mundiais da commodity para baixo.

A Venezuela é frequentemente descrita como o país com as maiores reservas de petróleo do mundo. Mas cerca de 20 anos de regime socialista, primeiramente sob o comando de Hugo Chávez e depois de Maduro, levaram à decadência da economia petrolífera local.

A situação é tão dramática que hoje a Venezuela tem um papel praticamente insignificante no mercado mundial. Caso uma troca de poder torne a produção de petróleo novamente eficiente, e caso as empresas ocidentais, principalmente americanas, voltem ao país, a extração de petróleo subiria a ponto de a Venezuela poder elevar suas exportações. Certamente isso não ocorreria rapidamente.

Mas haveria um ponto de partida para contratos de entregas futuras, o que poderiam baratear o petróleo nos mercados mundiais. E este, sim, seria um cenário terrível para Moscou.

EUA impõem sanções contra petrolífera estatal da Venezuela

O governo do presidente americano, Donald Trump, anunciou nesta segunda-feira (28/01) sanções contra a estatal venezuelana Petróleos de Venezuela (PDVSA), com o objetivo de limitar as exportações de petróleo do país para os Estados Unidos e pressionar o presidente Nicolás Maduro a renunciar ao cargo.

O governo americano não chegou a banir a compra de petróleo da Venezuela por empresas americanas, mas decidiu que os pagamentos das transações serão direcionados para uma conta bloqueada, o que deve levar a PDVSA a reduzir as exportações para os EUA, seu principal cliente.

O assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, afirmou que 7 bilhões de dólares da PDVSA serão imediatamente bloqueados como resultados das sanções. A companhia também deve perder 11 bilhões de dólares em receitas de exportações ao longo do próximo ano, afirmou.

"Estamos em total choque. A companhia já está muito abalada", disse à agência de notícias Reuters um alto executivo da PDVSA que preferiu não ser identificado.

Maduro prometeu adotar medidas legais contra as sanções e retaliar, embora não tenha anunciado medidas específicas. Ele classificou as sanções de "criminosas". "Daremos uma resposta recíproca e convincente, necessária para defender os interesses da Venezuela, no devido tempo", disse Maduro.

Em reação às novas sanções americanas, a PDVSA passou a exigir pré-pagamentos dos petroleiros com destino aos EUA que aguardavam receber a carga nos portos da Venezuela. A Citgo Petroleum, subsidiária americana da PDVSA no setor de refinamento de petróleo, é o ativo mais importante da Venezuela no exterior.

Com as sanções, o governo Trump espera fortalecer o líder da oposição venezuelana e presidente interino autoproclamado, Juan Guaidó, para que novas eleições sejam convocadas. A legitimidade do pleito em que Maduro foi eleito para um segundo mandato, em maio do ano passado, é amplamente contestada.

Em uma entrevista à CNN nesta segunda-feira, Guaidó afirmou que havia conversado com Trump "e outros presidentes na região", sem revelar detalhes. Separadamente, Guaidó disse que o Parlamento venezuelano nomeará novas diretorias para a PDVSA e para a Citgo.

Maduro e Guaidó estão disputando o apoio das Forças Armadas do país, que ainda mantêm o apoio a Maduro. O líder oposicionista convocou os venezuelanos a participarem de uma nova jornada de protestos nesta quarta-feira e no próximo sábado, quando expira o ultimato de membros da União Europeia (UE) para que Caracas planeje novas eleições.

Até o momento, a administração Trump vinha evitando atacar o setor petroleiro da Venezuela por temores de que as refinarias americanas fossem afetadas e de que a crise econômica no país se aprofundasse ainda mais.

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