PABLO PEREIRA
PACARAIMA (RR) – Representantes dos Estados Unidos no Brasil estão apoiando os refugiados venezuelanos que entram pela fronteira de Roraima, principalmente pela cidade de Pacaraima, a cerca de 200 quilômetros de Boa Vista, na divisa com a Venezuela. Após um encontro com autoridades brasileiras e a ONG religiosa Fraternidade Federação Humanitária Internacional na semana passada, diplomatas da Embaixada dos EUA visitaram locais de concentração de refugiados no Estado e se reuniram com líderes de organizações que dão suporte a fugidos da crise política e econômica na Venezuela.
"Muita gente está oferecendo apoio", disse Freyo Viana, presidente da Associação Venezuelanos no Brasil e militante do Nuvipa (Nueva Visión Para Mi País), grupo que critica a política de repressão do regime do presidente Nicolás Maduro, mas se diz desvinculado "do governo e da oposição".
Na quinta-feira, eles também receberam os americanos. Segundo um dos diplomatas dos EUA, as informações sobre os refugiados venezuelanos são preocupantes. "Estamos verificando as informações passadas pela Acnur (agência da ONU para refugiados)", respondeu durante visita noturna ao refúgio de Boa Vista.
O local dá abrigo a quase 300 venezuelanos, a maioria da etnia warao, 80 dos quais são crianças. De acordo com a Superintendência da Polícia Federal em Roraima, somente neste ano, entre janeiro e 30 de maio, já entraram no País por Pacaraima cerca de 28,8 mil venezuelanos e 11 mil retornaram a seu país. Dos que permaneceram, muitos trabalham em Boa Vista e Manaus, que fica a cerca de 700 quilômetros da capital de Roraima. A média diária de atendimentos na fronteira, de acordo com os dados da PF, está em cerca de 100 casos de solicitação de entrada.
FUGA
Em Pacaraima, onde os americanos estiveram na quarta-feira, os refugiados se aglomeram perto da estação rodoviária da cidade, à beira da Rodovia 174, a 15 quilômetros da vizinha Santa Helena de Uiarén, a primeira cidade em terras venezuelanas. A brasileira Pacaraima tem cerca de 11 mil habitantes. O grupo de 200 indígenas warao permanece acampado sob marquises e nas calçadas. Mas há também muitos trabalhadores que buscam emprego no Brasil e, com pouco dinheiro, se acomodam como podem na região à espera de transporte para Boa Vista.
O diplomata dos EUA ouviu também relatos das dificuldades enfrentadas pelos venezuelanos que não são da etnia warao. Eles são cerca de 80 homens que recorrem ao abrigo, do bairro Pintolândia, ao lado da Praça Germano Sampaio, em busca de comida e lugar para dormir. Durante o dia, saem às ruas para fazer bicos de capina e outros serviços gerais, como pintura, recebendo diárias que variam de R$ 20 e R$ 100, dependendo da tarefa. À noite, as luzes no abrigo se apagam por volta de 21 horas. Pelo menos dois casamentos entre homens não indígenas e mulheres warao já ocorreram.
ATENDIMENTOS
O jovem Brian Sanches, de 23 anos, casou-se com Romélia Warao, de 18 anos. E José Francisco Blando, de 43 anos, que chegou no ano passado ao local, também se casou no abrigo. A mulher dele, também indígena, acabou de dar à luz a um filho do casal. "Irmã Clara, como está minha mulher?", perguntou ele, na última terça-feira, ao voltar de uma obra nos arredores do abrigo. "Ela está bem e o bebê vai ficar mais uns dias no hospital, mas isso é normal", respondeu a religiosa
Segundo o chefe da Defesa Civil, coronel Doriedson Ribeiro, os homens venezuelanos que não são indígenas devem permanecer no abrigo o mínimo possível. Ele explicou que o local atende a 289 pessoas, sendo 77 crianças. "Estamos trabalhando nisso desde novembro do ano passado e já fizemos 113.554 atendimentos", afirmou.
O forte dos atendimentos se concentra em alimentação: 111.185 até aquela data. "Há ainda um forte impacto sobre o sistema de saúde e educação de Boa Vista. A cidade não estava preparada para aguentar, além da preocupação com a segurança pública", disse o militar.
Pela manhã, há distribuição de café, pão e frutas, nem sempre em bom estado para consumo porque são doações de sobras de mercados. Todo dia, novas famílias chegam. O clima no local se complica principalmente à noite, na hora da distribuição do jantar. A cozinha é administrada pelas mulheres indígena. "Aí, acontecem conflitos", explicou a irmã Clara, da Fraternidade, que passa o dia administrando as desavenças entre os grupos, mas que à noite não fica no local.
Segundo o ajudante de pedreiro Luis Beltrán Rojas, de 34 anos, emigrar para o Brasil foi a única saída encontrada para a crise no seu país. Ele viajou de Cariaco, uma pequena cidade já na beira do mar do Caribe, em busca de trabalho. Empurrando uma bicicleta, com capacete de operário, ele chegou ao abrigo perto do meio-dia de segunda-feira com outros dois colegas de serviço. Foram procurar o almoço, servido com a ajuda da ONG.
Abrigo para refugiados é preparado
Pelo menos 35 barracas de lona, com capacidade para abrigar até 10 pessoas cada, estão estocadas no quartel do Exército em Pacaraima, a 212 quilômetros de Boa Vista, aguardando a liberação de recursos para montagem em refúgio provisório de apoio a venezuelanos que chegam ao Brasil. Outras 40 barracas da Defesa Civil aguardam transporte em um quartel do Exército em Boa Vista. "Temos condições de montar o abrigo provisório em 30 ou 40 dias", afirmou na quarta-feira o general Gustavo Dutra, comandante do Exército em Roraima. As barracas têm 4,50 metros por 6,5 metros.
O comandante da corporação aguarda somente o sinal verde da Casa Civil do Palácio do Planalto para uma despesa prevista de R$ 800 mil na preparação de um terreno e um barracão em Pacaraima, onde deve funcionar o centro de triagem e abrigo provisório. Segundo o secretário de Obras de Pacaraima, Arlindo Fontelles, o terreno preparado pelo Exército era usado para um depósito de carros do Departamento Estadual de Trânsito.
Para lá, segundo Fontelles, devem ser levados os indígenas que atualmente vivem nas ruas. De acordo com o Corpo de Bombeiros, a área deve abrigar futuramente uma estação da corporação.
"Não queremos voltar para a Venezuela", afirmou na semana passada um dos líderes indígenas da etnia warao. "E não queremos sair pra Boa Vista, nem para Manaus", acrescentou. "Queremos ficar aqui, trabalhar aqui", afirmou o chefe do grupo, que lidera uma dezena de pessoas, muitas delas crianças.
Ajudados por moradores da região e entidades religiosas de assistência, eles dormem numa esquina, onde também cozinham em fogareiros feitos na calçada. "Chegamos em janeiro. Estamos vivendo de doações e do nosso trabalho por aí", diz o homem no local por onde já passaram cerca de 300 pessoas recém-chegadas da Venezuela.
A crise de refugiados se agrava desde o ano passado, quando os indígenas começaram a chegar à fronteira reclamando da falta de alimentos que recebiam do governo do presidente Nicolás Maduro. Centenas de warao perambulam pela região do lado venezuelano e nos últimos meses passaram a solo brasileiro.
"A gente ajuda com o que pode", disse uma moradora da rua, que se mostrou incomodada com a presença dos venezuelanos nos arredores. "Eles estão aí e parece que vão ficar por mais tempo ainda", reclamou uma comerciante vizinha, dona de um bar na mesma rua.
Não somente os indígenas estão cruzando a fronteira em busca de ajuda. Há também os não indígenas, chamados pelos warao de "criollos". "Estou esperando pela documentação", disse o venezuelano Efren Jonathan Quintana, um "criollo" que deixou El Tigre, em Anzoátegui, a 450 quilômetros de Caracas, para tentar a vida em Pacaraima, a mais de 870 quilômetros. Ele está alojado com a família sob um palco para festas municipais na cidade. O terreno, de cerca de 100 metros por 30, aproximadamente, é um dos dois locais que podem ser usados para a construção dos abrigos.
Efren pede a quem chega ao lugar ajuda para encaminhar para exames a mulher, de 18 anos, grávida de 8 meses. Eles foram atendidos por médicos no Brasil, mas devem fazer os exames da gestação em Santa Elena, do lado venezuelano. "Não temos dinheiro para os exames", explica o rapaz.
1ª Bda Infantaria de Selva – Grande unidade em Roraima.
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