Uma segunda chance para a modernização nuclear americana


Uma segunda chance para a modernização
nuclear americana


 

Por Bob Butterworth – Breaking Defense
Tradução, adaptação e edição: Nicholle Murmel


O debate em Washington acerca dos novos submarinos nucleares armados com mísseis balísticos para a US Navy vem se concentrando em como poderemos pagar por eles. Neste editorial, porém, Bob Butterwoth, colaborador recorrente do Breaking Defense, propõe um olhar mais abrangente. Para ele, a declaração pública da US Navy de que não pode arcar com o programa de substituição dos submarinos classe Ohio é uma oportunidade – um momento de clareza que deve forçar a administração pública a repensar seus planos para todo o aparato nuclear. Em um mundo cada vez mais perigoso, armas atômicas ainda são necessárias, mas o perigo é diferente dos idos da Guerra Fria, e requer um pensamento também diferente acerca de armamentos nucleares. – Sydney Freedberg, vice editor.

Graças à Marinha, agora temos a chance de criar uma postura institucional adequada para encarar nossos desafios futuros na área nuclear.

Recapitulando: em 2009, o então recente governo Obama preparou uma revisão da doutrina nuclear, o Nuclear Posture Review, cuja conclusão era de que o país estaria mais seguro com menos forças nucleares em serviço. No ano seguinte, o governo apresentou para avaliação e aprovação do Senado o acordo New START, combinando-o em seguida com um plano para modernizar a tríade clássica através da construção de novos ICBMs, novos submarinos para lançar SLBMs, e novos bombardeiros para transportar armas atômicas, todos com entrada em serviço prevista para os anos 2030 e 2040.

Novos mísseis lançados de submarinos  viriam em seguida para acompanhar as embarcações. O ano de 2011 trouxe uma versão reduzida desses planos, atrasando o programa de substituição de submarinos em dois anos, e suspendendo por tempo indeterminado o projeto de aeronaves para transportar bombas. Já 2014 veio anunciando um atraso de três anos no início dos trabalhos em um novo míssil de cruzeiro lançado a partir do ar.

Todos esses programas são, supostamente, muito caros, como os atrasos e alterações sugerem. Só os esforços da US Navy já devem ter somado uns 100 bilhões de dólares e comprometeram quase metade do orçamento para construção naval por vários anos. E, como era de se esperar, a Marinha declarou ao Congresso em julho deste ano que o plano de construir novos SSBNs não é “suportável” sem conceder à Corporação muito mais dinheiro.

E assim, agora existe até mesmo a possibilidade de reconsiderar todo o esquema de modernização nuclear. Com ou sem atrasos, o plano do governo iria apenas refinanciar a doutrina institucional militar que surgiu de competições internas há 50 anos. É essa a melhor postura para enfrentar ameaças e desafios dos próximos 50 anos?

Talvez, mas não houve muita análise estratégica que justificasse essa percepção, e os argumentos que a apoiam têm um sabor de “superpotência vs. superpotência” bem característico da Guerra Fria. É difícil enxergar essa abordagem como mais do que um replay de políticas burocráticas, nas quais a Força Aérea e a Marinha abrem mão de alguns mísseis operacionais cada uma, e autoridades externas enviam relatórios atestando que não podia concordar mais com tais medidas.

Mas enquanto o ambiente burocrático permanece o mesmo, não é o caso do ambiente estratégico – os alvos para dissuasão são diferentes daqueles da Guerra Fria. Os objetivos, cálculos e levantamentos acerca de potências regionais com capacidade atômica – Correia do Norte, Paquistão, Índia e, quem sabe em breve, o Irã – são obscuros, mas certamente significativos. A atmosfera operacional e diferente, afetando o entendimento e avaliação das ameaças e dos compromissos a serem assumidos. As demandas por uma dissuasão prolongada são diferentes. As conexões ente conflitos regionais e interesses de grandes potências também são outras.

No cenário atual o gerenciamento de crise e o controle da escalada dos conflitos é distinto. Em caso de confronto com os Estados Unidos, uma potência regional com poucas armas nucleares pode usá-las para começar a guerra, e talvez em seguida pedir um acordo de paz e esperar que pressões internacionais limitem a resposta americana. Ou ainda, esse possíel adversário pode guardar seu arsenal e usá-sá-lo quando as tropas terrestres já estiverem invadindo, ou quando alvos valiosos estiverem concentrados em portos e bases aéreas.

Em ambas as hipóteses nossos cálculos mudam. Se as armas nucleares forem usadas primeiro pelo agressor, grande ou pequeno, os EUA podem não responder na mesma moeda, talvez para evitar que outros sofram os efeitos posteriores da radiação ou, no caso de um agressor menor, evitar que outras nações se sintam compelidas a ajudar. O presidente teria que considerar o quão bem nossas forças convencionais atuariam em um ambiente atômico, se temos armamentos nucleares com opções de lançamento e efeitos adequados às circunstâncias do conflito, e ainda se vidas americanas seriam poupadas usando esse arsenal.

O planejamento dos EUA acerca de defesa e dissuasão atômica também deverá considerar como elementos não-nucleares estão se transformando por conta do desenvolvimento das áreas espacial e de guerra cibernética. Operações inovadoras nesses campos poderiam prover não só melhores dados de inteligência, mas até mesmo “imobilidade” – hackeamento de redes de computadores, por exemplo – que negaria comando e controle ao agressor.

Precisamos compreender o que essas capacidades podem representar em cenários de guerra nuclear – como podem ser usadas, quais vulnerabilidades elas podem ter, como essas ferramentas podem ser coordenadas e administradas, que tipo de sinergia se pode conseguir através do comando unificado dessas operações tecnológicas. Também será importante avaliar se essas vantagens do lado americano poderiam ser neutralizadas pelas armas atômicas de um adversário menor. Em particular, devemos determinar que políticas e estratégias seriam viabilizadas ou impedidas por essas possíveis conjunturas.

Operações espaciais e cibernéticas também vêm aumentando a intgração das forças convencionais, mas esse processo ainda não inclui planejamento para um teatro de operações atômico. O resultado desse lapso pode ser a falha em desenvolver opções apropriadas que fortaleçam tanto a capacidade de dissuasão quanto de defesa e contenção. Nossos procedimentos nucleares nos permitiriam engajar alvos dinâmicos no campo de batalha?

Ou os EUA só conseguiriam usar seu arsenal contra objetivos mais estratégicos e fixos? Qualquer emprego dessas armas demandaria atenção minuciosa aos efeitos no país-alvo, em outras nações próximas, bem como os interesses de outras potências atômicas, especialmente as de grande porte. Por fim, também haveria de se considerar os efeitos para as futuras operações americanas em solo inimigo após a intervenção nuclear.

Uma revisão cuidadosa dessas mudanças no panorama estratégico global pode reafirmar os atuais planos do governo como capazes de assegurar forças de defesa e dissuasão mais coerentes com cenário futuro, mas eu duvido. Seguir em frente com raciocínios obsoletos e investir tão pesadamente em posturas institucionais do século passado pode provocar rejeição ainda maior à empreitada nuclear.

Uma atitude e uma estrutura mais flexíveis, com mais opções de planejamento adaptável e resposta versátil, certamente se adequariam melhor às surpresas que certamente vamos encontrar. Essa mudança de perspectiva também ofereceria ao presidente mais opções para controlar situações, e mesmo remediar um pouco a já notória falta de consenso acerca das nossas forças nucleares estratégicas.

Bob Butterworth, membro da Comissão de Colaboradores do Breaking Defense, é consultor especialista em assuntos e inteligência nuclear. Butterworth também é presidente da Aries Analytics e atua como conselheiro sênior para a chefia do Space Command, além de membro do Foreign Intelligence Advisory Board, a serviço do presidente, e membro do Select Committee on Intelligence do Senado americano.

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