Tribunal de Contas da União – TCU
Secretaria de Controle Externo da Defesa Nacional
e da Segurança Pública
SUMÁRIO EXECUTIVO
Data Publicação 2014
DEFESA NACIONAL
Transferência de Tecnologia
Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB) e
Projeto H-XBR
Relator
MINISTRO RAIMUNDO CARREIRO
Apresentação
Apresento o sumário executivo da auditoria realizada nos processos de transferência de tecnologia do Programa de Desenvolvimento de Submarinos da Marinha (PROSUB) e do Projeto H-XBR, de desenvolvimento e produção de helicópteros para as Forças Armadas, conduzido pela Força Aérea.
A auditoria1 foi resultado de avaliações anteriores do Tribunal que indicavam ser a transferência de tecnologia o principal elemento buscado no PROSUB e no Projeto H-XBR. De fato, o desenvolvimento de ambos os empreendimentos objetiva a obtenção dos meios com transferência de tecnologia, de forma a mobiliar unidades de combate e permitir a capacitação da indústria doméstica para o fornecimento local de soluções de defesa, em atendimento às diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa.
Conforme conclusões consignadas no relatório de auditoria, a decisão política de aproveitar a oportunidade oferecida pela França, de cooperar com o Brasil na área de defesa, resultou em imposição de prazos exíguos para o esforço analítico prévio acerca dos elementos essenciais para a implementação de um processo de inovação tecnológica. Como consequência, os requisitos essenciais para o atingimento dos objetivos consignados em ambos os investimentos deixaram de ser delimitados com a antecedência, na extensão e com o detalhamento necessário.
Nada obstante, o longo período de implementação, bem como a continuada melhoria dos instrumentos de gestão, oferecem aos gestores a oportunidade de realizar os ajustes necessários para maximizar os benefícios buscados em ambos os empreendimentos.
A fim de contribuir para o alcance desse objetivo, um conjunto de recomendações foi expedido aos gestores dos projetos com o fito de tratar as falhas identificadas e reduzir o risco de que deixem de produzir os resultados esperados.
Ministro João Augusto Ribeiro Nardes
Presidente do Tribunal de Contas da União
___________________
1. Analisada na Sessão Plenária de 30/10/2013, tendo por Relator o Ministro Raimundo Carreiro, originou o Acórdão 2952/2013 – TCU – Plenário
Sumário
1. Antecedentes
2. Programa de Submarinos (PRSUB)
3. Projeto de Helicópteros (H-XBR)
4. Transferência de Tecnologia
5. Achados
Concepção
Estruturação
Formalização
Controle
6. Conclusão
7. Recomendações
Recomendação ao Ministério da Defesa
Recomendação ao Comando da Marinha
Determinação ao Comando da Marinha
Recomendação ao Comando da Aeronáutica
Determinação ao Comando da Aeronáutica
1 – Antecedentes
A execução do Projeto H-XBR e do Programa de Submarinos da Marinha (PROSUB) alinhou-se à vontade política de priorizar uma estratégia de contratação que atendesse às necessidades de suprimento das Forças Armadas e, ao mesmo tempo, aproveitasse as possibilidades decorrentes dos acordos de cooperação celebrados entre o Brasil e a França (2) para inserir a defesa nacional em uma trajetória de desenvolvimento tecnológico e industrial autônomo.
Cinco fiscalizações precedentes, conduzidas a partir de 2009, levaram à conclusão de que a transferência de tecnologia foi o elemento determinante para a escolha dos fornecedores principais de cada empreendimento, sendo esse o elemento central das análises conduzidas nesta auditoria.
A constatação confirma a nova política para a área de defesa, de envolver nas aquisições de material bélico a obtenção de conhecimentos que potencializem o desenvolvimento da indústria local e reduzam a dependência de fornecimento de material estrangeiro.
Ponderadas as conclusões das auditorias anteriores e os objetivos da novel legislação para a área, a Secretaria de Controle Externo da Defesa Nacional e da Segurança Pública (SecexDefesa) identificou a necessidade de se avaliar a conformação jurídica, a modelagem e a articulação institucional, assim como as práticas de gestão e controle adotadas nos processos de transferência de tecnologia insertos no Prosub e no Projeto H-XBR. Proposta nesse sentido foi acolhida pelo Ministro Relator, Raimundo Carreiro, nos autos do TC 003.519/2011-2.
2. O Acordo Relativo à Cooperação no Domínio da Defesa e ao Estatuto das Forças, firmado entre Brasil e França, foi assinado pelos respectivos ministros de defesa em 29/1/2008. Nele está prevista a cooperação entre as partes nas áreas de pesquisa, desenvolvimento e apoio logístico, e aquisição de produtos, equipamentos e serviços de defesa, entre outras iniciativas nas áreas de defesa e segurança.
2 Programa de Submarinos
O Programa de Submarinos da Marinha (PROSUB) objetiva o desenvolvimento da capacidade doméstica de projetar e de construir submarinos, inclusive de propulsão núcleo-elétrica. Ele alinha-se às metas consignadas no Programa Nuclear da Marinha (PNM), iniciado em 1978, que também inclui o domínio do ciclo completo do combustível físsil.
O PROSUB prevê, além da construção de quatro submarinos convencionais (R$ 10,54 bilhões) e um nuclear (8,91 bilhões), a disponibilização de uma base e de um estaleiro (7,88 bilhões) destinados, respectivamente, à manutenção e à construção desses ativos.
O valor estimado para a execução total dos projetos associados ao Programa de Submarinos é de R$ 27,33 bilhões, a preços de junho de 2013, com prazo de execução que se estende de 2009 a 2025.
A principal contratada é a Direction des Constructions Navales Services (DCNS), empresa pública controlada pelo governo francês.
3 – Projeto H-XBR
O Projeto H-XBR destina-se ao desenvolvimento e produção, no Brasil, de 50 helicópteros de médio porte e emprego geral para os três Comandos Militares e para a Presidência da República.
O projeto envolve transferência de conhecimento para a produção local da aeronave, além da ampliação da capacidade de produção da Helibras em Itajubá/MG.
A principal contratada é Eurocopter por intermédio de consórcio integrado pela Helibras. O projeto foi estimado em R$ 5,11 bilhões com prazo de execução de 2008 a 2017.
Recursos previstos (R$ bilhões)
Helicóptero H-XBR, montado em Itajubá (MG), em exposição na Feira
Le Bourget 2015 (Paris), que realizou testes na Índia e Polônia.
4 – Tranferência de Tecnologia
A transferência de tecnologia é a transferência de conhecimento técnico ou científico em combinação com fatores de produção.
Em se tratando de projetos que envolvam transferência de tecnologia, é primordial que se: delimitem claramente os objetivos visados; avaliem antecipadamente capacidades técnico-científico-industriais nacionais que poderão contribuir para o projeto ou serem por ele estimuladas; identifiquem tecnologias já existentes no país e que poderão ser utilizadas; estimem os custos de aquisição, de operação e de manutenção dos ativos que desenvolverá; avalie a capacidade para absorver e aplicar o conhecimento a ser adquirido.
Sem o exame e o reexame de aspectos como esses, perde-se a oportunidade de bem avaliar propostas de aquisição de complexos produtos e tecnologias estrangeiros e inicia-se uma rota de improvisações, cujo resultado pode ter efeito negativo sobre a eficácia e a eficiência do empreendimento.
A auditoria visou a avaliar a conformação jurídica, a modelagem e articulação institucionais e as práticas de gestão e controle adotadas nos processos de transferência de tecnologia no PROSUB e no H-XBR e a aderência de ambos às disposições da Estratégia Nacional de Defesa.
Um modelo de análise das fases e requisitos essenciais para a negociação de processos de transferência de tecnologia foi criado. Conforme nele preconizado, há quatro momentos ou fases em processos dessa natureza: a concepção, a estruturação, a formalização e o controle. Nesse arranjo, passa-se progressivamente do mapeamento geral das necessidades e das restrições envolvidas no negócio (concepção) para a definição sistêmica, clara e atualizada dos projetos, subprojetos, atividades, tarefas envolvidas e seus respectivos objetivos e objetos (estruturação).
Essa visão integrada dos elementos necessários à condução do projeto define o arcabouço para a formalização dos contratos, quando são firmados os ajustes que delimitam as relações jurídicas (formalização). Na etapa final, cuida-se de garantir a presença de elementos de controle que minimizem riscos e assegurem o alcance dos objetivos (controle).
5 – Achados
Concepção
A decisão política de aproveitar a oportunidade oferecida pela França de cooperar com o Brasil na área de defesa resultou em imposição de prazos exíguos para o esforço analítico prévio acerca dos elementos essenciais para a implementação de um processo de inovação tecnológica. Houve limitação de tempo para o estabelecimento de critérios para seleção e para a participação de atores do segmento industrial, de pesquisa, desenvolvimento e inovação, e para a delimitação dos níveis de conhecimento que deveriam ser adquiridos.
Estruturação
Não foram delimitados, antes das contratações, os critérios para: identificar e selecionar os potenciais fornecedores brasileiros; definir e controlar metas e obrigações a serem assumidas pelos intervenientes; delimitar os direitos de propriedade; atestar o atendimento dos padrões de qualidade e competitividade dos parceiros nacionais; controlar o alcance das metas de nacionalização da produção; regular a aquisição de empresas de importância estratégica para a defesa; reter pessoal qualificado no âmbito dos empreendimentos. Não foi realizada a análise pormenorizada da viabilidade econômica e financeira dos investimentos e dos custos da manutenção e das eventuais atualizações dos meios a serem obtidos antes da formalização contratual.
Formalização
O arcabouço legal disponível à época das contratações não comportava a complexidade das relações estabelecidas entre os diversos intervenientes nos empreendimentos, tendo resultado em inadequada estruturação contratual.
Embora a Lei 12.598/2012 tenha inovado como marco normativo para as aquisições militares de grande vulto, ela ainda não se mostra suficiente para regrar contratações mais complexas, as quais adotam, por exemplo, engenharia contratual que se apresenta na forma de um contrato principal que se desdobra em outros contratos à medida que o projeto avança, havendo interconexões entre os vários ajustes sem que, necessariamente, se caracterizem em subcontratações.
A ausência de uma integração consolidada e efetiva entre o Programa Nuclear da Marinha, por intermédio do qual se desenvolve o reator nuclear, com o Prosub constitui risco significativo para a obtenção do almejado submarino nuclear.
Ambos os empreendimentos (Prosub e H-XBR) carecem de uma regulação geral dos direitos de propriedade. No caso do Prosub, esse ajuste é feito caso a caso nos contratos firmados entre a DCNS e suas fornecedoras, em uma situação propícia ao conflito de interesses. No H-XBR, a possibilidade de absorção de tecnologias por subsidiárias da transferidora estrangeira complica a definição do detentor do direito de propriedade do conhecimento.
Controle
Há necessidade de se estabelecer critérios objetivos para a aferição da transferência de tecnologia, principal dividendo de ambos os investimentos. A absorção do conhecimento é crítica para a implementação dos projetos sendo que falhas ou atrasos nessa obtenção podem impossibilitar o alcance dos objetivos colimados.
6 – Conclusão
O PROSUB e o Projeto H-XBR, ambos com um alargado ciclo de vida, ainda se encontram nos seus estágios iniciais de desenvolvimento. Essa circunstância permite aos gestores dos empreendimentos oportunidade para prover os recursos e instrumentos necessários ao aprimoramento do processo de avaliação e para readequar a base contratual dos projetos, sem oferecer riscos maiores para os seus êxitos.
O aprimoramento da dinâmica de crítica e revisão contratual pode se dar mediante esforços próprios de capacitação dos agentes e unidades envolvidos, a contratação de consultorias especializadas ou, mais apropriadamente, pela adoção de gestão de projetos formal e previamente definida pelo Ministério da Defesa para a administração de empreendimentos de grande porte. Assim, readequações contratuais poderão ter impactos valiosos no conjunto de suas execuções.
Resta ao Poder Público agir com presteza e conhecimento diante dos óbices representados pelas desvantagens assumidas nos respectivos contratos, de forma a maximizar os benefícios obtidos pelos processos de transferência de tecnologia.
Deve-se dar continuidade à correção das falhas contratuais por meio de negociação e assinatura de termos aditivos, sempre sob a égide da prevalência do interesse público, da proporcionalidade e da razoabilidade.
7 – Recomendações
Para garantir o alcance dos objetivos do Programa de Desenvolvimento de Submarinos e do Projeto H-XBR, de desenvolvimento e produção de helicópteros para as Forças Armadas, o Tribunal expediu as seguintes orientações:
Recomendação ao Ministério da Defesa:
• sistematizar o processo de avaliação e aprovação de investimento que envolva transferência de tecnologia, de forma a refletir o nível de maturidade tecnológica do comando militar que desenvolverá o empreendimento, bem como o da Base Industrial de Defesa que poderá ser beneficiada mediante acordos de transferência de tecnologia;
• atualizar a Portaria Normativa MD 764/2002 no sentido de estabelecer critérios mínimos de seleção e de inserção da indústria de defesa em empreendimentos militares que envolvam acordos de compensação, sem prejuízo do estabelecimento de parâmetros específicos por parte dos Comandos Militares em cada caso concreto;
• promover a integração entre as Forças Armadas, os fornecedores de offset, o setor industrial privado e o setor de Pesquisa, Desenvolvimento & Inovação civil e militar, de modo a evitar a duplicação de esforços em áreas de atuação que lhes sejam comuns, estimulando o compartilhamento de quadros, ideias e recursos, nos moldes da Estratégia Nacional de Defesa;
• acompanhar os projetos de investimento relacionados à aquisição ou ao desenvolvimento de materiais de emprego militar de forma integrada, utilizando, por exemplo, carteira de projetos ou portfólio, em que constem informações que permitam avaliar: cumprimento de cronograma, controle de custo, controle de escopo e o histórico das alterações dessas variáveis;
• acompanhar a evolução das transações de compensação dos Comandos Militares, por exemplo, por meio de banco de créditos de compensação, identificando as empresas beneficiárias e os valores a elas associados;
• avaliar a utilidade e a viabilidade operacional e financeira de implantar sistema informatizado de acompanhamento de investiinformações, de evitar a multiplicidade de controles e de proporcionar a gestores e a outros interessados informações relevantes, fidedignas e tempestivas; e
• avaliar, em articulação com a Casa Civil da Presidência da República e com a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a necessidade de promover avanços no marco regulatório das aquisições do setor de Defesa, a fim de conferir maior segurança jurídica aos contratos celebrados pelos Comandos Militares e permitir desenhos contratuais mais adequados à complexidade das relações entre fornecedores, beneficiários de transações de offset, governo e outros intervenientes.
Recomendação ao Comando da Marinha:
• estabelecer indicadores para mensurar a evolução dos processos de transferência de tecnologia do Prosub, para avaliar de forma objetiva os benefícios de se onerar a aquisição/desenvolvimento de equipamentos sob o argumento de que haverá capacitação da indústria nacional, ou da própria Força;
• adotar medidas de retenção de recursos humanos capacitados (pessoal civil ou militar) nos processos de transferência de tecnologia do Prosub, com vistas a garantir a transmissão dos conhecimentos adquiridos mediante transferência de tecnologia; e
• efetivar, por todos os meios disponíveis, a integração entre o Prosub e o Programa Nuclear da Marinha, de forma a garantir o pleno alcance das metas de ambos os projetos.
Determinação ao Comando da Marinha:
• manter controle de todos os custos relacionados ao PROSUB e demais projetos sob sua gestão, incorporando a estes custos, entre outros, os valores pagos a título de juros e de taxa de compromisso referentes às operações de crédito contratadas para financiá-los, a fim de se obter a verdadeira dimensão do volume de recursos públicos alocados
Recomendação ao Comando da Aeronáutica:
• intervir nos projetos de cooperação industrial para que as indústrias selecionadas detenham os direitos de propriedade intelectual referentes às tecnologias absorvidas; e
• estudar a possibilidade de adotar medidas de retenção de recursos humanos (pessoal civil ou militar) durante e após a execução do Projeto H-XBR, a fim de evitar que recursos públicos empregados em capacitação profissional sejam perdidos.
Determinação ao Comando da Aeronáutica:
• manter controle de todos os custos relacionados ao Projeto H-XBR e demais projetos sob sua gestão, incorporando a estes custos, entre outros, os valores pagos a título de juros e de taxa de compromisso referentes às operações de crédito contratadas para financiá-los, a fim de se obter a verdadeira dimensão do volume de recursos públicos alocados a cada projeto; e
• formalizar critérios para reconhecimento dos créditos relativos aos Projetos de Cooperação Industrial, considerando, em especial, o fato de que tais processos de transferência de tecnologia se encontram em curso.
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