PROJETO ESTRATÉGICO GUARANI – Um Ponto de Inflexão
Nelson During
Editor-Chefe DefesaNet
Em reunião decisória do Estado-Maior do Exército (EME) foi decidido desenvolver a Viatura Blindada de Reconhecimento – Média de Rodas (VBR-MR), que é parte integrante da Família de Blindados Guarani.
A decisão era aguardada, há mais de 12 meses, e o atraso refletia várias indecisões no Alto Comando do Exército Brasileiro, entre o projeto original, uma versão 6×6, e atual escolhida em uma plataforma 8×8. Indecisão também relacionada ao armamento principal, que a equiparia, com opções dos canhões de 90, 105 ambos raiados e até um de 120mm alma lisa.
Outro fator de indecisão estava relacionado a influências de potenciais vendas ao exterior e movimentos diplomático-militares na América Latina, onde a VBTP-MR Guarani tem um ponto de destaque.
Qual plataforma: 6×6 ou 8×8?
Tão logo foi apresentado o desenho da Viatura Blindada de Reconhecimento Média de Rodas (VBR-MR), na LAAD 2011, um aceso debate teve início. Em certos momentos foram além de um debate acalorado. Todas as partes apresentavam seus argumentos.
Dimensões da VBTP-MR Guarani 6×6
A Gerência do Projeto Guarani, então sob o comando do General-de-Brigada R1 Waldemir Cristino Rômulo apresentou uma lógica de desenvolvimento e um conceito do Teatro de Operações onde veículos de menor dimensão (com menores assinaturas térmica, radárica e visual), ocupariam um fator preponderante. O emprego crescente de sensores (óticos, radáricos, térmicos, etc), que monitoram e ajudam a tomada de decisões no campo de batalha eram a lógica para grupos embarcados menores e por consequência o emprego da plataforma 6×6. Talves em vez de canhões sistemas de mísseis e armas guiadas.
Esta lógica foi apresentada na ampla entrevista coletiva realizada na LAAD 2011, com o Gen Cristino e a diretoria da IVECO. No caso a VBR-MR teria uma altura menor para ter um centro de gravidade mais baixo e permitir o uso do canhão, naquele momento previsto um canhão de 90 mm ( 2098 mm na VBR x 2340 mm na VBTP). Observar que as forças de recuo do canhão de 105mm são significativamente maiores.
Projeto da VBR-MR 6×6 equipada com canhão 90 mm e torre da CMI (Belga).
A influência do Exterior
A visita inesperada de um simpático senhor, falando espanhol, ao estande do Guarani, na LAAD, querendo saber detalhes sobre o blindado surpreendeu os presentes. Era o ministro da Defesa da Argentina, Sr Arturo Puricelli, que mostrou interesse de o seu país participar do projeto. A partir daquele momento uma série de eventos ocorreram relacionados ao interesse da Argentina na VBTP-MR Guarani. Até o nome, adotado posteriormente, para batizar a viatura, originário das Tribos Indígenas Guarani que povoaram o Brasil, Argentina e Paraguai.
Trocas de visitas dos Ministros Celso Amorim e Arturo Puricelli, mais visitas de missões militares e inclusive acompanhando testes do Guarani no Centro Tecnológico do Exército (CTEx), na Marambaia ocorreram ainda em 2011.
Em todos os momentos os contatos com a Argentina a demanda era por uma plataforma 8×8. Isto não impediu que o Ejército Argentino adquirisse, de forma emergencial, 16 viaturas Guarani para equipar a unidade binacional Argentina-Chile,“Brigada de Paz Cruz del Sur”. As viaturas idênticas às do Exército Brasileiro serão entregues já no ano de 2013, provavelmente no primeiro semestre.
O Exército Brasileiro cedeu sua preferência nas primeiras viaturas de produção do lote de 86 Guarani, adquiridos dentro do PAC Equipamentos.
A Indecisão Técnica – Industrial
A decisão tomada pelo Gen Enzo Peri, quando da licitação para a VBTP-MR (2007), era a busca de um parceiro industrial para levar avante o projeto. Um projeto que significava um pulo de várias década em atualização de tecnologias aplicadas a veículos blindados. O montante do investimento no Projeto Guarani hoje soma cerca de R$ 20 Bilhões, para o lote dos 2.044 veículos previstos para o EB. Para comparação, a FAB estima os 36 caças do Programa F-X2, segundo a Secretaria do Orçamento, em R$ 16 Bilhões.
Somada à indecisão técnica quanto à plataforma houve indecisões quanto ao futuro do projeto. Isto levou à saída do Gen Cristino da Gerencia Técnica do Projeto, no início do ano (2012). O substituto Cel Marco Aurélio de Almeida Rosa, oriundo do Escritório de Projetos do Exército (EPEx), foi nomeado pelo Estado-Maior do Exército, em 16 Agosto passado.
O inconcebível atraso de mais de um ano para a decisão do projeto da VBR-MR e a enigmática foto (ver abaixo), de uma viatura VBTP- MR, plataforma 8×8, equipada com uma torreta tripulada com um canhão de 20 ou 30 mm.abrem questões.
Desenho apresentado pelo Portal do Exército. Mais confunde que esclarece.
Esta viatura é impraticável para ser montado um canhão de 105 mm como foi definido pelo EME. O elevado centro de gravidade tornará instável a viatura a cada disparo. O item pede altura máxima da VBR-MR em 2,30m excetuando a torre e armamento o que certamente será alterado.
Parece ser mais um recado aos potenciais clientes, que logo teremos uma variante de transporte de tropas em uma plataforma 8×8, como desejam os argentinos e sinalizam os chilenos. O grupo de oficiais argentinos presentes ao Armoured Vehicles Brazil, Junho, Rio de Janeiro, foi claro e explícito em afirmar ao autor: "queremos uma versão 8×8 para transporte de tropas inclusive".
A VBR –MR
O desenvolvimento da VBR-MR levará cerca de dois anos. O financiamento será da FINEP, assim como foi da VBTP-MR. A previsão inicial é de que cerca de 60 a 70 % dos componentes sejam comuns à VBTP-MR. O que torna o conceito da Família de Blindados Guarani uma realidade.
Duas das indecisões básicas já foram resolvidas ao menos de forma conceitual. A plataforma será um 8×8 e a arma principal será um canhão raiado de 105mm. O fabricante do canhão e a torre ainda deverão ser escolhidas. Participam várias empresas internacionais, entre outras: a CMI (Bélgica), Rheinmetall (Alemanha), e a OTO MELARA (Itália) com a sua torre HITFIST.
Os requisitos para o armamento principal e o sistema de tiro o tornam com a capacidade de combate similar ao Leopard 1A5BR ou até superior Os dados abaixo constam da Portaria Nº 56-EME, de 16 de Junho de 2011,que aprova os Requisitos Operacionais Básicos nº 02/11, Viatura Blindada de Reconhecimento – Média de Rodas (VBR – MR).
– Torre rotação 360 graus Não é mencionado se há necessidade disparar o armamento principal no arco de 360garus ( requisito 63);
– Armamento principal, canhão com movimento vertical entre, no mínimo, -7º e +18º (menos sete graus e mais dezoito graus), capaz de atingir alvos localizados à distância entre 2.000 m e 4.000 m , com capacidade para disparar, no mínimo, projéteis dos tipos High Explosive (HE), High Explosive Anti Tank (HEAT), High Explosive Plastic (HEP) e Armour Piercing Discarding Sabot Fin Stabilized (APDSFS) (requisito 64);
– Torre com sistema de estabilização que permita a execução de tiros com a viatura em movimento em terreno variado (alvo e viatura) e o rastreamento do alvo após a sua aquisição target tracking (requisito 65);
– Armamento secundário, duas metralhadoras 7,62 mm, uma coaxial ao canhão e outra em reparo na torre (requisito 66);
– Lançadores de granada fumígenas, calibre 76 mm, com acionamento pelo comandante da viatura (requisito67);
– Armamento principal na torre, carregadores ou depósitos para, no mínimo, 10 tiros e 20 tiros no interior da viatura. Total mínimo 30 tiros (requisitos 73 e 74);
– Armamento secundário (7,62mm) na torre 400 tiros e 650 tiros no interior da viatura.Total mínimo 1050 tiros 7,62mm (requisitos 73 e 74).
O conjunto motor -transmissão terá uma versão mais potente do motor FTP Cursor 9 com 410 CV adaptado para o maior peso carregado com o conjunto torre/canhão e munição.
Perspectivas
Caso os testes com o Guarani avancem de forma satisfatória na Argentina, mesmo na versão 6×6, abre a perspectiva mais ampla para o Guarani no mercado Latino Americano.
O Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas do Brasil estuda junto com a Argentina e o Chile a criação da Brigada Internacional de Paz ABC.(Argentina, Brasil e Chile), que substituirá a atual Cruz del Sur. Assim o Guarani poderia ser o futuro veículo padrão da Brigada ABC.
No ano que vem iniciarão os testes operacionais do Guarani em grande unidade do Exército com a 15ª Brigada de Infantaria Motorizada/ 5ª DE, que será transformada em Mecanizada.
O conceito de blindagem e construção do Guarani atraiu grande interesse dos militares colombianos, que têm sofrido continuados ataques com IEDs (Artefatos Explosivos improvisados) pelos grupos Narcoguerrilheiros operando no país.
Caberá ao Gen Sinclair James Mayer (Diretoria de Ciência e Tecnologia -DCT), ao Escritório de Projetos do Exército (EPEx) e ao Cel Marco Aurélio de Almeida Rosa ( gerente Projeto Família de Blindados Guarani) a retomada do Projeto VBR-MR e finalmente ao EME a expansão firme da Família Guarani.
DefesaNet
Nota – Alguns itens selecionados por DefesaNet dos Requisitos Operacionais Básicos nº 02/11, Viatura Blindada de Reconhecimento – Média de Rodas (VBR – MR). Os itens foram agrupados para melhor entendimento do leitor: PORTARIA Nº 56-EME, DE 16 DE JUNHO DE 2011. Aprova os Requisitos Operacionais Básicos nº 02/11, Viatura Blindada de Reconhecimento – Média de Rodas (VBR – MR). 1. TÍTULO VIATURA BLINDADA DE RECONHECIMENTO – MÉDIA DE RODAS (VBR-MR) 2. DESCRIÇÃO DOS REQUISITOS OPERACIONAIS BÁSICOS a. Absolutos 1) Ser operada e manutenida, no mínimo, sob quaisquer condições climáticas da área operacional do continente (AOC).
32) Possuir condições de ser aerotransportada em aeronave do tipo C-130, KC-390 ou similar. TIPO DE VIA DISTÂNCIA A PERCORRER Do Sistema de Armamentos 63) Possuir torre com movimento horizontal de 360º (trezentos e sessenta graus), guarnecida por dois homens (comandante e atirador). b. Desejáveis 1) Possuir sistema de Defesa Química, Biológica e Nuclear (DQBN). c. Complementar |