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Nova Couraça: Propostas para o Futuro dos Carros de Combate no Exército Brasileiro

Propostas para o Futuro dos Carros de Combate no Exército Brasileiro

Rogerio Atem de Carvalho

Instituto Federal Fluminense

Eduardo Atem de Carvalho

Universidade Estadual do Norte Fluminense

Dos mesmos autores Série sobre Guerra Assimétrica Acesse Link

Resumo

As diretrizes publicadas recentemente pelo Alto Comando do Exército (Portaria no. 126 de 12 de junho de 2019) apontam diferentes (possíveis) caminhos a serem tomados quando se trata do futuro da força de Carros de Combate da Força Terrestre. No curto e médio prazo existe uma maior probabilidade de um processo de modernização dos componentes principais dos modelos existentes, enquanto que no longo prazo se aponta, acompanhando as tendências mundiais, para a adoção de uma família de blindados que contemple não apenas uma solução para Carro de Combate, mas também blindados de Infantaria, Engenharia, Artilharia e de suporte. Nesse sentido, este artigo revisita e amplia trabalho anterior dos autores, abordando as possibilidades para a modernização dos blindados existentes e a proposição de uma família futura, com foco em uma metodologia básica que priorize os elementos que devem ser produzidos no país e observações acerca das possibilidades de pesquisa e desenvolvimento dentro de modernos mecanismos de colaboração Governo, Indústria e Academia. 

 

1. Introdução

Em 12 de junho de 2019 o Chefe do Estado Maior do Exército emitiu a portaria de número 162, aprovando a chamada “Diretriz Estratégica para a Formulação Conceitual dos Meios Blindados do Exército Brasileiro […]”. (ìntegra da Diretriz pode ser acessada Link)

A portaria estabelece definições, atribuições e objetivos para os as diversas Diretorias e o CMS, de forma a produzirem um novo documento que deverá então balizar as decisões do Exército Brasileiro nos anos vindouros neste campo estratégico e decisivo, que são as formações blindadas e seus meios, definindo “as estratégias para minimizar o hiato tecnológico atual dos componentes digitais e optrônicos embarcados nos blindados do Exército […]”. Para os profissionais que irão compor esta comissão de saída são citados 16 documentos básicos que servem de referência. O documento a ser gerado deverá balizar medidas emergenciais para a frota atual, atreladas ao volume de recursos realmente disponíveis, bem como medidas de médio e longo prazos.

           

Ainda segundo a Portaria 162, no seu item 5.b, os projetos de modernização deverão considerar a existência de ilhas de modernidade, de pronto emprego, próximas ao estado da arte, bem como outras unidades que deverão ser adestradas no nível mais próximo possível deste, até onde permitir o orçamento. Esta abordagem se alinha com a história dos conflitos militares, onde o grau de adestramento e a moral da tropa sempre foi mais importante que o material disponível. O exemplo mais incontestável disto se passou no Oriente Médio, onde Israel venceu seus oponentes, melhor armados, em maior número e assessorados pela URSS (1967 e 1973), nas três grandes guerras em que disputou contra seus vizinhos (1948, 1967, 1973). Até mesmo a superioridade numérica, combinada com o elemento surpresa caíram diante do treinamento superior na Guerra do Yom Kippur. Historicamente, portanto, é acertada a decisão do Estado Maior do Exército em priorizar o treinamento.

           

A racionalização de meios de treinamento pode ser alcançada pelo uso do Centro de Instrução de Blindados (CIBld) como unidade de treinamento de novas tecnologias. Ao invés de se pulverizar os meios de instrução em diversas unidades, deve se concentrar estes meios no CIBld e oferecer estágios e cursos que habilitem militares de todas as especialidades relativas à guerra blindada no estado da arte, pelo pessoal mais qualificado do EB. Todo o material de instrução disperso por escolas, a menos das de manutenção, deve ser reunido no Centro. Nas escolas deve se ensinar com profundidade os fundamentos teóricos, aqueles que não mudam com o tempo e que seguirão com o combatente por toda a sua carreira. A vanguarda tecnológica e o emprego desta fica para as unidades de ensino posteriores, como o CIBld.

No intuito de contribuir para o avanço na elaboração da estratégia de modernização das forças blindadas do Exército Brasileiro, este artigo visa discutir mecanismos viáveis de aquisição e manutenção de uma frota homogênea junto à indústria nacional, no médio e longo prazo, sem abranger todos os tópicos cobertos pela Portaria 162, nem comentar os assuntos que são domínio da Doutrina e seus profissionais.

 

2. Produção de Um Carro de Combate: Questões Industriais

Este tópico reapresenta o método proposto originalmente pelos autores em Carvalho e Carvalho (2017), reproduzindo quase que ips literis parte deste documento. O modelo apresentado serve de base tanto para definições do processo de modernização quanto de produção de uma nova família de blindados.

           

Ter o máximo possível de independência quanto ao fornecimento de uma nova solução, ou de uma modernização dos atuais, para o Carro de Combate do EB é desejável, por motivos estratégicos óbvios: não faltam na História exemplos de países que tiveram o fornecimento de armas, munições e componentes cortado nos momentos mais necessários, como o clássico caso das aeronaves Mirage 5 para Israel (Israel Defense, 2015) e mais próximo, o caso dos mísseis Exocet para a Argentina na Guerra das Malvinas (Freedman, 2005). A decisão do que produzir em um CC, porém, não é trivial, como não é quando se trata de qualquer produto complexo. 

A forma de se avaliar o que produzir de um Carro de Combate e, essencialmente, de qualquer produto final complexo, passa por dois aspectos principais, que são o domínio das tecnologias envolvidas e a necessária escala industrial para manter os custos de produção em níveis aceitáveis. Estes aspectos serão analisados a seguir. 

2.1 O Domínio das Tecnologias

Este item se refere ao corpo de conhecimentos necessários para produzir em solo nacional os componentes que se desejam. Este domínio, por sua vez, pode se dar de duas formas: desenvolvendo a tecnologia ou adquirindo a tecnologia:

a) Desenvolver a tecnologia: traz maior independência e benefícios em termos de aplicações duais (em outras áreas), além de formação de pessoal. Como desvantagem, consome maior tempo e impõe maiores riscos. Pode não conseguir atingir em tempo hábil o nível de maturidade desejado.

b) Adquirir a tecnologia: é mais rápido e com menos riscos, porém envolve dependência, inclusive com restrições de comercialização para terceiros e uso em outros projetos, não formam recursos humanos com tanta profundidade de conhecimentos quanto ao desenvolvimento, e existem questionamentos sobre se é realmente possível “absorver” tecnologia. O elemento de custos também pode ser questionado, posto que tecnologia adquirida envolve pagamento de royalties e limites à comercialização, que pode reduzir a escala e influenciar diretamente nos custos.

Em resumo, desenvolver significa assumir menor risco comercial e estratégico, porém com maior risco tecnológico, enquanto que adquirir, significa o oposto: ter menos risco tecnológico e mais comercial e estratégico.

2.2 Escala Industrial

A escala industrial refere-se basicamente à quantidade economicamente viável para se produzir um determinado produto a um custo aceitável. Por vezes, a análise da escala industrial aponta soluções que se opõem às questões tecnológicas vistas anteriormente, portanto, critérios de avaliação da escala devem ser cuidadosamente levados em conta, como visto a seguir.

·     

Critérios de avaliação

Deve-se notar que, atualmente, desenvolver uma tecnologia não significa necessariamente produzi-la. Como exemplo, tem-se o casco da viatura blindada de combate de infantaria (VBCI) Namer do exército israelense, projetado em Israel, mas fabricado nos EUA, por questões de disponibilidade (custo) de instalações industriais (ZIDON, 2012). Assim, deve-se considerar que para cada subconjunto, seu desempenho relativo aos objetivos do processo decisório (utilidade) deve ser medido quanto aos aspectos tecnológicos e de fabricação. Por sua vez, cada um desses aspectos é avaliado por duas variáveis:

a) Custo: refere-se ao esforço financeiro para desenvolver e/ou produzir determinado item, quanto maior, pior quando comparado à alternativa concorrente. Por exemplo, quanto maior for o custo de produzir o tubo do canhão, melhor será adquiri-lo pronto.

b) Criticalidade: refere-se a quão estratégico para a organização, no caso o EB, é dominar a tecnologia e/ou fabricação daquele item, este critério por vezes se opõe ao custo. Em outras palavras, o alto custo pode indicar a não fabricação, mas a sua criticalidade pode indicar o contrário. 

Conforme citado anteriormente, fica ainda mais clara a opção de que por vezes vale mais a pena dominar o projeto do que propriamente a fabricação de determinados itens.

2.3 Modelo decisório

É possível produzir um modelo decisório baseado em múltiplos critérios que, em face das alternativas existentes, conduza a um plano de produção e/ou nacionalização consistente. Deve-se compreender, porém, que este plano será dinâmico, devido à janela de tempo de produção. Naturalmente, quanto mais tempo previsto para produzir a quantidade necessária para equipar o EB, maior será o risco de o plano ser impactado por questões orçamentárias, cambiais e macroeconômicas. Como está fora do escopo deste artigo apresentar tal modelo em detalhes, apresenta-se aqui apenas sua base:

–   Objetos: Subconjuntos do CC

–  Aspectos: Tecnologias e Fabricação

–  Critérios: Custo e Criticalidade

Como exemplo, tem-se o Subconjunto Sistema de Pontaria,formado por hardware, software, sistemas ópticos e sistemas termo-ópticos. Para cada item do subconjunto devem ser avaliados os aspectos tecnológicos e de fabricação, sob a luz de custos e criticalidade. Tome-se o hardware do sistema de pontaria (simulação proposta, de acordo com a visão dos autores):

– Quanto a Desenvolver ou Adquirir Tecnologia: dada a base tecnológica nacional na área, é possível desenvolver a tecnologia (projetar o hardware) em tempo hábil e com a qualidade desejada – a menos do processador central. Sua criticalidade é alta e seu custo de desenvolvimento é médio. 

– Quanto a Fabricar a Tecnologia: novas tecnologias de produção de circuitos impressos permitem fabricá-los em pequenos lotes a custos baixos (Anderson, 2004), porém, deve ser considerado o processador. Neste caso, seria recomendável adquirir algum “de prateleira” (Component Off The Shelf – COTS), sem restrições de aquisição e baixo custo. Fabricar é de alta criticalidade e baixo custo relativo. Parte dos componentes do item seriam importados.

Assim, para este item específico, aponta-se para a decisão de dominar por completo o ciclo de produção, a menos de um dos subitens, o processador, posto que seu projeto e produção dependem de uma escala muito maior, para além, inclusive, da indústria bélica apenas.

2.4 Ranking Sugerido

Deve ser considerado que, atualmente, em face do aumento da blindagem e poder de fogo das VBCI, já é perfeitamente considerável que a família de blindados[i] baseada no CC não se limite a veículos de Socorro, de Engenharia e Lança Pontes, como usualmente, mas também ao blindado transporte de tropas, o que pode aumentar a escala de produção e reduzir custos, tanto de aquisição quanto de operação e manutenção, custos estes que compõem o chamado Total Cost of Ownership (TCO)[ii]. Nesse aspecto, com o crescente índice de tecnologia embarcado nos veículos militares, estes estão caminhando para uma situação similar aos dos modernos caças, nos quais o custo total de propriedade é de 3 a 5 vezes maior que o de aquisição, ou seja, para produtos militares de alta tecnologia, o custo de aquisição as vezes responde apenas por cerca de 15-20% do custo total, o restante sendo associado a componentes, serviços e munições (Herrmann et al., 2004). Isso aponta para uma solução há muito compreendida por Israel, qual seja: focar na produção dos itens estratégicos e de ciclo de vida mais curto, de maneira a unir independência à escala industrial. Explica-se: durante a vida operacional de um caça, quantas vezes se troca sua estrutura central, por exemplo? Tipicamente, nenhuma. Já componentes eletrônicos e do turbopropulsor são substituídos com frequência e, portanto, além de menores e mais baratos, terão fornecimento necessário durante toda a vida útil do equipamento. Se o país que vendeu o caça não quiser vender mais a aeronave, não há problema.

O problema existe se não for possível adquirir mais peças do motor e munições. É claro que produzir partes da estrutura ainda é vantajoso, mas quando se tem escala, seja no próprio produto, seja quando a planta produtora pode fabricar, a custos competitivos, para outros produtos.

Baseado em uma avaliação sem ter posse dos custos detalhados de produção e projeto, os autores sugerem o seguinte ranking de subconjuntos a se nacionalizar, com as devidas justificativas:

1) Munições: prioridade máxima e absolutamente indispensável, nenhum Exército da importância do EB pode abrir mão de ter as diversas munições para seu CC fabricadas em solo nacional, com a tecnologia completamente dominada. Depois do Homem e das armas em si, as munições são o principal elemento da Guerra.

2) Sistema de Comunicações: na era da Guerra Centrada em Redes[iii], é vital ter o domínio sobre o sistema de comunicações, primeiramente para evitar que o adversário o invada e segundo para potencializar a capacidade de combate do elemento blindado através de uma eficiente coordenação de seus meios.

3) Hardware e Software do Sistema de Pontaria: éa alma combatente do CC. É vital ter segurança de que a eletrônica e o software são auditáveis não existindo bugs e Cavalos de Troia ou similares embutidos no sistema, em especial naqueles adquiridos de fornecedores externos.  Além disso, a eficiente integração do hardware, software e sistemas óticos e térmicos aumenta a fluidez e precisão da informação relativa aos alvos, aumentando a consciência situacional da tripulação sendo, portanto, um diferencial no campo de batalha.

4) Elementos Óticos e Termo-óticos do Sistema de Pontaria: compõem com o hardware e software, sendo um pouco menos críticos porque, embora façam parte do mesmo sistema, não permite invasão por parte do adversário.

5) Conjunto Rodante: o poder dos blindados está na sua proteção e no seu movimento, junto com o conjunto motriz este elemento é vital. Troca de posição no ranking caso o CC seja de projeto integralmente nacional, ou seja, rodas, polias, esteiras e potencialmente, amortecedores, sejam projetados exclusivamente para o modelo a fabricar. São de maior rotatividade relativa – elementos de esteiras e amortecedores, são de fabricação simples e críticos.

6) Conjunto Motriz: elementos com alta rotatividade e vitais para a operacionalidade do CC. Sua produção pode ser realizada por subsidiárias dos grandes fabricantes em plantas já existentes no país. Deve-se atentar para alguns detalhes, como por exemplo, é economicamente vantajoso fabricar o bloco do motor? Ou apenas seus componentes que são trocados com mais frequência?

7) Armamento Principal: apesar de ser de suma importância, apresenta vida útil relativamente grande e sua produção, em especial a do cano em si, é complexa e cara. Devido sua importância estratégica, é interessante poder fabricar este elemento do canhão ou adquiri-lo e manter em estoque para trocas, caso não seja possível fabricar. Notar que no modelo decisório proposto, este é um subconjunto de alto valor estratégico, porém de tecnologia que não vale a pena desenvolver e produzir devido aos custos envolvidos.

8) Blindagem Extra Móvel: é um subconjunto de classificação complexa, uma vez que em tempos de paz este material fica armazenado nas unidades, poupando combustível durante exercícios e outras atividades, mas quando da participação em forças de paz, deve se prever seu consumo e substituição em ritmo mais acelerado, em especial quando em operações envolvendo conflitos assimétricos. Sua tecnologia tende a ser mais avançada que a do casco, no caso de compósitos cerâmicos ou bem simples, como a “gaiola” anti-RPG.

9) Torre: guarda os elementos de combate e, em termos industriais, é o elemento mecânico de maior complexidade, agregando tecnologia no que tange à blindagem. Neste aspecto, sofre também com a questão de escala, embora dominar a fabricação de blindagens compostas é interessante do ponto de vista geral para a indústria bélica. Adicionalmente, em modernizações geralmente a torre é afetada, portanto é interessante ter pelo menos parte do maquinário industrial para manipular este subconjunto.

10) Casco: Mais baixa prioridade de todas, é o subconjunto que agrega menos tecnologia e o menos afetado em toda a vida útil do blindado. Sua produção só é economicamente viável se for possível usar o maquinário para outros blindados, ou seja, para poder cobrir o próprio investimento no maquinário.

Como se pode ver, a decisão do que desenvolver e do que produzir não é simples e pode variar no tempo, sendo assim, o plano de produção do blindado, como de qualquer outro produto complexo e que não seja fabricado massivamente, deve prever limiares, que quando ultrapassados, devem gerar mudanças nos planos de produção. Por exemplo, aumentos no dólar podem passar a justificar a fabricação de componentes que antes eram importados e vice-versa. Cortes orçamentários podem aumentar as janelas de entrega e dificultar o plano de nacionalização também – como se tem visto no Programa HX-BR, por exemplo. Outro fator preponderante é a primeira decisão a se tomar: produzir algo totalmente novo, adaptar um projeto existente, ou simplesmente fabricar sob licença.

 

2.5.Modelos Modernos de Cooperação para Desenvolvimento de Soluções

O EB já possui algum histórico de cooperação com instituições de ciência e tecnologia (ICTs), porém, se comparado às outras forças, este histórico é bastante tímido. Nesse sentido, surgiram recentemente no horizonte novas formas de financiamento à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI), que podem apontar caminhos que podem aumentar a colaboração entre o EB e as ICT e ainda, facilitando o desenvolvimento de soluções nacionais.

O primeiro foi a publicação do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação, estabelecido pela Lei 13.243 de 11/01/2016, regulamentado pelo Decreto 9.283, de 07/02/2018. De forma resumida, o Marco Legal cria uma série de facilidades que favorecem a colaboração entre indústria, ICTs e governo em projetos de PDI, como por exemplo a possibilidade de servidores públicos atuarem em empresas durante os projetos, aquisições facilitadas de material e equipamentos, uso compartilhado de instalações e laboratórios etc.

Outro mecanismo, é a chamada Lei do Bem, que permite que de 60 a 85% dos investimentos em PDI de empresas que operam na tributação sobre o Lucro Real possa ser abatido do imposto a ser pago. Embora, devido às características deste modelo tributário, se aplique a empresas de grande porte, é uma forma de reduzir substancialmente investimentos no desenvolvimento de novos produtos, inclusive com a subcontratação de empresas de menor porte no formato denominado Encadeamento Tecnológico.

 

Outra possibilidade são os projetos em conjunto com unidades da Associação Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII), uma Organização Social mantida pelos Ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, além de receber aportes também, para projetos específicos, do Ministério da Saúde. Pelo modelo EMBRAPII, projetos de PDI são desenvolvidos com aportes financeiros de 1/3 da(s) empresa(s) interessada(s) e 1/3 não reembolsáveis da própria EMBRAPII, sendo o 1/3 restante em recursos econômicos da própria unidade credenciada. Neste modelo, os recursos financeiros para as atividades de engenharia do produto ou do processo são dobrados, havendo ainda a flexibilidade na negociação de propriedade intelectual e direitos de comercialização.

 

Finalmente, existe a Lei 12.598 de 28/03/2012, que define normas especiais para as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e de sistemas de Defesa e dispõe sobre regras de incentivo à área estratégica de defesa. O procedimento licitatório para este tipo de compras tras vantagens para a indústria nacional, podendo: (i) ser destinado exclusivamente a Empresas Estratégicas de Defesa quando envolver fornecimento ou desenvolvimento de Produto Estratégico de Defesa; (ii) ser destinado exclusivamente à compra ou à contratação de produtos e sistemas produzidos ou desenvolvidos no País ou que utilize insumos nacionais ou com inovação desenvolvida no País, e (iii) que assegure à empresa nacional produtora a transferência do conhecimento tecnológico empregado ou a participação na cadeia produtiva. A Lei instituí ainda o Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa – RETID.

  

A junção desses mecanismos modernos de compartilhamento de riscos e financiamento ao PDI pode, por exemplo, ampliar as fronteiras da nacionalização, reduzindo os riscos tecnológicos e também os custos de desenvolvimento, e ainda facilitar aquisições posteriores. Por exemplo, tomemos o caso dos eletrônicos do sistema de pontaria, onde o processador central muito possivelmente teria que ser importado, devido a questões de escala. Existem iniciativas avançadas em ICTs brasileiras para produzir chips de microcontroladores, assim, uma parceria entre uma empresa de maior porte, como a própria IMBEL FMCE – que seria a coordenadora da ação, uma unidade EMBRAPII com certificação em eletrônica e/ou automação, e uma ICT que desenvolva o hardware podem desenvolver a custos baixos  a eletrônica do sistema de pontaria. A própria IMBEL FMCE, detentora de estratégicas capacidades em eletrônica, pode manufaturar os componentes desenvolvidos, que seriam testados pelo próprio EB. Todo o processo pode ser facilitado, ter seus custos reduzidos incentivado e recursos ampliados através dos mecanismos descritos anteriormente.

3. Medidas Emergenciais e Transformativas de Curto Prazo

Medidas de curto de prazo devem ser tomadas, mas já estabelecendo uma nova relação do EB com os fornecedores nacionais. Experiências antigas e recentes das limitações legais e burocráticas impostas pelos diversos agentes do próprio Estado brasileiro mostram que medidas transformativas devem ser tomadas.

3.1. Modelo de Aquisição de Lotes Iniciais

Associado ao modelo de PDI apresentado anteriormente, é possível criar um modelo de aquisição de lotes iniciais que seja uma sequência do de desenvolvimento, mantenha o conhecimento adquirido na indústria nacional e permita o compartilhamento de risco entre os interessados – governo e indústria.

 

Em relação ao sequenciamento do desenvolvimento, uma das características dos produtos modernos, e o blindados certamente o são, é sua complexidade. O desenvolvimento de produtos complexos envolve tipicamente, além dos altos custos, a necessidade de se criar além dos protótipos, lotes iniciais para avaliação. Este modelo é bastante empregado pelo DoD Norte Americano com seus LRIP – Low Rate Initial Production, ou ainda o MoD da Federação Russa, onde, inclusive, produtos complexos como caças, levam anos sendo voados em pequenas quantidades enquanto o produto em sua versão final para produção em maior escala evolui.

 

A proposta seria então de reduzir os custos de PDI com os mecanismos apresentados (EMBRAPII+Lei do Bem) e sequenciar a produção de lotes pilotos fazendo uso da Lei do Bem em associação com o RETID, obviamente considerando empresas que possam se beneficiar de ambos e as possíveis limitações que podem ocorrer quando se combinam benefícios fiscais. A Lei do Bem, por exemplo, permite a produção experimental se esta produção implicar em experimentos reais e, em função dos resultados, em novos estudos de engenharia. Desta forma, pode se considerar que a produção de pequenos lotes, que seriam entregues para avaliações em Ambiente Relevante, ou seja, às unidades que operam os equipamentos no estado da arte, poderiam ter seus custo e riscos reduzidos.

 

Cabe notar aqui dois termos considerados pelos autores, o primeiro é de ambiente relevante, que é um ambiente próximo da realidade operacional. Embora a Lei do Bem se aplique a “experimentos reais”, deve se ter o bom senso de que um ambiente “verdadeiramente real” seria uma situação de combate, assim, esta pode ser substituída por um ambiente próximo, o de treinamento de uma unidade de elite, ou seja um ambiente relevante. O segundo termo é Avaliação, que é diferente de testes, sendo feita no ambiente relevante e com o lote piloto, enquanto que os testes são feitos neste ambiente ou em outros, mas com os protótipos.

 

Em suma, é possível reduzir os custos e riscos para a indústria e manter o projeto evoluindo durante períodos de orçamentos reduzidos através do uso de incentivos fiscais devidamente planejados e empregados desde a fase de desenvolvimento. Os riscos para o adotante, no caso o EB, também são reduzidos, posto que o emprego de lotes pilotos permite fazer alterações com o produto em condições de uso, mas ainda passível de modificações.

Um caso similar, que envolve custos mais baixos, tecnologia mais simples, e portanto, tempos mais curtos também – porém bastante interessante como estudo de caso, é o projeto do Uniforme Inteligente do Exército Brasileiro (http://www.defesanet.com.br/bid/noticia/33269/ABDI—Projeto-Uniforme-Inteligente/). Este projeto passou por uma fase exploratória inicial realizada pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), com participação de empresas que competiram com propostas de provas de conceito para o uniforme. Posteriormente, a ABDI conduziu levantamentos mais aprofundados com participação de representantes das outras Forças Armadas, da indústria e de ICTs, que geraram uma chamada para uma concorrência visando a produção de um lote piloto. Essa concorrência inicialmente focará em aspectos do uniforme em si, enquanto que em uma segunda fase se atentará aos wearables que darão maior consciência situacional e conectividade ao combatente.

 

3. Médio Prazo: Modernização

Inevitavelmente, mesmo diante de um cenário improvável de abundância de verbas, no médio prazo, o Exército deverá buscar a modernização de parte de sua frota atual. E caso seja economicamente viável, deverá mantê-la mesmo diante da presença de uma família de blindados fabricados em território nacional. O uso deste material como meio de instrução serve para poupar o material principal de desgaste prematuro, bem como serve à criação de uma reserva estratégica, como descrito no Item 5.e da Portaria.

 

A Comissão deverá criar uma lista de empresas capazes de fornecer à médio prazo as peças mais comuns de serem consumidas pela frota atual de Leopards IA5. Caso os itens consumidos se revelem impraticáveis, pode-se optar pela compra de modelos usados, dos estoques dos grandes exércitos, para que sirvam de viatura de transição e depois possam ser convertidas também, nos veículos de apoio e especializados. Poucos países mantém um estoque de blindados deste porte e o Brasil poderá recorrer aos estoques americanos do VBCCC M1, que embora apresente bastante limitações, tem custo baixo e facilidade de manutenção, embora esta manutenção não seja necessariamente de baixo custo, uma vez que o conjunto propulsor é uma turbina de aviação. Ainda assim, a grande frota disponível permite aquisição de peças e insumos de diversas fontes. Porém esta opção pode ser uma armadilha política para o EB, sendo este obrigado a ficar confinado por décadas a uma viatura de baixa autonomia, alto custo de manutenção e já obsoleta. Obviamente, o apoio das altas esferas federais terá impacto decisivo na opção final a ser tomada pelo Alto Comando.

 

3.1. Exemplos de Modernizações

Dois exemplos simples e sucintos de modernizações se seguem.

a) VBCCC M60 A3TTS

O Alto Comando deseja que seja estudada a viabilidade de modernização parcial pela indústria nacional, de diversos sistemas do Carro, tais como sistema de controle de tiro, giro da torre, intercomunicação etc. Se isto for inviável, prever que estes carros serão mantidos com os recursos disponíveis até o descarte e possível substituição pelo Leopard IA5.

A experiência conhecida com a manutenção e modificação por terceiros destes veículos, disponível na literatura é a de Israel (os chamados Sabras e Magachs), que optou por impor grandes modificação no modelo, de forma que sua indústria conseguisse suprir os itens necessários à sua manutenção. O país também modificou a extensa frota da Turquia. A quantidade de modificações realizadas por Israel para dar ao M60 condições de se opor ao seu equivalente russo indica que talvez esta opção se revele economicamente inviável. Seus cascos, porém, podem ser usados como veículos lança-pontes, removedores de obstáculos, plataforma de testes de material embarcado, porta-morteiros etc.

Um uso que se pode atribuir é VBCAF (item 7.a.6 da Portaria 162). Este tipo de viatura já existe no exército russo e está sendo incorporado rapidamente no exército americano e em outros grandes exércitos. O casco do M60, livre do peso da torre e reforçado por novo conjunto de reforço na blindagem, pode facilmente receber uma torre automática, portando canhão de baixo calibre, metralhadoras e sensores. A indústria nacional já está apta a realizar esta modificação. Esta viatura serviria para desenvolvimento de doutrina, treinamento e emprego efetivo, até que seu substituto surja, na nova família de blindados nacionais.

Um exemplo típico deste tipo de viatura em uso é o BMPT “Terminator” russo, desenvolvido e fabricado para apoiar a Infantaria em combate, em especial em áreas urbanas. Emprega um casco de um T72, que recebeu reforços na blindagem e uma torre automática contendo 2 canhões de 30 mm, mísseis anticarro, lança granadas e metralhadora de emprego geral. A batalha de Grozny ressaltou de forma catastrófica importância deste veículo nos conflitos contemporâneos (Carvalho e Carvalho, 2019).

Figura 1 – Viatura Blindada de Combate de Apoio de Fogo – T-72 BMPT “Terminator”.

 

b) VBCCC Leopard IA5

O Canadá está tentando vender seus 114 Leopards C2, como anunciou o site do jornal Global News, do Canadá (globalnews.ca). Estes veículos eram originalmente do modelo IA3, mas receberam novas torres do estoque do Bundswehr no modelo IA5 e um kit de blindagem compósito extra tipo MEXAS (Modular EXpandable Armor System) alemão. O MEXAS dispõe de canhão raiado L7A3 de 105 mm totalmente estabilizado que permite tiros de precisão com o veículo em movimento. Dispara todo o arsenal de munição da OTAN (inclusive urânio empobrecido, agora disponível para o Brasil), bem como novas munições desenvolvidas para este calibre, que empregadas em conjunto com miras térmicas e um sistema computadorizado totalmente novo, dão letalidade maior ao conjunto. Pode ser uma compra de oportunidade, para repor as necessidades dos RCBs e uniformizar a frota nacional.

Figura 2 – Leopard C2 canadense, lote de 114 viaturas, posto à venda desde 2017.

 

5. Longo Prazo: Família de Blindados

A principal decisão a ser recomendada pela comissão formada pela Portaria 126, no tocante à futura família de blindados, se refereao percentual de nacionalização das viaturas. Os autores entendem que o sucesso ou fracasso desta empreitada repousa sobre esta decisão e identificam três possibilidades (Carvalho e Carvalho, 2017):

a)Modelo “Totalmente Nacional”. Um modelo totalmente nacional, apenas tendo como base modelos já existentes, é um sonho antigo do Brasil. Houveram algumas tentativas ao longo de nossa história, ao final dos anos 1980 e início dos 1990, que infelizmente não lograram sucesso. Eram modelos simples e de transição, como o Tamoio e o VBCF Charrua, mas cumpriam seu papel e apresentavam as vantagens e desvantagens já discutidas. É um modelo de altíssimo risco para a indústria, em um país onde as autoridades civis e boa parte dos formadores de opinião não tem conhecimento básico sobre a área de Defesa e tenderá a gerar um veículo naturalmente limitado, já que não existe mais conhecimento humano atualizado e acumulado nesta área da indústria brasileira. Tecnicamente, é baixa a probabilidade de um projeto destes gerar um protótipo viável em menos de uma década.

b)Modelo “Projeto Estrangeiro e Nacional – Fabricação Nacional Parcial”. Aqui se enquadra a maior glória e maior amargura da indústria bélica terrestre nacional: o carro de combate EE T-1 Osório. Projeto em conjunto da Vickers britânica com a Engesa brasileira, era um dos melhores CC de sua geração (Dunstan, 2006). Este modelo representa altíssimo risco para qualquer empresário brasileiro, uma vez que os custos de se desenvolver um sistema de armas como este não serão financiados pelo Governo Federal. É verticalizado e de longa maturação. Inclui a fabricação de itens de alto custo e baixa prioridade no país. A Engesa era uma grande empresa e foi deixada ir à bancarrota, com grave perda de quadros técnicos para o Brasil. Seu exemplo não foi esquecido.

 

c)  Modelo “Especificação Nacional Projeto Estrangeiro – Fabricação Nacional Parcial”. Hoje é a alternativa mais segura de se ter um uma família de carros de combate de primeira linha, com chance de ser fabricado em território nacional, ainda que parcialmente. Para defletir os imensos custos de uma empreitada como esta, o EB poderá optar por estabelecer os parâmetros de projeto, e certas características finais que obrigatoriamente deseja ter no veículo, bem como um índice de nacionalização realista e que de fato vise as peças que sejam de alta rotatividade. Desta forma é possível fabricar relativamente pequenas quantidades de blindados, sem comprometer a qualidade nem explodir os custos. Por exemplo, o EB poderá optar por fabricar o casco do CC e a estrutura básica da torre na Alemanha ou nos EUA, já que não existe reposição prevista ao longo da vida útil, para estas duas peças. E então importar os tubos de canhão, motor e caixa de redução. Fabricar a eletrônica, softwares, partes consumíveis da suspensão, componentes elétricos, conjuntos de partes das lagartas, torre remota móvel, sensores críticos, assentos, rodas, partes consumíveis dos motores, itens de comunicação e tudo o que for de alta taxa de substituição e crítico, como já descrito.

5.1 Principais Características da Viatura Blindada Carro de Combate

Como os principais elementos da família são o VBCC e o VBCF, será abordado aqui as características básicas que a Viatura Blindada de Combate Carro de Combate nacional deve possuir e a seguir, a Vtr de Infa. Assim, de acordo com a visão dos autores (Carvalho e Carvalho, 2017), essas definições básicas são aquelas que não se alteram por longos períodos.

a) Conjunto motor Diesel, com cerca de 1500 hp. Ou relação peso/potência mínima de 23 hp/ton, este valor representa a média atual dos carros de existentes no mercado, seus pesos de catálogo, divididos pela potência dos seus motores. Existe uma convergência bastante consistente. Como exemplo pode-se citar o americano M1A2, com suas 65 toneladas de peso e 1500 HP de potência na sua turbina impulsora, o Merkava 4 israelense, de mesmo peso e potência, porém empregando motor à Diesel e por fim o alemão Leopard 2A6, ligeiramente mais leve (62,3 ton). A razão peso/potência deste veículo é de 23 hp/ton (FOSS, 2006). Pode-se considerar, porém, que no futuro haverá adição de blindagem composta extra ou modernizações, enquanto kits inteligentes, que destruam armas anticarro ainda não estiverem disponíveis e tudo isto irá aumentar o peso da viatura.

b) Lagartas não devem exercer pressão média sobre o solo maior que 1 kgf/cm2. Os blindados atuais brasileiros sobre lagartas têm sido capazes de operar em todo território nacional com este parâmetro. Caso seja possível reduzir, melhor. Está ligado ao item acima. Este valor pode ser obtido de maneira indireta, observando que implementos agrícolas funcionam plenamente nas diversas regiões do Brasil e então compilando as informações disponíveis nos diversos catálogos de fabricantes e atlas de equipamentos agrários disponíveis (JAWORSKI, 1997), bem como trabalhos técnicos (HETHERINGTON 1987)

c) Blindagem no arco frontal e torre permanente deve ser capaz de resistir a um disparo de canhão de 125mm russo ou 120mm ocidental. Este tipo de especificação segue as do israelense Merkava (ZIDON, 2012) e alemão Leopard 2 (JERCHEL, 1998). No restante, deve ser capaz de receber blindagem extra até equalização com o arco frontal. O mínimo é a resistência ao ataque de projétil tipo RPG.

d) Sistema de comunicação deve ser capaz de oferecer ligação eletrônica protegida para atualização de dados e de voz com escalão superior devido e de reserva.

e) Sensores devem ser capazes de identificar ameaças nos comprimentos de onda visíveis e infravermelho.

f) Torre disporá de canhão 120 mm de alma lisa padrão OTAN, com capacidade para atualização para 140 mm ou aquele que for escolhido como o padrão OTAN, no futuro, como já apresentado pela Rheinmetall, uma vez que se espera que um CC tenha uma vida útil de cerca de 40 anos (JANE’S, 2016) e durante estes, venha sofrer diversas melhorias.

g) Torre oferecerá metralhadora .50 guiada de dentro da torre, por meio de comando tipo joystick.

h) Torre oferecerá metralhadora 7.62×51 mm para o municiador.

i) Casco permitirá instalação futura de sensores e sistema ativo antimísseis e projéteis anticarro.

j) Alimentação do canhão será manual. A adição do sistema automatizado eleva o custo e o peso do veículo, torna a manutenção mais complexa e o espaço na torre ainda mais confinado. A tendência se amplia com as dimensões ainda maiores do novo canhão de 130mm. A alimentação “humana” é mais rápida e “fácil” de reparar, uma vez que um combatente pesa o a média de um ser humano e em caso de ferimentos, pode ser substituído. Os sistemas empregados, por serem engenhos mecânicos, podem falhar por falta de manutenção, excesso de trepidação, invitáveis impactos e etc. O custo é multiplicado por toda a vida do veículo. Exércitos como o inglês, americano e de Israel não adotaram este sistema até hoje.

k) Existência de camuflagem térmica, como desenvolvida pela Suécia, podendo ser móvel (BAE SYSTEMS, 2011). A existências de sistemas deste tipo, permitem que o veículo ajuste sua assinatura térmica através da leitura da temperatura externa e da sua emulação por painéis cerâmicos que revestem o veículo. Estes painéis também podem assumir cores diferentes, se misturando com as cores ao redor ou assumindo formas similares a outros objetos.

5.2 Principais Características da Viatura Blindada de Combate de Fuzileiros

A Viatura Blindada de Combate de Fuzileiros deve representar o maior salto conceitual neste programa, dando origem de fato a meios que permitam a Infantaria Blindada de combater com apoio de suas vtr e não somente ser transportada por elas. Para tal é condição fundamental o emprego de um CBTP que apresente características de proteção similar a um CC e ainda ofereça apoio de fogo, ressuprimento, informes sobre posicionamento do inimigo e possibilidade de retração sob fogo.

 

Existem diversos modelos hoje empregados pelos grandes exércitos. E basicamente todos foram considerados obsoletos pelos recentes conflitos assimétricos surgidos recentemente. O único modelo atualmente empregado e que parece atender a todos os requisitos impostos pelo seu teatro de operações é o Namer, israelense. Em fase de protótipo, o T-15 Armata russo. Os autores exploraram o assunto e apresentaram no site Defesanet, sob o título “Reflexões Teóricas Sobre Conflitos Assimétricos: Parte II – o Grupo de Combate de Infantaria Blindada e seus Meios”.

           

Então as opções a serem recomendadas ao Comando do Estado Maior divergirão radicalmente em um item: blindagem. Existe a opção “Israel”, que escolheu blindagem igual ao do casco CC. A outra opção, aqui chamada de “Padrão” parece convergir para uma viatura que conta com blindagem básica que resiste em toda a sua extensão até disparos no calibre 14.5 mm e de 30 mm no arco frontal, podendo receber reforço extra de maneira permanente ou na forma de placas extras a serem afixadas em caso de emprego em ação real. Contra munição de baixa velocidade, guiada ou não, os blindados devem receber um sistema como o Trophy israelense, que é capaz de destruir mísseis anticarro, granadas autopropelidas e outras formas de agressão do gênero. Como armamento principal, podem receber uma torre automática ou até tripulada (caso do CV-90 sueco) com armamento que varia desde metralhadoras pesadas até canhão de 40 mm. As armas anticarro podem ser desembarcadas da vtr e montadas em uma posição, caso seja necessário.

           

Os sensores presentes na torre destas viaturas se tornaram também outra característica inovadora, permitindo que a tropa desembarcada tenha acesso ao posicionamento do inimigo instantaneamente, fornecido por sensores térmicos e óticos de grande capacidade e permitindo apoio de fogo de alta precisão, ao guiar os armamentos disponíveis na torre. A letalidade da tropa e dos armamentos é multiplicado pela presença destes equipamentos.

           

Seu peso costuma se situar na faixa entre 25 a 35 ton e deve se movimentar em torno de 60 a 70 km/h. No Brasil deverá transportar um GC de Inf Bld e mais guarnição da vtr.

           

A capacidade tecnológica requerida para se fabricar esta viatura, como acima descrita, é comparável a de um CC moderno e suas variantes, uma vez que o motor e caixa de redução exigidos são menores e a blindagem não é pesada ou composta, na sua versão básica, mas os subsistemas eletrônicos, hidráulicos, de rodagem e sobrevivência são os mesmos dos CCs.

Figura 3 – VBCF CV-90 sueco, armado com canhão Bofors de 40 mm e capaz de transportar GC de 8 homens e mais guarnição de 3.

 5.3 A Família de Viaturas Blindadas de Combate

A família clássica de blindados de combate inclui também Obuseiro Autopropulsado, Antiaéreo, de Apoio de Fogo, Porta Morteiro. A Portaria contempla ainda, no Item 8.d uma ampla gama de outras vtr. Este trabalho, porém, não irá discutir a família de blindados sobre rodas.

a) Viatura Blindada de Combate Obuseiro Autopropulsado M109

O EB parece bastante satisfeito com este modelo e não pretende adquirir outro para esta função. Os autores sugerem à Comissão reunida pelo Estado Maior a inclusão de peças de longo alcance e alta precisão, que empreguem tubos longos e plataformas sobre lagartas. O amplo emprego do modelo M109 pelo exército americano implica que quando existe a necessidade de tiros longos e de alta precisão, será usado munição como a Excalibur, de alto custo por disparo e de origem estrangeira. Os tubos longos podem ser de uso comum com a artilharia rebocada ou transportada por vtr sobre rodas.

 

b) Viatura Blindada de Combate Antiaéreo Gepard

A presença de grandes estoques de munição garante o longo emprego deste veículo. Seu uso vai para além da proteção aproximada, porque pode também ser empregado em conflitos assimétricos, como bem ficou provado pelos russos em Grozny. Os autores sugerem a parceria com empresas para se modernizar o modelo, com a inclusão de mísseis antiaéreos e eletrônica digital que permita as unidades a funcionarem de forma autônoma ou a fazer tiro “cego” controladas por um central com radar situada em posição protegida.

 

c) Viatura Blindada de Combate de Apoio de Fogo

Outra grande mudança conceitual na Inf Bld brasileira, esta viatura tem o potencial de mudar todo o emprego tático desta tropa, como já comentado pelos autores em outras obras e aqui, no Item 3.2. Esta vtr deve ser considerada como parte integrante da família de blindados, empregando casco de CC e torre automatizada.

 

d) Viatura Blindada de Combate Morteiro

A presença a importância do morteiro foi comprovada nos atuais conflitos lutados em diversas áreas do mundo. Do ponto de vista da força blindada, as questões que permanecem são: Calibre, sendo este 81 ou 120 mm; Mobilidade, a peça deve ser fixa no carro ou pode ser desembarcada; Carregamento, retrocarga ou anticarga; Funcionamento, automático ou manual. As diversas opções apresentam vantagens e desvantagens e não parece haver consenso algum. Caberá à Comissão identificar as necessidades de emprego do EB e definir estas opções.

 

5.4 Veículo Blindados Especiais

A Portaria 126 do Alto Comando considera VBEs os seguintes veículos (item 7.e): Socorro, Engenharia, Lança Ponte e Poste de Comando. Ao contrário das outras viaturas, que devem ser produzidas às centenas, estas vtr são de uso bastante específico e talvez se deva considerar simplesmente adquiri-las no mercado mundial. O custo de desenvolvimento e o tempo necessário, irão redundar em vtr de alto custo unitário, se comparadas com as restantes. Seu uso é algo mais limitado e, portanto, o desgaste mais lento que o do material blindado de emprego geral.

 

6. Conclusões

Estimulado pela Portaria 126 do EB, este artigo buscou tratar tanto de questões sobre as características militares dos blindados, quanto das questões que envolvem o desenvolvimento de produtos complexos e seus componentes. Assim, foram ressaltadas as possibilidades de uso de incentivos fiscais e parcerias, de forma a estimular a discussão sobre os possíveis benefícios de uma maior aproximação do Exército Brasileiro das ICT visando reduzir custos e riscos do projeto e do processo de industrialização inicial, seja dos componentes para a modernização, seja da nova família de blindados. No âmbito da técnica militar, apresentou uma revisão das principais características que dominam os modelos existentes e em estudo. Foi adiante e listou algumas sugestões de modelos e modificações possíveis de serem realizadas. Desta forma, os autores esperam ter contribuído de alguma forma para o debate, que sem dúvida é urgente e de grande importância.

 

Referências

ANDERSON, D. M. Build-to-order & Mass Customization. Cambria: CIM Press, 2004.

BAE SYSTEMS, “ADAPTIV – A Cloack of Invisibility”, 2011, disponível em: http://www.baesystems.com/en/feature/adativ-cloak-of-invisibilityAcesso em 26/09/2017

CARVALHO, E. A. ; CARVALHO, R. A. . Um Sucessor para o Leopard 1A5BR no Exército Brasileiro: Um Estudo Prospectivo. A DEFESA NACIONAL, v. CIV, p. 1-20, 2017.

CARVALHO, E. A.; CARVALHO, R. A. Guerras Assimétricas e as Transformações Decorrentes nos Ramos Operativos dos Exércitos: Como os Conflitos Assimétricos forçam a Adição de novas Habilidades em Cada Ramo Específico das forças Blindadas. 2a Edição Olinda: Livro Rápido Editora, 2019.

globalnews.ca/news/4318852/canada-fails-to-find-buyer-for-surplus-army-tanks-final-attempt-to-sell-to-jordan-armed-forces-fizzles/  Acesso em 24/07/2019.

FOSS, C. F., Jane’s Tank Recognition Guide, 4th ed., Smithsonian, 2006.

FREEDMAN, L. The Official History of Falkland Campaign, Volume II: War and Diplomacy. Londres: Taylor & Francis, 2005.

HERRMANN, J. W. et alli. New Directions in Design for Manufacturing. In: 8th Design for Manufacturing Conference, Proceedings of the ASME 2004 International Design Engineering Technical Conferences, Volume 3d, USA, 2004.

HETHERINGTON, J. G. and LITTLETON, I., “The Role of the Mean Maximum Pressure in Specifying Cross-Country Mobility for Armoured Fighting Vehicle Design”, Journal of Terramechanics, vol. 24, no.4, pp. 263-280, 1987.

ISRAEL DEFENSE, “On the Way to the Tunnels”, issue no 32, may-june 2016, pp 76-80.

ISRAEL DEFENSE, “Israel has no problem developing a fighter aircraft – the problem is money”, 2015. Disponível em http://www.israeldefense.co.il/en/content/“israel-has-no-problem-developing-fighter-aircraft-–-problem-money”. Acesso em 25/09/2017.

JANE’S 360, “Gun for the future Tanks”, 2016, Disponível em: http://www.janes.com/article/61205/gun-for-future-tanks-es2016d1 Acesso em 26/09/2017. Acesso em 25/09/2017

JAWORSKI, T. Equipamentos Para Escavação – Compactação e Transporte. Disponíve em: http://www.dtt.ufpr.br/Equipamentos/Arquivos/Apostila de Equipamentos Digitalizada_Tadeo_Jaworski.pdfAcesso em 26/09/2017.

JERCHEL, M. Leopard 2 Main Battle Tank 1979-98, Osprey Publishing, London, 1998.

ZIDON, O.Armored Fighting Vehicles of the Israely Defense Force in the 21th Century, Wizard Publications, Israel (2012)


[i]   Conjunto de diferentes tipos de blindados que compartilham componentes de projeto e construção comuns e integrados, como por exemplo grupo motriz, transmissão e chassis.

[ii]   Em Português: Custo Total de Propriedade.

[iii]  Do Inglês Network Centric Warfare, é uma doutrina que busca converter uma vantagem informativa, oferecida pelas tecnologias da informação e comunicação, em uma vantagem competitiva através da integração de uma rede de forças, geograficamente dispersas, porém bem conectadas e informadas.

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