Planalto quer mandar na Vale, mas não diz para quê

Josias de Souza
Blog

A briga Planalto X Vale entrou no round derradeiro. Considerando-se as penúltimas informações, Dilma Rousseff está na bica de levar Roger Agnelli à lona.

Consumando-se o resultado, a companhia vai virar, depois de 14 anos de sua privatização, uma espécie paraestatal.
Deve-se o ataque bolivariano-petista à gestão Agnelli a um veneno que deu às privatizações da Era FHC uma aparência de leilões de fancaria.

A exemplo das telefônicas, a Vale foi ao martelo com os fundões de pensão das estatais e o BNDES no comando do cabo.
Dito de outro modo: empurrou-se dinheiro do Estado para dentro de uma operação que se pretendia privada.

Produziram-se encrencas esperando para acontecer. No caso da Vale, o governo controla, hoje, direta ou indiretamente, 61,51% da companhia. Mas não manda.

Na Vale, quem dá as cartas é Agnelli, um ex-executivo do Bradesco. Indicado pelo banco, ele preside a compahia desde 2001. Já lá se vão dez anos.

O diabo é que o Bradesco controla exíguos 21,21% do capital da Vale. A multinacional japonesa Mitsui detém outros 18,24%.
Considerando-se as regras do estatuto da Vale, o Planalto precisa levar à mesa 75% do capital da empresa para obter o escalpo de Agnelli.

Vem daí que, no curto intervalo de uma semana, o ministro Guido Mantega (Fazenda) reuniu-se duas vezes com Lázaro Brandão, o mandachuva do Bradesco.

O repórter Ancelmo Góis informa que o último encontro ocorreu nesta sexta (25). Segundo ele, o Bradesco concordou em levar Agnelli às cordas.

Participou da conversa Ricardo Flores, o petista que preside a Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil) e que representa os demais fundos no conselho da Vale.

Com o Bradesco do seu lado, o Planalto ergue a luva. O mandato de Agnelli expira em maio. O cruzado de esquerda viria na reunião do conselho da Vale, em abril.

Briga como essa não é coisa trivial. Perto da “Operação Agnelli”, os lances que expurgaram Daniel Dantas do setor de telefonia viram petelecos.

As investidas contra Dantas, o investigado-geral da República, foram feitas sob aplausos. A rasteira em Agnelli deixa a platéia entre apreensiva e assombrada.

Nos seus dez anos de presidência, Agnelli colecionou êxitos e desafetos –não necessariamente nessa ordem.

De estatal combalida, a Vale tornou-se um portento global. É, hoje, a segunda mineradora do planeta, a número um na produção de minério de ferro. Está presente em 38 países.

As vendas da empresa multiplicaram-se por dez. Saltaram de U$ 4 bilhões, em 2001, para 46,4 bilhões, em 2010. As ações valorizaram-se 1.583%.

Num instante em que o jogo parece jogado em favor do governo, fica boiando na atmosfera uma certeza e uma indagação.
A certeza: depois da montagem do cadafalso, sob Lula, o governo Dilma Rousseff descerá a lâmina. A interrogação: para quê?

Na última metade do seu segundo reinado, Lula levou aos microfones meia dúzia de palavras que, juntas, compunham algo parecido com argumentos.

Disse, por exemplo, que a Vale exporta minério bruto quando poderia vender produtos beneficiados, agregando valor à matéria-prima.

Afirmou que a Vale importa navios em vez de encomendá-los no Brasil. Dá a coreanos empregos que poderia prover a brasileiros. Há quem discorde de Lula.

Gente versada na matéria diz que, rendendo-se a Lula, a Vale atenderia aos arroubos nacionalistas do petismo, não às suas conveniências negociais.

De todo modo, havia sob Lula teses que divertiam a audiência e convidavam ao debate. Sob Dilma, há apenas o bailado do ringue. Para quê? Ninguém diz.

Súbito, os debates sobre a Vale se transferem da Bolsa de Valores para a arena política. Bom para as manchetes, péssimo para os negócios. 

A oposição, capaz de tudo, menos de se opor, enxerga no episódio uma oportunidade para mostrar que ainda existe.
Guido Mantega, que distribui socos em nome de Dilma, é objeto de um par de convocações. Uma na Câmara, outra no Senado. Terá de dizer algo.

“Surpreende a forma desastrosa como a substituição foi feita na Vale”, diz o grão-tucano Aécio Neves.

“Não contente com o aparelhamento do setor público, o PT lança as suas garras no setor privado. Isso passou de todos os limites do respeito ao país…”

“[…] Vamos querer ouvir o ministro da Fazenda sobre esse péssimo exemplo ao mundo. É preciso explicar uma ação tão violenta. A partir de agora, quem assumir a Vale sabe que terá que se curvar aos interesses do governo”.

Agripino Maia, novo presidente do DEM, ecoa Aécio: “A operação Roger Agnelli é temerária. Na hora em que o Estado exige a saída de um gestor laureado é de ficar absolutamente perplexo com o que está para acontecer”.

Líder de Dilma na Câmara, o petê Cândido Vaccarezza dá de ombros: “Acho normal a substituição na Vale. Essa mudança era de interesse dos acionistas majoritários”.

Mesmo quem considera "normal" que o dono de 61,51% do capital queira mandar no negócio olha para os números da Vale e repete a pergunta: para quê?

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