Saída de Raupp Deixa a Área Espacial Perdida no Espaço


Júlio Ottoboni
Exclusivo para DefesaNet


A saída do ministro de ciência, tecnologia e inovação, Marco Antonio Raupp, um dos quadros históricos do PMDB – apesar da divulgação que seu ingresso na pasta teria se dado por escolha da presidente Dilma Rousseff – colocou os institutos e empresas ligados ao segmento espacial em compasso de espera. Entretanto a surpresa com o desligamento foi menor que a esperada. Raupp estava sob pressão para apresentar resultados mesmo numa área totalmente desmantelada pela ingerência de políticos e cortes orçamentários.
 
Os especialistas escutados pelo DefesaNet apontam algumas questões como fundamentais para a mudança no ministério. Raupp teria dado um caráter técnico a pasta, inclusive acabando com a dinastia de políticas leigos a frente da Agência Espacial Brasileira (AEB), empossando José Raymundo Coelho e uma equipe de assessores oriunda de institutos científicos. Isso teria irritado em demasia setores do próprio PT e também do PSB, que costumeiramente frequentava a presidência da entidade.
 
Ele também foi responsabilizado pelo fracasso no lançamento do CBERS 3, perdido pelo lançador Longa Marcha 4, um foguete chinês com alto grau de eficiência. O atraso de quase uma década no lançamento do satélite de sensoriamento remoto se deu por diversos motivos, entre eles a retirada de sua peça orçamentária ainda no governo Lula para a missão do astronauta Marcos Pontes na Estação Espacial Internacional. Outro problema foi a perda de componentes de sistemas do CBERSs devido ao longo tempo de espera.
 
A intenção do governo era acabar com o apagão de imagens sobre a Amazônia, que tem dificultado um melhor monitoramento do desmatamento, além de ter algo positivo no setor espacial para comemorar e divulgar junto ao marketing do governo federal. O CBERS 4 está para ser lançado em dezembro deste ano, exatamente quando completar um ano da perda do modelo 3.
 
A aproximação de novos parceiros no setor espacial, como a Rússia e a Ucrânia minguaram de vez, principalmente agora com o conflito entre as duas nações. O Brasil que era visto como um parceiro de grande interesse comercial passou a figurar apenas como uma promessa no setor. Peças orçamentárias falhas, prioridades definidas por estratégias para visibilidade ao governo federal e embates com servidores federais, além de problemas sem solução.
 
O Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE) passou a ser duramente questionado nos bastidores do congresso nacional. Com a expulsão do Brasil do programa da Estação Espacial Internacional, o distanciamento da Nasa e da Agência Espacial Europeia (ESA), a perspectiva do governo Dilma era retomar os projetos espaciais com uma grande dose de ufanismo e independência. Para isso foi escolhido o então diretor do Parque Tecnológico Riugi Kojima, de São José dos Campos, e ex-diretor geral do INPE e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
 
O comendador Marco Antonio Raupp era dado como a solução definitiva desses problemas e não mais um tecnocrata sem jogo de cintura para atender as crescentes demandas de aliados políticos e a rede de intrigas e interesses que circunda os ministérios. A cada falha, os pilares de sustentação do ministro ficavam mais frágeis. Até mesmo o anúncio do lançamento de uma satélite da Bolívia acabou abalando ainda mais seu prestígio dentro do governo federal. O uso da jato da FAB para vir de Brasília para São José dos Campos, no carnaval, foi a desculpa que faltava para antecipar a dispensa iminente.
 
Gaúcho de Cachoeira do Sul, de temperamento forte, personalista e muito centralizador, Raupp também esteve a frente da AEB. Conhecia bem os bastidores do meio acadêmico e científico, porém imaginava ter vida mais fácil em Brasília, mesmo sabendo dos enormes problemas que o aguardava.
 
Entre eles, a empresa Cyclone, uma parceria com a Ucrânia para construir, lançar foguetes a partir da base de Alcântara (MA). Essa empresa binacional tem sido um sumidouro de recursos sem resultados práticos. Um triste passivo criado para abrigar o político e ex-ministro da pasta, Roberto Amaral, atualmente desligado a companhia e compensado de maneira generosíssima pelo governo.
 
A transferência de tecnologia pela Cyclone para o programa do VLS nacional ainda é uma incógnita e sua existência passou a gerar cobranças no meio político, pois a situação beira ao escândalo. Raupp teria ficado muito passivo diante da morosidade do processo, sem o nível de cobrança e de acompanhamento exigido pelas lideranças do governo.
 
Raupp retornará a residir em São José dos Campos e provavelmente assumirá o direção do Parque Tecnológico da cidade, que ele ajudou a elaborar e construir. Atualmente a vaga é do criticadíssimo pelo meio empresarial e ex-vice presidente de relações institucionais da EMBRAER, Horário Forjaz. O salário na faixa dos R$ 30 mil, maior que do próprio ministério e até da Presidência da República, além de uma série de benefícios diretos e indiretos, além de estar livre das pressões políticas,  é o melhor abrigo para Raupp e que ele espera logo ocupar.

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