Entenda o escândalo no serviço secreto alemão

Antes tido como organização de reputação sólida, quase inatacável, o Departamento Federal de Informações da Alemanha (BND) se tornou recentemente protagonista de numerosos escândalos internacionais.

Segundo as acusações mais recentes, o serviço de inteligência alemão teria espionado companhias e políticos europeus por requisição da Agência Nacional de Segurança (NSA) dos Estados Unidos.

Uma cronologia das polêmicas em torno do BND:

2002: Com os atentados ao World Trade Center ainda recentes, Estados Unidos e Alemanha fecham um acordo de cooperação de inteligência. Autorizado pelo então chefe de gabinete da Chancelaria Federal e atual ministro do Exterior Frank-Walter Steinmeier, o protocolo abre caminho para que alemães ou americanos na Alemanha possam ser espionados.

Tendo como meta declarada o combate conjunto ao terrorismo, a NSA passa a transmitir regularmente ao pessoal do BND os assim chamados "seletores" – endereços de IP e números de telefone – para fins de investigação. O acordo prevê, por outro lado, que os interesses de companhias alemãs ou europeias não sejam comprometidos.
 

2006: Apesar dessa cláusula, funcionários da estação de monitoramento do BND em Bad Aibling comunicam aos quartéis-generais do serviço que alguns seletores fornecidos pela NSA estariam ligados à European Aeronautic Defense and Space Company (EADS), agora chamada Grupo Airbus.

2008: O tabloide Bild am Sonntag vaza um relatório, segundo o qual a NSA estaria tentando usar a central de Bad Aibling – construída pelos EUA na década de 1950 e entregue ao governo alemão em 2004 – para coletar informações sobre a EADS e sua subsidiária EUROCOPTER. Como chefe da Chancelaria Federal, o atual ministro do Interior, Thomas de Maizière, era o responsável pela BND na época.

2010: Um artigo da revista alemã Der Spiegel alega que a Chancelaria Federal havia sido informada que a EADS, a EUROCOPTER e membros do Parlamento francês se encontrariam entre os alvos investigados pala NSA. O então chefe de gabinete da Chancelaria, Ronald Pofalla, teria instado o BND a filtrar com mais rigor os pedidos de investigação da NSA, para assegurar que nem cidadãos e companhias alemães, nem parceiros europeus fossem espionados.

Junho de 2013: O ex-colaborador da NSA Edward Snowden choca o mundo com suas revelações de que a agência de espionagem americana mantinha uma política de rastreamento e monitoramento sistemático de atividades online e telefônicas.

Agosto de 2013: O BND checa os seletores dos EUA usados em Bad Aibling. Segundo a Spiegel, a investigação traz à tona numerosos termos de busca usados em conexão com endereços de e-mail de diplomatas franceses e políticos europeus. Segundo consta, o presidente do BND, Gerhard Schindler, não estava informado.

No mesmo mês desponta a revelação de que o telefone celular da chanceler federal alemã, Angela Merkel, fora grampeado por serviços de inteligência americanos – apenas dias após Pofalla ter assegurado que a NSA se comprometera a não violar as leis alemãs em suas atividades de inteligência.

Março de 2014: O Parlamento da Alemanha instaura uma comissão de inquérito para revelar o âmbito real das atividades da NSA em território nacional.

Agosto de 2014: Vem à tona que o BND havia espionado a Turquia e "acidentalmente" interceptado chamadas telefônicas dos políticos democratas americanos Hillary Clinton e John Kerry.

Março de 2015: O presidente do BND, Gerhard Schindler, declara à Chancelaria Federal que seu pessoal há tempos sabia dos termos de busca irregulares em Bad Aibling, mas apenas recentemente o informara a respeito. Ele também alega nada saber sobre uma lista de cerca de 40 mil seletores que seus funcionários haviam filtrado e excluído do total submetido pela NSA para buscas, desde 2002.

Abril de 2015: Em resposta a uma moção parlamentar do partido A Esquerda, o ministro alemão do Interior, Thomas de Maizière, afirma que "ainda não há indícios sugerindo espionagem industrial pela NSA ou outros serviços dos EUA em outros Estados".

Uma semana mais tarde, a Spiegel noticia que o BND sabia que parte dos seletores submetidos pela NSA desde 2008, durante a gestão de Maizière como chefe de gabinete da Chancelaria Federal, estavam relacionados a companhias europeias de defesa e a políticos franceses.

4 de maio de 2015: Merkel declara que o BND precisa continuar cooperando com seus parceiros internacionais, a começar pela NSA, a fim de "cumprir suas responsabilidades no combate ao terrorismo internacional".

Desdobramentos atuais

Um inquérito preliminar foi iniciado pelo procurador-geral da Alemanha, Harald Rang, o qual será, por sua vez, interrogado pela comissão parlamentar encarregada de esclarecer o caso.

O ministro alemão do Interior, Thomas de Maizière, negou qualquer conduta irregular de sua parte, dizendo saudar a oportunidade de limpar o seu nome na audiência desta quarta-feira (06/05), diante da comissão de inquérito. O atual chefe de gabinete da Chancelaria, Peter Altmaier, também será interrogado.

Políticos da oposição pediram esclarecimento definitivo dos procedimentos internos do serviço nacional de inteligência; muitos querem a renúncia de Maizière e de Schindler. O líder do A Esquerda, Gregor Gysi, exige que Merkel testemunhe, sob juramento, quanto a seu grau de conhecimento sobre as atividades do BND.

 

Notas DefesaNet

A posição da Alemanha  tem tido um caráter dúbio e tortuoso no Affair NSA.  Muitos dos argumentos apresentados pelos alemães são meia verdades, se tal.

1º  Fato – Os alemães ficaram chocado, quando seis semanas após o 11 SETEMBRO, foram informados que 3 dos terroristas viviam em Hamburgo. E muito do planejamento foi feito lá.

2º Fato – O overno Merkel, se não patrocinou, apoiou de forma incisiva as denúncias do espião Snowden. Inclusive com um show de sobrevoo de helicópteros sobre a Embaixada Americana em Berlim.

3º Fato – Os dados apresentados acima, baseados em artigo do Der Spiegel, que clama por vingança após o BND ter demonstrado, que alguns documentos e denúncias apresentadas pela revista eram no mínimo suspeitos.

4º Fato – Os americanos podem ter espionado a EADS (AIRBUS Group), mas certamente buscavam a DCNS e AREVA, bem mais importantes estrategicamente. Empresas que a Alemanha também tinha interesse em espionar pela competição com o estaleiro TKMS e a o mercado mundial de submarinos. Nada melhor que jogar a conta nas costas da NSA.

Assim a Alemanha apresenta uma posição dúbia frente aos países europeus e ao público interno.     

O Editor

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