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BOEING – CEO JIM McNERNEY – Um céu sem limites para os jatos

 

ANDRÉ PETRY


Quando assumiu o comando da Boeing, em 2005, um McNerney, 63 anos. pegou um rabo de foguete: a empresa estava tisnada por escândalos, com ex-executivos indo para o xilindró, e perdendo contratos relevantes com o governo americano. Hoje, ela é a segunda maior fornecedora do poder público, e McNerney é presidente do Conselho de Exportação, nomeado pelo presidente Barack Obama. Está otimista com o futuro e particularmente interessado no mercado brasileiro. "É imenso”, diz. "Para ser mais preciso: o mercado é grande, e o potencial, imenso." McNerney, que só costuma falar à imprensa estrangeira quando em visita ao país correspondente. abriu uma exceção e recebeu VEJA em seu escritório em Washington para a seguinte entrevista.

O senhor já teve medo de avião?

 Eu tinha uma certa apreensão quando era novo, até a minha adolescência talvez, mas depois me acostumei.

Quando o senhor recebe a notícia de um desastre de avião, sua primeira reação é saber se o avião era da Boeing?

 Minha reação é como a de qualquer outra pessoa,  acredito. Tragédia humana é tragédia humana.

Quando será possível tomar um avião no fim da manhã em Nova Yorlç, almoçar em Londres e voltar para o expediente da tarde?

Uma viagem assim só seria possível com um avião supersônico, mas nossas pesquisas mostram que as pessoas não estão dispostas a pagar por isso. É extremamente caro. Tanto que o supersônico Concorde não foi um sucesso comercial. Para que se volte a ter algo semelhante ao Concorde. será necessário um exame muito detalhado do mercado.

As pessoas estão dispostas a pagar pelo quê?
 
 Por longos percursos com preço razoável  e razoável conforto. Por isso, construímos o 787 Drearnliner. que pode voar em tomo de catorze horas. Os passageiros não gostam de trocar de avião, voltar à fila de embarque, passar de novo pela segurança. Para atender a essa demanda, fizemos o B787 até um pouco menor. As pessoas querem voar de Saint Louis para Cantão. Não querem voar de Saint Louis para Chicago, de Chicago para Hong Kong e de Hong Kong para Cantão. Como reduzimos uni pouco o tamanho do B787. é possível satisfazer essa clientela.

Em janeiro, todos os B787 Dreamliner em operação tiveram de sair de circulação depois de apresentar problemas no sistema de bateria. Foi uma surpresa?

 Uma grande surpresa, mas, de vez em quando, nesse mundo da alta tecnologia em que vivemos, temos surpresas. O sistema de baterias que falhou havia sido testado por três anos e meio, e nunca tinha apresentado problemas. Foi um incidente sério, mas jamais ofereceu riscos à segurança. Havia três outros sistemas de bateria para compensar. Mas o problema está totalmente superado.

Por que os japoneses ainda reclamam?

A segurança é criticamente importante para eles, como é para nós. No Japão, a tolerância com questões de segurança é zero. Respeito isso. Eles estão nos pedindo provas de que não há nada de errado_ Vamos provar_ Está tudo normalizado. Já entregamos 59 aeronaves a dez companhias. Nenhuma brasileira, até agora. Mas um 787 já começou a pousar no Brasil_ num voo da Ethiopian Airlines, que chega a São Paulo e ao Rio.  Até o fim do ano, teremos entregado 110 aeronaves.

É verdade que os enormes atrasos na fabricação do B787 assustaram a Boeing e demais fabricantes, que agora estão fugindo de novos projetos?

A longo prazo, isso não é verdade. Mas estamos entrando numa fase nova_ Demos um grande salto tecnológico com o B787. Foi turbulento, difícil, mas chegamos lá. Agora vamos ,gradualmente disseminar a tecnologia do B787 para  outras aeronaves. É um processo que leva duas décadas ou mais. Talvez por isso se tenha criado a impressão de que os fabricantes não estão investindo em novos projetos.  É assim que a indústria funciona. A cada quarenta anos aparece urna enorme inovação, que depois vai sendo incorporada por modelos subsequentes.

“Em 2080, os aviões  serão feitos de material extremamente mais eficiente, os motores serão até três vezes melhores e menos barulhentos. Os passageiros estarão  conectados através de potentes computadores de pulso”


O B787 é essa enorme inovação?

Sem dúvida. Ele é o que foi o 707 no seu tempo (lançado em 1958, foi o primeiro jato comercial da Boeing e o primeiro de sua classe a se tornar um sucesso comercial). Para as companhias aéreas, o B787 oferece melhor desempenho, eficiência no consumo de combustível, menos dano ambiental, redução de custo. É uma ferramenta de produtividade.

Quais são os ganhos para o passageiro?

O voo é mais sereno, por causa do sistema de amortecimento de turbulência. As janelas são maiores, porque a fibra de carbono é mais forte que o alumínio, de modo que os vãos podem ser mais amplos, e ganhamos também em pressurização. A 38.000 pés de altitude. o ar da cabine é equivalente ao respirado à  5.000 pés. O passageiro se sentirá melhor quando deixar o avião.

Haverá o dia em que os passageiros da classe econômica poderão esticar as pernas?

Estamos tentando construir aviões que permitam às empresas aéreas oferecer mais espaço na classe econômica. Mas são elas que decidem a melhor combinação de assentos para os seus clientes. Nós não temos a palavra final nesse assunto.

A Boeing previu que nos próximos vinte anos serão vendidos 35.000 aviões. O senhor está otimista?

 Muito. E a história mostra que nossas previsões costumam acertar no alvo, com erros pouco significativos.

Mas sempre há empresa aérea à beira da falência, queixando-se de que o negócio é insustentável. Qual é o problema?

Minha razão para otimismo é que a indústria da aviação pode melhorar a vida das pessoas, dos países, das empresas. Podemos fazer do mundo um lugar melhor.  Mas entendo seu ponto sobre a fragilidade financeira das empresas aéreas. Acho que estamos entrando numa outra era, em que haverá mais fusões. É uma tendência na maior parte do mundo.

A TAM se fundiu com a LAN. Nos Estados Unidos, houve a fusão da United com a Continental. da Northwest com a Delta. A KLM juntou-se com a Air France, e a Lufthansa com a Swissair. Acredito que teremos mais dessas consolidações, que resultarão em companhias aéreas financeiramente mais estáveis. Pode até ser que, para a Boeing ou a Airbus. as coisas fiquem um pouco mais difíceis, porque passaremos a lidar com empresas mais poderosas. Mas a era das consolidações vai melhorar a vida dos passageiros mais do que qualquer outra coisa.

As passagens ficarão mais baratas?

É difícil generalizar. Algumas grandes empresas, como a brasileira Gol, são concebidas para oferecer descontos. O propósito delas é combinar um serviço de excelente qualidade com baixo custo. Têm um modelo de negócio em que toda a frota é formada pelo mesmo tipo de avião com um único tipo de motor, o que proporciona grande redução nos custos de manutenção. As outras companhias, que possuem múltiplos tipos de avião com múltiplos tipos de motor. precisam cobrar mais porque seu modelo de negócios é mais caro. Em compensação, oferecem serviços diferentes, voam para o mundo todo. Acredito que seguiremos tendo os dois tipos de empresa, as mais caras e as mais populares. Desde 1973, o preço das passagens teve uma queda real significativa. Mas muitos economistas acham que, de agora em diante, os preços vão se estabilizar e cair de forma mais gradual. Essa é a aposta deles.

Como será o mercado da aviação em 2080, quando nem eu nem o senhor estivermos aqui para conferir o resultado?

 Em 2080, os aviões serão feitos de material extremamente mais eficiente. Os motores serão até três vezes melhores, causarão danos muito menores ao meio ambiente e serão muito menos barulhentos. A bordo, os passageiros estarão conectados com qualquer lugar do mundo através de potentes computadores de pulso. Em suma, teremos mais do mesmo, só que com enormes avanços de motorização,  conforto, segurança, navegação e comunicação.

Por que hoje ainda é tão complicado oferecer internet a bordo?

O complicado é oferecer conexões de alta velocidade com as quais estamos acostumados em terra. É impossível hoje permitir que cada passageiro possa baixar filmes em alta definição de seus provedores habituais. isso requer uma capacidade cerca de mil vezes superior à que existe hoje a bordo dos aviões comerciais.

A Boeing participa das pesquisas no Brasil para desenvolver um biocombustível para a aviação. Quando o senhor acha que esse combustível será viável?

 Está no horizonte visível. Já estamos testando aviões com biocombustível misturado com combustível fóssil. Dentro de dez ou quinze anos, não me surpreenderia se a mistura estiver levando de 20% a 25% de biocombustível.

O maior impacto não será financeiro. Será ambiental. A questão ambiental é uma demanda do consumidor, que pressiona as empresas aéreas. Estas, por sua vez, pressionam seus fornecedores de tecnologia, como a Boeing, a Embraer, para introduzir as inovações.

A Boeing é veterana no Brasil. Como é fazer negócios em um país com burocracia insana e corrupção à larga?

Na maioria dos países em desenvolvimento_ fazer negócios pode ser uni desafio. Eu não destacaria o Brasil como um país dramaticamente pior que os outros. Mas, às vezes, é frustrante.

O senhor pode dar um exemplo concreto de frustração?

 Não me vem nenhum caso concreto à cabeça. Mas, repito,  o Brasil não é pior que os demais.

Qual é a relevância do mercado brasileiro para a Boeing?

O mercado brasileiro é imenso. Para ser mais preciso: o mercado é grande, e o potencial, imenso. O Brasil é a sétima maior economia do mundo, e as limitações de infraestrutura estão travando o crescimento em aviação. Nossa missão é ajudar o Brasil a enfrentar esse desafio. Oferecemos treinamento,  controle de tráfego aéreo, gerência de aeroportos. É preciso libertar as forças do crescimento da economia brasileira, cuja dimensão já permite absorver muito mais tecnologia aeroespacial do que absorve. Nesse sentido,  é um  mercado que compete com o da China, o da Índia e o de outras nações emergentes. O Brasil está entre os países mais importantes para nós.

A Boeing está disputando a bilionária concorrência para vender 36 caças à Força Aérea brasileira. Por que o senhor acha que ela pode ser vitoriosa?

Porque temos um avião muito bom. Uma análise transparente vai demonstrar que oferecemos aquilo de que o Brasil precisa. Mas, claro, a decisão não é minha. O que posso fazer, e estamos fazendo, é oferecer o melhor que temos e compartilhar nossa tecnologia.

Como presidente da Comissão de Exportação do governo, o senhor tem contato frequente com o presidente Barack Obama. Qual é a sua impressão dele?

 Obama foi eleito duas vezes. Portanto, é um presidente popular. Ele é efetivo_ tanto no contato pessoal quanto corno líder dos democratas. Não concordo com tudo o que faz, mas ele me deixa, falar e me ouve. Acho que trabalhamos bem juntos.

O senhor vem muito a Washington?

Uma vez a cada duas semanas.

No Brasil, o sonho de qualquer empresário é poder tocar seu negócio sem ter de ficar beijando a mão de governantes em Brasília.

Aqui também seria o ideal.

Não é o que acontece?

Os líderes empresariais da minha geração cresceram com pouco contato com Washington. Mora, é diferente. O governo está mais envolvido com regulação, com questões que são relevantes para nós. Como resultado, a atual e a próxima geração de empresários precisarão ter mais presença em Washington.

Isso é bom?

 Digamos que, para mim, não está claro que todo esse engajamento do governo seja produtivo.

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