Matéria publicada no Informe ABIMDE, edição Dezembro 2013
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Valeria Rossi
Jornalista
A Marinha do Brasil passa por um momenta de renovação, não apenas de equipamentos, mas também no que se refere à sua participação nos grandes projetos estratégicos que estão em desenvolvimento pelo governo, como o: Programa de Obtenção de Navios-Aeródromos (ProNAe), o Programa de Obtenção de Navios-Anfibios (ProNAnf), o SisGAAz (Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul), entre outros.
Em entrevista para a INFORME ABIMDE, o Diretor da DGePEM (Diretoria da Gestão dos Projetos Estratégicos da Marinha), Vice-Almirante Antonio Carlos Frade Carneiro, falou sobre os planos e as expectativas da organização para as próximos anos. Ele ressaltou que o Brasil, mesmo não sendo um país que vive sob conflitos de guerra, precisa cada vez mais se fortalecer. "Muitas vezes, se pergunta porque se aplicam recursos orçamentários em sistemas de armas, haja vista que ha mais de seis décadas o nosso país não participa de conflito armado. A historia dos povos demonstra que as nações têm interesses que, ao serem contrariados e ao falharem todos as mecanismos democráticos existentes, haverá apenas um ultimo recurso: o das Forças Armadas, que precisam ser preparadas por um longo tempo". Para o Vice-Almirante, o país tem de ser independente e para isso é necessário um "profundo comprometimento com a Base Industrial de Defesa do Brasil, na execução de programas, cada vez com maior conteúdo local e com transferência de tecnologias para empresas nacionais".
INFORME ABIMDE – Como a Marinha se reorganizou para criar a Diretoria da Gestão dos Projetos Estratégicos da Marinha (DGePEM)?
Vice-Almirante Antonio Carlos Frade Carneiro – Por meio de um grupo de trabalho de diversos setores da Marinha, que estudou as possíveis soluções para implementação da DGePEM.
IA – Como a-DGePEM esta estruturada?
Almte. Frade -. A DGePEM será constituída basicamente por uma sede em Brasília, localizada no prédio anexo ao do Comando da Marinha e uma superintendência no Rio de Janeiro. A parcela da OM (Organização Militar) localizada no Rio de Janeiro, na área do arsenal da Marinha, acompanhará a execução física dos projetos.
A DGePEM terá, como principais atribuições: executar, coordenar e gerir os projetos de obtenção e desenvolvimento de meios e sistemas designados como estratégicos pelo almirantado, valendo-se para tal do concurso das diretorias especializadas e centros especializados envolvidos. Isso proporcionará uma visão integrada dos projetos estratégicos, contribuindo para a gestão dos recursos disponíveis, para a adequação de custos, prazos e riscos, bem como para a determinação dos custos totais de posse, propriedade e do ciclo de vida dos objetos desses programas.
IA – O que motivou a Marinha a criar o DGePEM?
Almte. Frade – Concentrar a gestão contratual de grandes programas em uma única or-ganização, otimizando a exe-cução, o controle e o conheci-mento.
IA – Qual o orçamento do Núcleo?
Almte. Frade – Variará de acordo com o número de programas estratégicos que estejam em execução, mas com certeza será a organização da Marinha que terá a gestão da maior fatia orçamentária na rubrica investimento. No momento, apenas o Programa Nuclear da Marinha (PNM) e o programa de construção de submarinos (PROSUB) não serão geridos pela DGePEM, por já estarem em execução e já possuírem uma governança própria de sucesso.
IA – Como o Núcleo poderá contribuir para a BID (Base Industrial de Defesa)?
Almte. Frade – De diversas maneiras, mas, principalmente, aplicando os princípios da Lei n° 12.598, de 2012, privilegiando as empresas brasileiras de defesa.
IA – Quais projetos estarão no DGePEM?
Almte. Frade – Atualmente, os programas estratégicos de construção de 20 navios-patrulha de 500 toneladas (NPa 500 ton), por estaleiros nacionais e com altos índices de nacionalização e que serão empregados para patrulhar a nossa "Amazônia Azul" (território marítimo brasileiro com cerca de 3,6 milhões de km2) com tarefas de salvamento, proteção ambiental, implementação das leis no nosso mar, proteção do comércio marítimo brasileiro e das nossas bacias petrolíferas.
O outro programa estratégico já sendo conduzido pela DGePEM é o SisGAAz (Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul), que será um enorme sistema de monitoramento e vigilância das nossas águas oceânicas e das nossas hidrovias, semelhante ao SISFRON do Exército Brasileiro, que já está em desenvolvimento para monitorar e aumentar a segurança das nossas fronteiras terrestres. O SisGAAz gerará muitos empregos em toda a cadeia produtiva durante a sua execução e trará uma enorme capacidade de monitoramento ambiental de defesa ao Brasil.
IA – O senhor poderia detalhar um pouco cadaprojeto?
Almte. Frade –São eles:
– Programa de Construção de Navios-Patrulha 500 ton (NPa 500t). Este programa prevê a construção de mais 20 navios de 500 toneladas de deslocamento, em estaleiros nacionais e com alto índice de nacionalização. Dois já foram construídos em Fortaleza e cinco estão em construção no Rio de Janeiro. Como se percebe, é uma ótima oportunidade para a aplicação do orçamento brasileiro em várias regiões do país, contribuindo para a distribuição orçamentária do Brasil regionalmente.
– Programa de Construção de Corvetas. Este programa ainda será atribuído à gestão da DGePEM. Está prevista a construção de quatro corvetas modernizadas, a partir do projeto de sucesso, genuinamente nacional, da corveta Barroso em estaleiros brasileiros. Serão navios de escolta e que reforçarão a Esquadra Brasileira. Esta será uma ótima oportunidade para nossa indústria de defesa participar, ativamente, do programa de construção. A Marinha do Brasil espera ter este programa aprovado pelo governo brasileiro e lançado em 2014, quando o projeto de construção estará pronto.
– Programa de Obtenção de Navios de Superfície (PROSUPER) – É o nosso principal programa estratégico para repor a coluna mestra da esquadra e prevê a construção de cinco navios–patrulha, de 1800 toneladas, para emprego no limite da área marítima de interesse estratégico da Marinha, cinco Fragatas de 6000 toneladas, de alta capacidade de combate, para substituir as nossas fragatas, que já têm mais de 30 anos de ótimos serviços, e um navio de apoio logístico. Este programa já está plenamente definido pela Marinha e apenas aguarda a aprovação governamental para seu início. A sua execução será no Brasil e trará um enorme desenvolvimento tecnológico para a construção naval brasileira.
– Programa de Obtenção de Navios-Aeródromos (ProNAe) O Brasil é uma das poucas nações do mundo cuja marinha detém o conhecimento e o adestramento para operação de Navios-Aeródromos (NAe). O projeto e a construção de um navio como esse é um grande desafio. A Marinha está em negociação com países detentores das tecnologias de projeto e construção de NAe, com o propósito de projetar e construí-lo no Brasil.
– Programa de Obtenção de Navios-Anfíbios (ProNAnf) – Da mesma forma que o ProNAe, existe a necessidade de serem projetados e construídos no Brasil dois Navios-Anfíbios para substituir o NDD (Navio de Desembarque de Doca) Rio de Janeiro, este já descomissionado, e o NDD Ceará – navios recebidos dos Estados Unidos há muito tempo e que se mostram obsoletos e de difícil manutenção. Para sua substituição, a Marinha pretende adquirir a capacidade de projetar e construir no Brasil, com auxílio e transferência de tecnologia de empresas de defesa internacionais. Esses navios são também conhecidos como navios de múltiplos propósitos, pois possuem a capacidade de transporte de tropa, viaturas anfíbias e blindadas, helicópteros, recebimento e tratamento de baixas hospitalares e de comando e controle. Em face de suas capacidades, têm enorme possibilidade de participarem de ações de calamidade pública ou de desastres ambientais; apresentando uma capacidade dual para operações navais e operações de apoio à defesa civil.
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– SisGAAz (Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul) Como explicado anteriormente, o SisGAAz atende à orientação estratégica prevista na END (Estratégia Nacional de Defesa), que determina a plena capacidade do monitoramento e controle das áreas jurisdicionais brasileiras. Este sistema deverá ser desenvolvido totalmente no Brasil com forte índice de nacionalização, dando ao país uma capacidade de controle das áreas marítimas de interesse tanto nos aspectos de defesa, quanto no aspecto ambiental. Teremos capacidade de impor as leis brasileiras em nossos mares. É importante ressaltar a crescente importância econômica do mar e dos nossos rios para o desenvolvimento brasileiro. A cada dia, o comércio internacional pelo mar, o transporte de mercadorias pelas hidrovias, a pesca, a maricultura, a prospecção de petróleo, além de outras atividades, mostram a importância do perfeito conhecimento que a Marinha do Brasil deve ter do ambiente marítimo e fluvial. Os impactos decorrentes de qualquer ameaça nas atividades que são desenvolvidas nesses ambientes afetarão diretamente a população brasileira.
– Míssil Antinavio Superfície (MANSup) – Este assunto não está sob gestão da DGePEM, porém posso dizer que está em andamento com o auxílio de empresas brasileiras no desenvolvimento do míssil, tendo até o momento obtido sucesso em todas as etapas
IA – O que as empresas do setor de defesa podem esperar para os próximos anos?
Almte. Frade – O profundo comprometimento com a BID (Base Industrial de Defesa) na execução dos programas, cada vez com maior conteúdo local e com transferência de tecnolo-gias para empresas brasileiras. O Brasil precisa ser independente e soberano e só conseguirá isso se tiver uma indústria de defesa forte, tecnologicamente desenvolvida e capaz de atender às necessidades de reaparelhamento das forças armadas.
IA – Quais as expectativas do senhor para o setor em 2014?
Almte. Frade – As melhores possíveis. Nosso país cresce e, portanto, precisa investir em defesa. Não há nenhum país no mundo que se desenvolva e deixe de investir em defesa. Desenvolvimento e defesa andam de mãos dadas. Um não existe sem o outro.
IA – Como o senhor avalia a indústria nacional (em termos tecnológicos) para atuar com os projetos estratégicos do governo brasileiro?
Almte. Frade – Aí se encontra um dos gargalos para a indústria de defesa, haja vista que durante muito tempo não se realizaram encomendas a essas empresas. Mas existem ilhas de competência expressivas no Brasil, que mostram que quando há recursos para se contratar produtos e serviços elas demonstram toda capacidade no seu atendimento. Porém, em razão dessa indústria apresentar uma característica singular em relação a todas as demais componentes do parque industrial brasileiro, ou seja, ter apenas um cliente que é o governo, há necessidade de que existam orçamentos públicos firmes que possibilitem que este setor da indústria tenha um planejamento de longo prazo, se capacite e mantenha condições para atender à demanda do setor. Neste momento, é importante ressaltar que a nova Lei no 12.598/2012 traz condições mais favoráveis de competição à indústria brasileira em comparação com os gran-des conglomerados de defesa internacionais. Mas não basta apenas isso, é preciso que o país decida realmente manter um aporte de recursos orçamentários com regularidade para que haja a segurança natural ao desenvolvimento da BID.
IA – Algumas empresas brasileiras estão investindo pesado no desenvolvimento, no aprimoramento de tecnologias de radares, em VANT (Veículo Aéreo Não Tripulado), em telecomunicações, em ciber defesa, entre outras atividades. Como o senhor avalia esse investimento?
Almte. Frade – Para as Forças Armadas essa é uma notícia muito importante, pois trará a natural independência e soberania tão almejadas para a obtenção de sistemas e equipamentos na linha da fronteira do conhecimento. Além disso, é importante destacar que esse desenvolvimento tecnológico é importantíssimo para absorção de toda a capacidade intelectual acadêmica das nossas universidades e centros de pesquisas.
Novos grupos empresariais, que no passado recente não participavam da área de de-fesa, hoje trazem a sua capacidade de gerência financeira para a área, associando-se a conglomerados brasileiro de menor porte, mas que detinham a tecnologia e o conhecimento do setor. Para termos uma indústria capaz de concorrer no mercado internacional é importante, neste momento, destacar novamente que esse segmento trabalha na fronteira de tecnologia e possui, como já dito anteriormente, apenas um cliente, o Governo. Com isso suas atividades envolvem um risco empresarial que pode ser minimizado utilizando-se os mecanismos previstos na lei supracitada, que ao ser transformada em uma EED (Empresa Estratégica de Defesa) passa a gozar de um regime tributário diferenciado por meio do RETID (Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa).
Além disso, a nova lei permite que esses grupos nacionais participem com vantagens nos processos licitatórios de reaparelhamento das Forças Armadas. Observa-se que este é um fenômeno interessante decorrente dessa nova moldura legal que é a vontade mostrada pelos grupos estrangeiros de virem para o Brasil, associarem-se com grupos nacionais, transferindo tecnologia de ponta e, assim, poderem participar da BID.