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2014 – Black Blocs se preparam

DefesaNet

Série de 3 matérias do Correio Braziliense analisando as manifestações de Junho / Julho no Brasil,

2014 – Black Blocs se preparam Link

As estratégias antiprotesto Link

A juventude do sobrenome Link

 

Colaborou André Shalders

Para quem pensa que os mascarados e o gás lacrimogêneo serão apenas uma lembrança de 2013, um recado: "Com toda certeza, vai ter manifestação na Copa do Mundo, no ano que vem, e às vésperas das eleições", avisa Raíssa Labanca. A estudante de direito faz parte do grupo que, batizado de Marcha do Vinagre, ajudou a levar dezenas de milhares de brasilienses às ruas, entre junho e setembro. "Não acabou porque as pessoas saíram das ruas. Já há convocações para 2014 com o mote "não vai ter Copa"", confirma Esther Gallego, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A pesquisadora acredita que o momento de calmaria se deve a "uma reorganização para 2014". Nas redes sociais, dezenas de eventos simultâneos já estão agendados para 25 de janeiro.

A professora Esther está nas ruas paulistanas desde junho, acompanhando especificamente a ação dos black blocs, e teve contato com cerca de 30 deles. Para ela, é bem possível que os mascarados estejam em protestos nas eleições, "mas o alvo, o objetivo deles é a Copa. Como a ideia é chamar a atenção, durante a Copa fica mais fácil". Ela define o 25 de janeiro como "um dia para mensurar a situação". "Eles mesmos estão repensando a atuação. Tudo fugiu das mãos, de todo mundo; ninguém pensou que isso ia ser tão grande. Os black blocs não pensaram que iriam levantar a polêmica que levantaram", analisa.

Embora se definam como protetores dos manifestantes contra os excessos policiais, os black blocs não são unanimidade mesmo entre outros ativistas. "Sou contra esse tipo de manifestação, acho que protesto tem de ser pacífico. Vi policiais que estavam lá por obrigação, pois se dependesse deles, se juntariam aos manifestantes", explica Raíssa. Para a organizadora da Marcha do Vinagre, o esvaziamento das ruas se deu por dois fatores. "Um pouco de desilusão, e a violência. As pessoas sabiam que ia ter violência".

Investigações

Em São Paulo, o Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) já ouviu 150 pessoas, em um único inquérito policial, "para investigar a atuação de black blocs em meio a essas manifestações", informou a secretaria de Segurança Pública do estado. "As condutas estão sendo individualizadas, com a possibilidade de enquadramento por associação ao crime", completou a pasta. Neste ponto, Raíssa e os black blocs estão do mesmo lado: são alvo de monitoramento pela inteligência policial. A estudante relata que todos os organizadores da Marcha do Vinagre foram grampeados, o que causou medo em muita gente. Esther Gallego avalia que a perseguição também afastou os mascarados das ruas. "Talvez a repressão seja tão dura que acabe com o movimento. Você vê meninos jogando uma pedra e sendo enquadrados por organização criminosa, isso é muito duro."

Além da perseguição policial, Raíssa acredita que o movimento que chegou a levar mais de um milhão de brasileiros às ruas, em um único dia, tomou um banho de água fria com a reação dos mandatários políticos. "As respostas não foram suficientes, foram um verdadeiro embala neném". A pesquisadora da Unifesp também avalia a reação do poder público como insuficiente. "É uma questão política transformada em questão policial. Seria mais sensato o governo pensar no que realmente está acontecendo."

Alguns atores das manifestações

Black Bloc

Mascarados e usando preto, os Black Blocs, ou "BB", não são um movimento social com bandeiras específicas. Trata-se de uma tática, cujo objetivo é garantir a segurança durante os protestos, segundo a organização.

Mídia ninja

Ninja é o acrônimo de Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação. Trata-se de um grupo de voluntários que produz uma cobertura alternativa dos protestos, por meio de transmissão ao vivo por celular e página das redes sociais.

Marcha das Vadias

Movimento social feminista, cuja principal bandeira é o fim da violência contra as mulheres. Organizados por estado, promovem passeatas próprias, mas algumas estiveram nas manifestações de junho.

Movimento Passe Livre

Movimento social organizado em 2005, que luta pela gratuidade no transporte público (tarifa zero). Foi o grupo que deu origem aos protestos de junho, ao convocar protestos contra o aumento da tarifa dos ônibus em São Paulo.

Quatro perguntas para

Lucio Gregori, engenheiro. É considerado o pai da tarifa zero para o transporte urbano e inspirador do Movimento Passe Livre (MPL)

Por que os protestos diminuíram?

As manifestações de junho tiveram origem na luta pela redução das tarifas de ônibus, mesmo que depois várias outras pautas tenham se associado. E, em cerca de 100 cidades do país, houve redução das tarifas. Isso, na minha opinião, foi o principal fator a frear a escalada de protestos. Se você pensar, foram quase dois meses de intensidade muito acima do normal. Isso não é algo banal. Esses protestos de junho cumpriram um papel e agora amainaram, talvez à espera do surgimento de novos fatos que os tragam de volta às ruas.

A atuação da polícia pode ter afastado as pessoas?

Não acho que a repressão tenha contribuído para diminuir os protestos, embora possa ter havido uma ou outra pessoa que recuou com medo. Pelo contrário, houveram momentos em que a brutalidade da ação da PM serviu justamente para aumentar a revolta, especialmente no Rio e em São Paulo.

As manifestações devem voltar em 2014?

Eu tenho muito receio de previsões desse tipo. Há novas forças sociais se movimentando no país, que se tornaram públicas em junho. Ainda é cedo para prever como elas se comportarão. Se você me perguntasse em abril deste ano, eu não apostaria no acontecimento dos eventos que ocorreram meses depois. Se você quer um palpite, eu diria que 2014 será um ano bem movimentado: a Copa do Mundo, por exemplo, abre um espaço para manifestações, já que uma das causas da insatisfação exposta pelas ruas em junho foi justamente os gastos com o evento em detrimento dos serviços públicos.

Os protestos têm potencial para alterar a agenda eleitoral?

Não acho que os protestos tenham se convertido em algo capaz de mudar o cenário eleitoral, mas acho possível que em algum momento essa insatisfação se volte contra o modelo de democracia do país, contra o voto obrigatório, contra a forma de financiamento das campanhas e etc. Há um Brasil pré-junho e um Brasil pós-junho. Esse "pós" nós ainda levaremos um tempo para compreender.

É uma questão política transformada em questão policial. Seria mais sensato o governo pensar no que realmente está acontecendo"
Esther Gallego
Pesquisadora da Unifesp

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