EUA e Israel, sete décadas de uma aliança estratégica

O presidente americano, Donald Trump, reconheceu nesta quarta-feira (6) Jerusalém como a capital de Israel, em uma histórica ruptura com seus antecessores, que representa um marco em sete décadas de uma aliança estratégica entre os dois países.

– Reconhecimento com discrepâncias –

Em 14 de maio de 1948, David Ben Gurion funda o Estado de Israel ao finalizar o mandato britânico na Palestina. Onze minutos depois da proclamação, os Estados Unidos, sob o governo de Harry S. Truman, reconhece o Estado recém-fundado.

Mas as relações são tensas a princípio. As administrações de Truman e Dwight D. Eisenhower percebem que se aproximar demais de Israel poderia prejudicar o vínculo com o mundo árabe.

Isso leva Washington a se opor fortemente à campanha israelense contra o Egito em 1956, lançada em coordenação com a França e a Grã-Bretanha, e conhecida como a Crise de Suez. Sob pressão dos Estados Unidos, Israel se retira finalmente do Sinai.

– Sólido apoio –

O vínculo se fortalece na Guerra Fria. Durante a guerra árabe-israelense de junho de 1967, Israel ocupa o Sinai, a Faixa de Gaza, a Cisjordânia, o leste de Jerusalém e as Colinas de Golã. Os Estados Unidos se tornam seu principal aliado.

Em outubro de 1967, o presidente Lyndon B. Johnson decide entregar armamento em larga escala a Israel.

Em várias ocasiões, Washington tentou fazer coincidir seu papel de principal aliado de Israel com o de mediador do conflito israelense-palestino.

– Anos de mediação –

Em setembro de 1978, o presidente americano Jimmy Carter reúne o primeiro-ministro israelense, Menachem Begin, e o presidente egípcio, Anuar al Sadat, em Camp David, lugar de férias oficial dos chefes de Estado americanos. Os acordos de Camp David abriram a via para o tratado de paz assinado no ano seguinte por Egito e Israel.

Em setembro de 1993, Bill Clinton orquestra na Casa Branca o histórico aperto de mãos entre o israelense Isaac Rabin e o palestino Yasser Arafat, que selaram um acordo transitório de cinco anos sobre o autogoverno palestino em Gaza e na Cisjordânia.

Em 2000, Clinton culpa Arafat pelo fracasso das negociações de paz da cúpula conhecida como Camp David II, celebrada em julho.

– Tensões não anulam apoio –

O americano Barack Obama e o israelense Benjamin Netanyahu chegam ao poder em 2009 e as relações se tornam um estica e afrouxa permanente.

Em junho daquele ano, Obama pressiona Israeal para que detenha a colonização e se pronuncia a favor da solução de dois Estados.

Em março de 2010, a autorização para a construção de um bloco de residências em Jerusalém oriental ocupada, em plena visita do vice-presidente americano representa um duro golpe para o vínculo bilateral.

Em março de 2015, Netanyahu fala no Congresso dos Estados Unidos contra o acordo nuclear com o Irã, em um desafio claro a Obama, que se negou a recebê-lo durante sua visita a Washington.

Mas em setembro de 2016, ambos assinam um acordo de assistência militar até 2028, na ajuda armamentista mais generosa da história dos Estados Unidos.

Antes do fim do mandato de Obama, as relações se deterioraram novamente quando Washington se nega a utilizar seu veto para bloquear uma resolução do Conselho de Segurança contra a colonização israelense.

– Um vínculo "inquebrantável" –

Com a chegada de Trump à Casa Branca em janeiro passado, Netanyahu diz esperar uma aliança "mais forte do que nunca" com os Estados Unidos. Trump o recebe calorosamente em fevereiro, saudando o vínculo "inquebrantável" entre os dois países.

Em 15 de maio chega David Friedman, o controverso novo embaixador dos Estados Unidos em Israel, um firme defensor da construção de assentamentos israelenses na Cisjordânia.

Em 22 de maio, Trump se torna o primeiro presidente dos Estados Unidos a visitar o Muro das Lamentações, em Jerusalém. Um dia depois, Netanyahu anuncia que Israel receberá 75 milhões de dólares adicionais em ajuda militar dos Estados Unidos.

Em setembro, Israel inaugura com seu aliado americano uma base aérea conjunta, a primeira em território israelense.

Em 6 de dezembro, Trump reconhece Jerusalém como capital de Israel e ordena um plano para a transferência da embaixada dos Estados Unidos, que está em Tel Aviv. No entanto, diferentemente do que havia dito meses antes, ele enfatiza que Washington apoia uma solução de dois Estados como solução para o conflito israelense-palestino.


 

Jerusalém: querida para os muçulmanos mas símbolo de seu fracasso

Jerusalém, ou Al-Quds, em árabe, cidade querida pelos muçulmanos, tornou-se fonte de revolta e um símbolo da derrota para aqueles que, antes, voltavam-se a ela para orar.

Um dia após o reconhecimento pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de Jerusalém como a capital de Israel, a cidade volta a ser a causa de uma nova onda de ressentimento em todo o mundo muçulmano.

Várias vezes capturada, perdida e recuperada pelos exércitos muçulmanos ao longo dos séculos, a cidade é vista como um símbolo de união para os muçulmanos.

Os cruzados cristãos se apoderaram da localidade no século XI para torná-lo a capital do seu "Reino de Jerusalém". Quase um século depois, os exércitos de Saladino (Salaheddine) recuperaram a cidade.

Outros exércitos muçulmanos, os mamelucos, e depois os turcos otomanos controlaram a cidade. Essses últimos permaneceram no poder por quatro séculos, adormecendo qualquer sonho de unidade árabe.

Foram os britânicos que, em 1917, assumiram o controle da cidade, reascendendo o nacionalismo árabe contra o inimigo turco e dividindo a comunidade muçulmana.

Em seguida, a criação do Estado de Israel em 1948 alterou radicalmente a situação: o inimigo comum passou a ser o Estado hebreu.

Neste contexto, a perda de Jerusalém Ocidental durante a guerra de 1948 contra Israel e a parte Oriental da cidade em 1967 constituíram graves afrontas ao pan-arabismo e ao mundo muçulmano em geral.

Na literatura árabe nacionalista e islâmica, na poesia e na música, Jerusalém tornou-se um símbolo de derrota coletiva.

– 'Esposa de seu arabismo' –

"Jerusalém é a esposa de seu arabismo", escreveu o poeta comunista iraquiano Muzzafar al-Nawab. "Então, por que permitiu que todos esses fornicadores da noite entrassem em seu quarto?" Você se sentou atrás da porta ouvindo seus gritos", continua o poeta.

É preciso voltar às origens do Islã, e mesmo antes, para entender essa paixão, especialmente entre árabes e muçulmanos em geral, em relação a Jerusalém.

Se o Corão não menciona seu nome, aparece em textos religiosos como sendo o local da Mesquita Al-Aqsa, de onde o profeta Maomé subiu ao céu para encontrar os profetas antigos, incluindo Moisés, e aproximar-se de Deus.

Durante a vida de Maomé, os muçulmanos se voltavam para Jerusalém para orar antes de se voltarem para Kabaa em Meca.

Mas a cidade manteve sua santidade para os muçulmanos, mesmo vindo em terceiro lugar atrás de Meca e Medina.

Está perto do local do templo do rei Salomão, reverenciado como um grande profeta pelos muçulmanos, que foi construído no século 7, por Omar ibn al-Khattab, o segundo califa, a mesquita Al-Aqsa.

Hoje, este complexo histórico do Monte do Templo é também o local mais sagrado dos judeus. Para os cristãos, é o Santo Sepulcro, onde está o túmulo de Cristo, o que a torna uma cidade santa.

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