Analistas dizem que julgamento de militares não deve ser diferenciado

Analistas contrários à posição do Exército – de que militares envolvidos em operações de segurança pública deveriam responder a eventuais processos na Justiça Militar – afirmaram ao UOL que o sistema judicial deve procurar isonomia em todos os casos.

O comandante do Exército, general Eduardo Dias da Costa Villas Boas afirmou à reportagem que a sociedade deveria debater os "efeitos colaterais" de ações militares mais efetivas contra o crime organizado.

Ele sugeriu a criação de instrumentos legais para amparar ações de segurança pública das Forças Armadas no Rio de Janeiro. O general apoiou a aprovação de uma lei que tramita no Congresso e determina que eventuais processos judiciais contra militares por crimes cometidos em ações de Garantia da Lei e da Ordem sejam julgados na Justiça Militar, que em sua opinião é mais rígida e rápida que a Justiça comum.

Atualmente a lei determina que militares que cometam homicídios em operações em território nacional sejam julgados no Tribunal do Júri. Segundo o professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo, Rubens Beçak, embora a proposta não seja inconstitucional e haja jurisprudência de que crimes envolvendo militares sejam julgados em tribunais militares, todos os cidadãos deveriam ser tratados de forma isonômica diante da lei.

"Se alguém é tratado de forma diferenciada, isso gera desconfiança e uma sensação de injustiça", disse o jurista. Segundo ele, em meio ao atual clamor popular por ações das Forças Armadas contra a criminalidade, a Justiça precisa encontrar equilíbrio para julgar sem ser influenciada pelas opiniões da população, mas ao mesmo tempo sem se distanciar muito da realidade das ruas.

Segundo Rafael Custódio, que coordena a área que analisa violência institucional na organização de defesa de direitos humanos Conectas, todos os cidadãos, inclusive os militares, têm que ser julgados de forma igual.

Segundo ele, a ideia sugerida pelos militares soaria como se eles soubessem que vão ocorrer violações de direitos humanos. "Eles [militares] devem sim tomar cuidado para não cometer violações", disse.

Custódio afirmou que as Forças Armadas não têm treinamento para fazer o papel de polícia, mas sim para combater inimigos em uma situação de guerra. Para ele, um emprego melhor dos militares seria patrulhando as fronteiras para impedir a entrada de drogas e armas. Ele disse que deixar que militares fossem julgados por outros militares por crimes contra civis seria conceder um privilégio à classe.

Exceção

O general da reserva Augusto Heleno Ribeiro Pereira, que comandou os militares da missão de paz da ONU no Haiti entre 2004 e 2005, afirmou que é preciso levar em conta a realidade das ruas ao discutir esse tema.

Ele é favorável ao julgamento de possíveis crimes de militares contra civis na Justiça Militar. "O julgamento desses militares pela Justiça Militar não é um privilégio porque a situação atual no Rio é de exceção". Tem que ir na operação para sentir o que acontece.

É fácil falar e se basear em argumentos jurídicos quando se está na sua mesa de trabalho ou sentado no sofá de casa. Quem foi à Rocinha alguma vez sabe que não é fácil", disse.

Segundo ele, é difícil exigir de um soldado de 18 anos um controle emocional perfeito em uma situação de combate. "Ele pode levar 10 anos para ser julgado [na Justiça comum] por ter matado um criminoso que o atacou em uma operação. Isso pode acabar com a vida dele", disse Ribeiro Pereira.

Segundo ele, no Haiti as tropas brasileiras conseguiram pacificar as favelas da capital Porto Príncipe porque as regras que os militares tinham que seguir eram mais flexíveis.

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