EUA e Brasil investigam negócio da Embraer com a República Dominicana


JOE PALAZZOLO
PAULO WINTERSTEIN

 

Autoridades brasileiras e americanas estão investigando se a Embraer subornou funcionários públicos da República Dominicana para garantir um contrato de US$ 90 milhões e fornecer às forças armadas do país aviões de ataque, de acordo com documentos judiciais e pessoas familiarizadas com o caso.

A investigação está sendo conduzida numa das empresas mais conhecidas do Brasil — a terceira maior fabricante de aviões comerciais do mundo — e parece estar entre as primeiras incursões do país contra uma empresa nacional por suposto suborno no exterior.

Autoridades americanas começaram a investigar a Embraer em 2010 por possíveis violações da Foreign Corrupt Practices Act, uma lei antissuborno conhecida pela sigla em inglês FCPA, de acordo com documentos entregues aos reguladores. Uma solicitação de assistência jurídica enviada no início deste ano pelo Brasil aos Estados Unidos foi obtida pelo The Wall Street Journal e lança nova luz sobre a investigação.

De acordo com a solicitação, analisada pelo WSJ e datada de fevereiro, funcionários do Departamento de Justiça dos EUA e da Securities and Exchange Comission (ou SEC, a CVM americana) abordaram autoridades brasileiras sobre a investigação da Embraer em uma conferência internacional de combate à corrupção em Paris, em março de 2012.

Nos meses seguintes, os americanos disseram que tinham provas — que incluíam históricos bancários e e-mails — que os levavam a acreditar que os executivos da Embraer haviam aprovado um suborno US$ 3,4 milhões a um funcionário dominicano com influência sobre a aquisição de material militar, de acordo com a solicitação, que foi realizada sob um tratado de assistência legal entre os dois países.

O suposto pagamento teria levado o governo da República Dominicana, em 2010, a comprar oito Embraer Super Tucanos, uma aeronave turboélice de ataque e treinamento avançado que tem sido a preferida das forças aéreas dos países em desenvolvimento, segundo a requisição.

A Embraer, que divulgou a investigação da FCPA pela primeira vez em 2011, disse que tem cooperado com as autoridades. Ela contratou o escritório de advocacia Baker & McKenzie LLP para conduzir uma investigação interna depois de receber uma intimação da SEC em setembro de 2010, de acordo com os documentos apresentados aos reguladores.

"Integridade, transparência em suas transações comerciais e ética em suas relações humanas são os princípios que sempre nortearam a Embraer. A empresa exige que todos os seus funcionários mantenham uma conduta de conformidade absoluta com leis e regulamentos, conforme estabelecido em nossas políticas corporativas e em nosso Código de Ética e Conduta", informou a empresa num comunicado enviado por e-mail na sexta-feira. "Devido à investigação que obriga sigilo, a empresa não pode comentar o assunto."

Porta-vozes da SEC e do Departamento de Justiça se recusaram a dar entrevistas. E Fernando Lacerda Dias e Marcello Paranhos de Oliveira Miller, procuradores da Procuradoria Geral da República responsáveis pela investigação no Brasil, não quiseram comentar.

O Brasil nunca processou um indivíduo por subornos no exterior, de acordo com o grupo de combate à corrupção Transparency Internacional.

A Embraer é um alvo de alta visibilidade. A Embraer emprega mais de 18.000 pessoas em fábricas no Brasil, China, Portugal, França e EUA e suas ações também são negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. Nos últimos anos, a empresa tem tentado expandir seu faturamento com aviões militares e jatos executivos. No terceiro trimestre, seu lucro caiu 8%, mas a companhia informou no fim de setembro que tinha uma lista de pedidos firmes a entregar, o chamado backlog, de US$ 17,8 bilhões, o maior nível desde 2009.

O governo brasileiro tem uma participação na Embraer que o permite vetar algumas decisões executivas da empresa.

A investigação sobre a venda de jatos para a República Dominicana está concentrada em um coronel aposentado, Carlos Piccini, que em 2009 atuava como diretor de projetos especiais para as forças armadas da República Dominicana, de acordo com a solicitação dos brasileiros. Piccini é acusado de ter pedido a executivos da Embraer que depositassem os US$ 3,4 milhões em contas bancárias mantidas por três empresas de fachada.

As Forças Aéreas da República Dominicana informaram que Piccini está aposentado e não pôde ser localizado. Telefonemas e e-mails para entrar em contato com Piccini por meio do gabinete presidencial da República Dominicana não foram respondidos. A assessoria do presidente também não respondeu a telefonemas e e-mails pedindo que comentassem o papel das foças armadas na aquisição dos aviões da Embraer.

A Embraer teria supostamente enviado os pagamentos a Piccini por meio de um intermediário, de acordo com a solicitação de assistência legal enviada aos EUA. Os funcionários da empresa teriam tentado ocultar os pagamentos como se fossem honorários pagos para um acordo de venda de aviões para o Reino da Jordânia — uma transação que nunca aconteceu, de acordo com a solicitação de assistência jurídica.

Os EUA têm jurisdição para investigar a Embraer porque as ações da empresa são negociadas na bolsa de Nova York e porque alguns desses supostos pagamentos passaram pelo sistema financeiro dos EUA, de acordo com a solicitação de assistência jurídica. Esses pagamentos foram honrados pelos EUA, de acordo com uma pessoa a par do assunto.

Os EUA foram o primeiro país a proibir o suborno de funcionários públicos estrangeiros na década de 70 e o país processou dezenas de casos na última década. Há muito tempo as autoridades americanas pressionam a comunidade internacional para que se una a elas na batalha anticorrupção.

Os brasileiros abriram uma investigação contra a Embraer com base numa lei que proíbe pessoas a pagar funcionários públicos estrangeiros para ganhar vantagem comercial, de acordo com a solicitação. Em agosto, o país aprovou uma lei que classifica o suborno praticado por empresas como crime, aos moldes da FCPA americana, mas a lei não é retroativa. Quatro investigações de suborno no exterior estão em curso no Brasil este ano, informou a Transparency International num relatório publicado em 7 de outubro.

Vários executivos e ex-executivos da Embraer contrataram advogados norte-americanos dos escritórios Schertler & Onorato LLP, Shearman & Sterling LLP, Williams & Connolly LLP e Zuckerman Spaeder LLP.

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