Usiminas, Embraer e política industrial

IVAN GUETTA

O elo fraco da atividade brasileira tem sido o setor industrial. A participação da indústria de transformação na economia voltou ao nível de 50 anos atrás. O BNDES, apesar de toda a orientação de financiador industrial, tem apresentado crescimento maior de concessões para o setor de serviços que para as indústrias.

Os fundos de private equity praticamente ignoram esse setor como alternativa de investimento. Sem alguma mudança estrutural, o segmento industrial deve continuar sua lenta marcha rumo ao sucateamento.

O governo está determinado a combater a desindustrialização utilizando duas armas principais: medidas para desvalorizar o real e maior protecionismo. Será que juros menores serão suficientes para conter o câmbio? Um IPI maior para automóveis importados ajudará a indústria nacional? Possuir excesso de reservas em dólares permitirá vencer a guerra cambial? Como analistas de empresas, preferimos analisar os pontos acima sob a ótica micro, comparando o perfil de duas grandes empresas da indústria brasileira: a Usiminas e a Embraer.

Em 2003, a Usiminas figurava entre as siderúrgicas mais eficientes do mundo. O Brasil era competitivo na produção de aço perante qualquer país: o dólar valia em torno de R$ 3, o custo da mão de obra era baixo e a energia elétrica barata.

Oito anos depois, o País se desenvolveu e enriqueceu, a moeda local se valorizou, os salários subiram e a eletricidade foi precificada de acordo com forças de mercado para assim reduzir as chances de novos apagões. Sob esse novo ambiente econômico, apesar da exuberante alta das commodities, a Usiminas apresentou no resultado do quarto trimestre de 2011 uma margem operacional de apenas 3% na unidade siderúrgica.

No caso da Embraer, como diversas outras exportadoras, a empresa não obteve benefícios de preço em sua receita advindos do boom das commodities, sofreu com a apreciação do câmbio, com a inflação de custos e com a alta carga tributária.

Entretanto, diferentemente de outras exportadoras, a Embraer continua sendo extremamente competitiva globalmente na manufatura de seu principal produto, sendo hoje a quarta maior fabricante mundial de aeronaves.

A Embraer é reconhecida globalmente pela qualidade de seus aviões, capacidade inovadora de ponta e eficiência na assistência técnica. Com provavelmente a melhor faculdade de engenharia do País, o Instituto de Tecnologia aeronáutica (ITA), como grande fornecedor de mão de obra, aliado a constantes e maciços investimentos em pesquisa e desenvolvimento, a empresa, como seus aviões, se mantém entre as melhores do mundo, apesar das eventuais turbulências macroeconômicas.

Parte da eficiência da Embraer está também associada ao fato da empresa importar componentes de ponta de outros países para compor seu produto final. Permitir às empresas que comprem parte dos insumos e peças dos melhores fornecedores mundiais para, aí sim, agregar valor e inovação localmente é fundamental para se tornar competitivo.

O caso do conteúdo local no petróleo é outro exemplo: ao forçar índices mínimos de conteúdo nacional de mais de 65% para a indústria de petróleo, a regulação acaba por inflar os preços dos produtos nacionais além do que seria razoável e leva a uma produção mais ineficiente e de menor qualidade, pois esgota todos os fatores de produção, em especial a capacidade de mão de obra.

Ao contrário, o país de maior sucesso na indústria naval offshore, a Coreia do Sul, opera com conteúdo nacional típico inferior a 40%. É exatamente a flexibilidade de permitir ao industrial escolher o fornecedor mais eficiente de determinado componente, esteja este onde estiver, que permite àquele país ser competitivo em preço, qualidade e tempo de entrega.

O caminho que está sendo escolhido pelo Brasil, no caminho de uma "argentinização" de sua política industrial, nos ameaça futuramente com os mesmos problemas vividos pelo país vizinho, em que a indústria local começa a ter entraves de produção por não poder utilizar-se de componentes importados, banidos pela mesma política que, paradoxalmente, tencionava proteger a indústria doméstica.

Para o governo, gerar bem-estar aumentando o salário mínimo é simples e de eficácia imediata. Investir em educação e inovação é mais difícil. Porém, se quisermos fazer parte do seleto grupo de países que podem ser chamados de ricos, nossas políticas públicas devem buscar criar no País as vantagens competitivas estruturais, ou seja, aquelas que são perenes e nos permitem alterar a rota do já conhecido e instável voo de galinha, para alcançar novas altitudes na segurança e velocidade de voo das aeronaves a jato da Embraer.

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter