Eliane Oliveira
BRASILIA O apoio dos EUA ao Brasil em meio à crise do "setembro negro" de 1982 não foi expresso, publicamente, por meio de exigência formal de contrapartida em futuras negociações comerciais. Mas os americanos pressionavam naquele momento por um alinhamento da América Latina a seu lado na Guerra Fria. "É provável que o governo dos EUA viesse a exercer pressões em todas as áreas e/ou apresentar alternativas que tenderiam a dificultar uma recusa sem uma mobilização política maior. Esta, de conteúdo necessariamente nacionalista, poderia, na atual conjuntura de afirmação de certas lideranças, ultrapassar os limites desejados pelo governo e fugir-lhes ao controle", escreveu o então ministro das Relações Exteriores, Ramiro Saraiva Guerreiro, em alerta ao então presidente Figueiredo no início de 1983.
– Foi um período muito dramático para o Brasil, que ficou muito dependente dos EUA. Os americanos arrancaram várias concessões, entre as quais a nossa adesão ao Código de Subsídios do antigo Acordo de Comércio e Tarifas (GATT) – disse ao GLOBO o embaixador Rubens Ricupero, que foi ministro da Fazenda em 1994.
O código limitava incentivos à indústria brasileira de manufaturas, o que ajudou a manter o baixo nível de crescimento do país nos anos 80, a "década perdida". Os abusos eram tantos, lembrou o ex-ministro da Fazenda Marcílio Marques Moreira, que o próprio Tesouro dos EUA acabou ajudando o Brasil:
– O Tesouro americano alertou a Casa Branca que, se as pressões aumentassem sobre o Brasil, poderiam provocar um grau de irritação tal que eles acabariam não recebendo tudo o que devíamos.
ADIDO AMERICANO NO BC BRASILEIRO
Atual diretor-executivo do Brasil e de mais oito países latino-americanos no Fundo Monetário Internacional (FMI), o economista Paulo Nogueira Batista Jr. disse ao GLOBO que o episódio pode servir de lição para o Brasil:
– Crises de endividamento e balanço de pagamentos atingem a soberania nacional. Esse é um dos custos da dependência financeira de outros países que buscam seus próprios interesses – afirmou Paulo Nogueira, ressalvando tratar-se de opinião pessoal.
Para a equipe econômica de 1982, porém, os EUA foram parceiros fundamentais para a superação da crise no balanço de pagamentos da época. Os EUA eram vistos como essenciais para convencer o resto do mundo de que o Brasil era confiável. Em dado momento, um adido do Tesouro americano passou a ter livre acesso ao Banco Central, conferindo números, para reforçar a credibilidade do país no exterior.
– Essa foi a opção do governo, jogar com as cartas na mesa – disse o ex-diretor do BC Carlos Eduardo de Freitas, então responsável pelas administração das parcas reservas internacionais do país (US$ 4 bilhões em 1982, para uma dívida de US$ 85,5 bilhões).