A arte da Inteligência é assunto de Estado e deve ser primeira prioridade de uma nação

Observer

Especialista em Análises Estratégicas

Especial para DefesaNet

 

A Inteligência não tem sido uma prioridade para o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ou para as Forças Armadas. Isso não é de agora; sempre foi assim. Apenas esperava-se que no governo Bolsonaro ela seria tratada diferente, mas até o momento não foi isso que se viu.

A ABIN não tem feito as aquisições de sistemas e equipamentos para apoio ao trabalho dos agentes de campo ou para análise de informações estratégicas. Seu corpo funcional, mais importante ativo de inteligência disponível, é totalmente selecionado através de concurso público, ou seja, dessa forma jamais será um órgão de inteligência como deveria ser. Seus funcionários são servidores públicos de carreira e não do Estado. Inclusive participam de um sindicato próprio, a AsBIN (Associação dos Servidores da Agência Brasileira de Inteligência).

Os recursos humanos da área de inteligência devem ser recrutados na sociedade e de acordo com as necessidades específicas do serviço. Devem ser jornalistas, engenheiros, diplomatas, artistas, economistas, enfim, o cidadão comum que seja vocacionado por diversos fatores ao exercício da atividade de inteligência.

 

Convite para participação(e posterior recrutamento dos melhores) de cursos de verão, no Twitter, do Government Communications Headquarters (GCHQ), como oficialmente é chamado o Serviço Secreto Britânico ou popularmente o MI6

Diz-se que qualquer jornalista habituado ao trato de assuntos militares ou cobertura internacional possui mais capacidade de coleta e análise de informações de interesse do Estado do que qualquer Oficial de Inteligência, seja da ABIN, PF  ou das FFAA.

O fato do Presidente Jair Bolsonaro saber as informações antes pela mídia comprova aquilo que todos sabíamos: a Inteligência governamental e das Forças Armadas não é eficiente, efetiva e nem eficaz. Ela é cara e na realidade não serve para quase nada.

A inteligência é um assunto estratégico, de alta prioridade nacional e sempre foi vista como uma arte, tamanha é sua importância e a dinâmica da sua atividade. No caso da ABIN ela não pode ser vista como um mero trabalho burocrático executada por servidores aprovados em concurso público (a maior parte meros concurseiros) ou por oficiais da reserva das Forças Armadas chamados para recompletar as fileiras de analistas.

É notória a necessidade de um serviço de inteligência a altura do Brasil, com tentáculos espalhados pelo mundo, buscando coletar e analisar informações que assegurem a manutenção dos reais interesses do país.

O Brasil nunca levou a Inteligência como um assunto sério e prioritário. Alguns dos seus adidos militares em serviço no exterior mais tem o trabalho visto como um prêmio na carreira do que como uma missão a serviço do Estado. Os adidos militares de todos os países, além das suas tarefas burocráticas, são conhecidos como espiões oficialmente acreditados  e deveriam reportar o que acontece nas recepções, visitas, viagens internas e eventos que participam.

Da mesma forma, os brasileiros não vêem a importância de infiltrar agentes no serviço exterior. Sabe-se que em alguns casos os chamados "adidos civis" de diferentes nações nada mais são do que uma fachada para o trabalho de agentes secretos pelo mundo todo. Brasília está cheia deles. Nas festas ou eventos, eles são facilmente identificáveis pelo modus operandi: pessoas belas e simpáticas, ávidas por estabelecer contatos de interesse, quando encontram um alvo mostram-se tão cheios de dúvidas sobre questões nacionais que ficaria difícil acreditar que estão tentando promover seu trabalho oficial.

Sempre entregam um cartão com o título de adido cultural, político, econômico e de imprensa, se fazendo passar por verdadeiros diplomatas de carreira, que lá estão também. Foram selecionados nas universidades ou pela forma como se destacaram no exercício de uma profissão qualquer no seu país de origem,  geralmente foram contratados por tempo determinado e vão embora  tão repentinamente quanto chegaram.

Quando se fala das Forças Armadas, a Inteligência militar precisa ser transformada numa “arma”, ou ter uma carreira específica, com treinamentos e especialidades particulares à coleta e trato de informações, que depois seguindo o ciclo se transformarão em relatórios de inteligência e distribuídas a quem de direito.

Hoje as Forças Armadas carecem de sistemas de interceptação, inteligência eletrônica e de sinais, de guerra eletrônica, aeronaves remotamente pilotadas, sistemas para acompanhamento de mídias sociais, etc. Os programas de aquisições de equipamentos estão parados, as licitações acontecem mas os contratos não têm sido efetivados.

A mais básica e não menos importante das tarefas de inteligência, que é conhecida como OSINT, inteligência de fontes abertas, fruto do contato pessoal com as fontes, da leitura e análise da informação disponível na mídia, ela é desperdiçada pela incapacidade dos analistas em entender o cenário e as informações.

Inteligência é atividade para pessoas inteligentes e vocacionadas.

O Projeto Lucerna altamente estratégico dentro do Exército até o momento não foi implementado(Lamparina que ilumina símbolo da inteligência). O serviço de inteligência militar que melhor funciona, mas drasticamente carecendo de recursos é do Exército, pois os da Marinha e da Força Aérea são muito pouco efetivos, já que não existe uma política de emprego da inteligência e da contrainteligência nas FFAA. 

Diz-se que os serviços militares de inteligência vivem de suporte às operações GLO e acompanhamento dos movimentos sociais; mas não é essa sua tarefa. A Inteligência transcende as operações contra crime organizado e narcotraficantes, isso é tarefa das agências de inteligência policiais. A inteligência militar precisa ultrapassar barreiras e fronteiras, com equipamentos e com recursos humanos.

A história mostrou que a inteligência sempre foi a primeira a entrar e a última a sair de uma guerra, e não foram poucas as vezes que elas as evitaram. Prova disso são as legendárias operações israelenses e russas, onde a inteligência é uma arte cujas missões são tratadas e autorizadas pelos mais altos níveis governamentais. Com investimento constante, grandes orçamentos para tecnologias e operações, a inteligência ainda economiza recursos da nação tamanha é a importância do resultado do trabalho quando ele é efetivo.

O trabalho da Inteligência quando é bem feito é silencioso e não recebe aplausos. Mas quando é criticado pela mais alta autoridade de um país, existe um problema grave acontecendo. E ele também tem que ser responsabilizado por não estar garantindo os recursos necessários.

No Brasil a tarefa de inteligência precisa ser revista e com urgência. Não porquê se tornou pública a crítica de um presidente da República brasileiro, pela primeira vez, dizendo que os órgãos de inteligência do Estado não funcionam como deveriam, mas porque ela é estratégica e cara aos interesses de um país e da Segurança Nacional.

A Inteligência sempre foi e será um dos maiores ativos a disposição de uma nação e dos seus governantes. Ela é fundamental para ajudar a vencer os constantes desafios impostos a um grande país que busca defender seus interesses no competitivo concerto das nações.

O Estado Brasileiro e seus governantes não podem continuar sendo surpreendidos através da imprensa pelos acontecimentos alheios à vontade e aos interesses estratégicos do Brasil.

O destino de uma nação depende do posicionamento correto e da capacidade de decisão dos seus líderes e governantes. Nesse sentido, é estratégico possuir a capacidade de captar e entender as tendências, os sinais políticos, econômicos, sociais e geopolíticos; analisar previamente o cenário presente antevendo os fatos e resultados, para desta forma tomar em tempo as decisões que poderão influenciar de acordo com os nossos interesses, os acontecimentos e o cenários macro-estratégicos do futuro.

Até o mais simples informe vindo da ponta da linha pode criar um alerta e resultar numa decisão estratégica. Lembre-se, onde há fumaça há fogo.

Sem serviços de inteligência fortes, bem preparados e capacitados o Brasil está fadado ao fracasso.

Nota DefesaNet

Para declarações do presidente Jair Bolsonaro na reunião do dia 22 de Abril 2020, o leitor pode acessar a transcrição disponibilizada pela AGU Link

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