Passados quase dois anos do maior atrito entre EUA e Brasil em razão do programa nuclear do Irã, o presidente americano, Barack Obama, pretende agora "ouvir" sua colega Dilma Rousseff sobre essa questão. O tema estará na pauta americana da visita oficial de Dilma a Obama, marcada para 9 de abril, informou o secretário assistente de Relações Públicas do Departamento de Estado, Michael Hammer.
Washington não esconde o interesse de convencer o Brasil a somar-se ao bloco de pressão internacional para evitar que Teerã obtenha armas nucleares. Apesar de reconhecer as divergências do passado, Hammer insistiu que o País é "um exemplo brilhante para as outras nações sobre o desenvolvimento de energia nuclear pacífica, sob a moldura legal da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)". Trata-se, para ele, de um "tema natural" a ser discutido entre EUA e Brasil.
"Reconhecemos que a opinião do Brasil importa. O Brasil é importante na ONU e ao redor do mundo e tem uma voz relevante", afirmou Hammer. "Nós podemos seguir discutindo esse tema, comparar as nossas avaliações e trabalhar juntos para pressionar o Irã a adotar a via diplomática pacífica. Essa é a questão-chave."
Desde o início do governo Dilma, os EUA alimentam o desejo de ver superado o atrito provocado pelo acordo nuclear obtido do Irã com mediação de Brasil e Turquia, em maio de 2010. O documento trazia o compromisso de Teerã com a troca de 1.200 quilos de seu estoque de urânio levemente enriquecido – 3%, nível suficiente para a geração de energia elétrica – por 120 quilos do material enriquecido a 20%, grau necessário para pesquisas científicas e isótopos médicos no Reator de Pesquisas de Teerã.
O texto, no entanto, não mencionava a proibição de o Irã continuar paralelamente com seu processo de enriquecimento.
O impasse diplomático feriu a relação entre Brasil e EUA no restante do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011). Obama suspendeu sua visita programada ao Brasil em 2010 e a realizou no terceiro mês da gestão de Dilma. Imediatamente após o anúncio do acordo, Washington impulsionou a aprovação de novas sanções ao Irã.
O tema chegou a ser abordado durante a visita de Obama a Dilma no ano passado. Neste momento de ameaça de conflito entre Israel e Irã, o tema ganha outro significado.
Hammer indicou a intenção do governo Obama de igualmente trazer o Brasil para o bloco que, liderado pelos EUA, pressiona pela renúncia do presidente da Síria, Bashar Assad. Trata-se de uma questão particularmente delicada para o governo brasileiro, defensor de uma solução doméstica para a crise síria e avesso às sanções internacionais a Damasco.
"Precisamos do maior número possível de governos dizendo a Assad que ele tem de renunciar e parar com a violência contra seu próprio povo", afirmou Hammer. "Há esforços da Liga Árabe para a abertura de um processo político que permita aos sírios seguir pela via democrática. Essa é a mensagem que queremos ouvir de todos os países interessados em ajudar na solução da questão Síria." Aparentemente, o governo americano não pretende permitir que recentes declarações de Dilma sobre direitos humanos em Cuba azedem o encontro em Washington.
Caças
A agenda estará repleta de temas de especial interesse dos EUA que dormem nas gavetas do Palácio do Planalto. O mais empolgante diz respeito à retomada do programa F-X2, para a compra de 36 caças para a Força Aérea Brasileira. O processo foi suspenso por Dilma, por razões orçamentárias, mas continua em suas mãos. A Casa Branca espera ver o governo brasileiro abandonar a preferência aos caças Rafale, da francesa Dassault, e escolher os Super-Hornet, da Boeing.
"A visita será realizada daqui a quase dois meses. A nossa defesa por essa aeronave (Super Hornet) pode ser levantada, até lá, em diferentes níveis", afirmou Hammer. "Esperamos que, de qualquer forma, esse assunto continue aberto para a nossa proposta."
Segundo o diplomata, os EUA esperam não perder a oportunidade de estreitar a "relação pessoal" entre os dois presidentes durante a visita de Dilma. O governo Obama, na opinião de Hammer, deverá se concentrar na agenda bilateral de segurança energética – biocombustíveis e o petróleo da camada pré-sal. Essa agenda está vinculada à necessidade americana de diminuir sua dependência de fontes instáveis, leia-se Oriente Médio, de petróleo.
Um aumento ainda maior do turismo brasileiro é visto por Washington pela ótica da geração de empregos nos EUA, da mesma forma que o projeto do governo Dilma de prover bolsas de estudos no exterior.
Washington também espera antecipar com Dilma tópicos a serem tratados na Cúpula das Américas, em 14 e 15 de abril, em Cartagena, na Colômbia.
Afinar posições bilaterais, entretanto, raramente é uma tarefa desejável pelo lado brasileiro, como se verificou em 2005 e em 2010. Uma das questões em aberto é a possível participação de Cuba nesse evento – algo rejeitado pelos EUA.