Fernanda Corrêa – O futuro da Energia Nuclear no Brasil no século XXI

 

Fernanda Corrêa

Doutora em Ciência Política pela UFF e professora de Geopolítica da Escola Superior de Guerra

 
A produção de energia elétrica das usinas nucleares é semelhante à das usinas hidrelétricas, com investimentos maciços do Estado, que envolvem investimentos em obras civis, montagem eletromecânica, compra de equipamentos, materiais e tecnologias, capacitação em mão de obra especializada e não especializada, capacitação tecnológica de fornecedores nacionais, implantação de cultura organizacional voltada para a segurança, treinamentos, compensações socioambientais, planejamento de emergência, comissionamento de equipamentos e sistemas e testes operacionais etc.

A matriz energética é extremamente rica. Comparando as fontes que são consideradas matrizes (hidrelétricas e as termoelétricas), a única capaz de gerar eletricidade despachável e na base da carga do sistema é a nuclear. Em estudos analíticos, comparada à todas as fontes no Brasil, a nuclear é a que apresenta o melhor custo/benefício.

Subsidiária da ELETROBRAS, a estatal ELETRONUCLEAR (ETN) é uma sociedade de economia mista criada em 1997 com o propósito de operar e construir usinas nucleares. A Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, localizada no município de Angra dos Reis, estado do RJ, é composta pelas duas usinas nucleares em operação mais Angra 3, que se encontra em construção. A geração nucleoelétrica consumida no Brasil é de cerca de 3%. No sistema elétrico interligado, só o estado do RJ consome 30% da eletricidade gerada por Angra 1 e Angra 2.

A capacidade atual de geração de Angra 1 é de 640 MW e a de Angra 2 é de 1.350 MW. Angra 1 foi adquirida da empresa estadunidense Westinghouse e Angra 2 foi adquirida do consórcio alemão KWU/Siemens. Até outubro de 2017, Angra 1 e Angra 2 produziram um total de 1.975 MW. A previsão da capacidade nucleoelétrica de Angra 3 é de 1.405 MW. Quando esta última entrar em operação comercial, será capaz de sozinha de gerar energia equivalente a 50% do consumo do estado do RJ e gerar mais de 12 milhões de MW/h por ano.

Diversas empresas estrangeiras têm manifestado interesse de investir na construção das futuras usinas nucleares no Brasil, tais como, a estadunidense WESTINGHOUSE, a russa ROSATOM, as francesas FRAMATORE e EDF e as chinesas CNNC e SPIC. Todas estas empresas já mantêm escritórios no RJ. Todas elas trarão conhecimentos e tecnologias de ponta.

As usinas nucleares brasileiras operam com reatores de água pressurizada. A participação destas empresas nesta empreitada possibilitará que novos modelos tecnológicos passassem a estar disponíveis em nosso mercado. Os reatores das usinas nucleares brasileiras pertencem a uma das gerações de reatores mais seguros que existem. Além deste modelo, existem reatores de água fervente, reatores refrigerados a gás moderados a grafite, reatores arrefecidos a gás a uma temperatura elevada, reatores de água pesada etc. Nunca houve um acidente nuclear no Brasil.

A humanidade teve o desprazer de conhecer a energia nuclear por seu mau uso. A utilização desta fonte para fins pacíficos é uma modalidade tecnológica que ainda estamos experimentando. Nestes novos tempos, a nuclear é a que despontará como a mais promissora das fontes de energia. Na medicina, a produção de radiofármarcos, substâncias que, por sua constituição farmacêutica, quantidade e qualidade de radiação, é utilizada no diagnóstico, no tratamento e/ou na cura de doenças como o câncer, infarto do miocárdio, disfunção renal etc.

Sendo o câncer uma das doenças que mais mata, é preciso que a sociedade brasileira compreenda a importância desta fonte em sua vida. Além de esta fonte esterilizar insetos transmissores e propagadores de doenças, ela irradia alimentos, aumentando as suas vidas úteis para que possam ser exportados a outros países sem o risco de perecerem ao longo do caminho. As mudanças climáticas também colocam a estabilidade econômica global em xeque, tendendo a favorecer a nuclear por ser fonte limpa, que não emite CO2 na atmosfera. 

A energia nuclear tem voltado ao centro das discussões políticas e econômicas mundiais de forma positiva. O setor nuclear tem as mais qualificadas mãos de obra do país, mas, a sua renovação é urgente. Embora já existam pós-graduações em engenharia nuclear, a UFRJ se tornou a precursora ao criar a graduação nesta área. Aos jovens está sendo dada a oportunidade de serem os precursores na área de tecnologia de ponta e a responsabilidade de cobrir lacunas em CT&I.

O mercado nuclear brasileiro tem se expandido cada vez mais. Além das próximas centrais nucleares, existem outros projetos nucleares, como o reator nuclear para propulsão de submarinos, o reator multipropósito para a medicina nuclear e o reator nuclear dessalinizador. Por meio de uma parceria INPE/CNEN um reator de fusão nuclear em escala experimental está sendo construído no Brasil.

Embora já dominemos a tecnologia de fissão nuclear, com o conhecimento de tecnologias de reatores de fusão, o Brasil será um dos poucos países no mundo com capacidade de gerar eletricidade usando fontes praticamente inesgotáveis, baratas e seguras. Estes jovens serão os desbravadores do conhecimento e desenvolvedores de tecnologias de ponta no país, proporcionando à sociedade brasileira a qualidade de vida que tanto deseja.

Um dos óbices mais críticos na retomada de Angra 3 é o valor da tarifa fixada para a produção de MW/h. A revisão desta tarifa é urgente, pois, o valor atual de R$ 244 MW/h torna inviável investir no empreendimento. O valor ideal é de R$ 400 MWh. Só em 2018, a ETN terá que pagar mais de R$ 100 milhões na manutenção das estruturas das obras de Angra 3 e valor ainda maior com dívidas de pagamento de contratos e seus respectivos juros de financiamento com BNDES e CEF.

Após esta revisão, a ETN terá condições de renegociar estas dívidas e abrir chamada pública para seleção de um sócio para concluir a construção de Angra 3. O que não falta em nosso país é interesse estrangeiro em investir na construção. Quanto mais o tempo passa, mais estruturas e equipamentos se degradam e mais a estatal terá que gastar com materiais, serviços e seguros para manter a obra paralisada.

Depois de um período tumultuado, uma nova gestão assumiu a presidência da ETN. Além da nuclear apresentar o melhor custo/benefício e de posicionar o Brasil entre os mais desenvolvidos economicamente, teremos a nossa disposição uma comunidade de engenheiros nucleares participando dos projetos nucleares nacionais, disporemos de tecnologias de reatores de diferentes modelos, investimentos em P&D contínuos e fonte praticamente inesgotável de energia limpa e segura por gerações. Estes são alguns dos muitos benefícios que retornarão ao país. Diante de tantos benefícios a curto e longo prazos, será que ainda podemos falar em gastos?

Não! A palavra é investimento!

Fica a reflexão.   

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