Eleições 2014: as perspectivas de cada
candidatura para a área militar
Roberto Lopes
Jornalista especializado em assuntos militares.
Em 2000 graduou-se em Gestão e Planejamento de Defesa
no Colégio de Estudos de Defesa Hemisférica
da Universidade de Defesa Nacional dos Estados Unidos.
Autor de vários livros, em 2001 lançou, em Washington, a monografia
“Oportunidades para Civis na Condução dos Assuntos
da Defesa Nacional: o Caso do Brasil”.
No campo da Defesa Nacional, a propalada polarização entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), não passa de um monólogo.
A sete meses do pleito presidencial, a candidatura do tucano Aécio Neves ignora por completo a preparação de uma plataforma de campanha para o público militar.
Estima-se que o eleitorado ligado à oficialidade da ativa e da reserva represente, hoje, cerca de 2,4 milhões de votos, mas isso parece não sensibilizar os tucanos. Tanto que o ex-professor da Unicamp Eliézer Rizzo de Oliveira, o mais importante especialista civil nos assuntos da Defesa Nacional vinculado ao PSDB, não foi nem mesmo acionado para fornecer idéias para a jornada política que aguarda o ex-governador de Minas Gerais.
Paulista de Duartina, Rizzo de Oliveira é membro do Conselho Consultivo do Instituto Meira Mattos (antigo Centro de Estudos Estratégicos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército), vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa e um crítico dos rumos que a Comissão Nacional da Verdade vem adotando.
A esquerda petista presta bem mais atenção à área militar que o PSDB.
No ministério da Defesa, o titular da Pasta, Celso Amorim – que é filiado ao PT –, já foi avisado por seus colegas de partido que sua assessoria deverá preparar um conjunto de previsões para a gestão 2015-2018.
A Era Petista foi a que mais favoreceu o reequipamento das Forças Armadas na história republicana brasileira, mas essa marca administrativa, construída com visão de futuro (acerca do papel internacional do Brasil) pelo ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, vem perdendo prioridade rapidamente, na gestão de sua sucessora.
Sucessivos cortes orçamentários promovidos pela equipe econômica da presidenta Dilma Roussef lançaram uma sombra de incertezas sobre quase todos os programas-chave da Defesa Nacional.
Impulsionado pela crise com os Estados Unidos – e por pressões pessoais de Amorim e do comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juiniti Saito – o atual governo deu solução ao tortuoso processo de seleção de um novo caça para a Força Aérea Brasileira, mas o retardamento dessa decisão (fruto de indecisões que se sucederam por mais de dez anos) ainda produzirá uma fragilidade na defesa aérea entre os anos de 2016 e a primeira metade da década de 2020, quando os jatos F-5M (modernizados) já estiverem sendo retirados de serviço, e os primeiros Gripen NG, adquiridos por meio do Programa F-X2 ainda estiverem sendo recebidos.
Para piorar, um novo atraso ameaça comprometer a aviação de combate da FAB: o da virtual paralisação, por falta de verbas, do processo de atualização dos aviões de ataque A-1.
No início do ano passado, a previsão era de que oito das 47 aeronaves desse modelo (AMX) fossem modernizadas, mas apenas uma (!) pôde ser entregue. O cronograma previa mais dez entregas para 2014, mas nesse primeiro trimestre só mais uma foi recebida pela Força Aérea – obviamente, integrante do lote previsto para ser aprontado em 2013.
Estimativas recentes calculam que, nesse ritmo, a entrega dos jatos, que deveria ser completada em 2017, só acabe em 2024… Considerando que os últimos exemplares a serem remodelados devem voar, no mínimo, mais dez anos, chega-se à fácil conclusão de que, em 2034, a FAB ainda terá em ação aeronaves que começaram a ser desenvolvidas na Itália em 1978: 56 anos antes!
Os cortes orçamentários também repetem, na área da Defesa Nacional, o mesmo jogo de regras fluidas, instáveis, que a administração Dilma vem praticando com o empresariado brasileiro ao longo dos últimos anos.
Entre 2009 e 2010, corporações de sucesso consolidado nos segmentos aeronáutico, aeroespacial e de infraestrutura foram incentivadas pelo governo a se associarem a gigantes da tecnologia militar ocidental, no sentido de se prepararem para fornecer equipamentos às Forças Armadas brasileiras.
Várias dezenas de programas para forças de terra, mar e ar – alguns deles, bilionários –, foram oferecidos a esses empreendedores, sob o compromisso de que eles gerassem empregos e qualificação de mão de obra. Afinal, o país é candidato a uma vaga de membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, e isso não se postula sem um dispositivo militar capaz de intervir militarmente (por mandato da ONU) em qualquer parte do mundo.
O próprio Executivo acenou com seu apoio à nova parceria, ao autorizar o estabelecimento de uma série de estímulos fiscais às companhias da chamada Base Industrial de Defesa (BID). Contudo, no início do ano, veio a surpresa: um corte brusco, sem explicações, de R$ 3,61 bilhões nas verbas do Ministério da Defesa – que deixa as integrantes do BID inquietas e, sobretudo, inseguras em relação aos investimentos já realizados para atender os planos das Forças Armadas.
O que a Pasta da Defesa tem a dizer sobre a tesourada, de forma a tranqüilizar os industriais? Nada. Só o silêncio.
Se, como é provável, o que o PT vai oferecer ao público militar e aos industriais do BID é mais do mesmo, a melhor expectativa que os profissionais civis e militares responsáveis pela segurança nacional podem ter, é na vitória, em outubro vindouro, do governador de Pernambuco, Eduardo Campos.
Na candidatura da coligação PSB/Rede/PPS, o programa militar foi lembrado por obra do ex-ministro da Defesa, José Viegas Filho, embaixador aposentado que, em 2013, teve duas conversas pessoais com Campos sobre diretrizes para a política externa brasileira.
Em fevereiro desse ano, ao receber de Carlos Siqueira, presidente do Instituto João Mangabeira, e do ex-ministro Roberto Amaral, 1º vice-presidente do PSB, algumas orientações relativas à preparação de uma proposta de política externa, Viegas ofereceu-se para coordenar também uma proposta para a área de Defesa – o que foi imediatamente aceito.
O programa de campanha de Eduardo Campos para a área militar deve trazer três diferenciais, em comparação com a rotina de contingenciamentos orçamentários oferecida pelos petistas da Defesa: (a) a valorização da chamada “Família Militar”, (b) a elevação da proteção dos ecossistemas e recursos marítimos ao rol das prioridades da Defesa Nacional, e (c) o compromisso de recompor as verbas anteriormente destinadas às compras de equipamentos militares na indústria nacional.
Zelar pelo capital humano das Forças Armadas não é só trabalhar pela recomposição salarial dos homens e mulheres que arriscam suas vidas, diuturnamente, em prol da Defesa Nacional – é também minimizar os efeitos dessa defasagem. Trata-se, nesse caso, de acabar com o represamento dos direitos dos servidores militares da ativa (situação que aos petistas parece não incomodar), ou seja, investir em moradias funcionais (ou auxílio-moradia) e assistência médica de qualidade para eles e seus parentes mais próximos.
Carreiras militares são mal pagas em quase todas as nações civilizadas do mundo (à exceção da Rússia de Putin), e esse fato vem levando dezenas de governos a promover mecanismos de compensação que sirvam à sobrevivência da “Família Militar”. É assim nos Estados Unidos – onde militares usam tickets-alimentação até para ir ao Burger’s King –, na Espanha, onde uma equipe de senadores montou um “Observatório da Vida Militar” para analisar as agruras rotineiras dos servidores militares, na Argentina, no Japão, na Venezuela…
Mas o programa de campanha engendrado por Viegas para ser levado ao governador Campos também dá ênfase, é claro, a pontos específicos do reaparelhamento das Forças Armadas. É nesse espectro que figura a seleção de um novo jato de treinamento para os pilotos de combate da Aeronáutica – uma espécie de F-X3 de custo bem mais modesto que o F-X2, calculado entre US$ 800 milhões e US$ 1 bilhão.