Marcelo Godoy
Repórter Especial – OESP
Caro leitor,
Uma frase é pronunciada em voz baixa na sede do Comando do Exército, em Brasília. Ela esconde um exemplo, um caso, uma advertência. “Olha o que aconteceu na Venezuela.”
E o comandante do Exército Edson Leal Pujol é desses que se preocupam com o exemplo que vem do vizinho cheio de petróleo. A realidade daquele País não existe apenas nos relatórios dos órgãos de assessoria do gabinete do comando – O Centro de Inteligência do Exército (CIE) e o Centro de Comunicação Social da Força (CCOMSEx).
Pujol, a exemplo de seus colegas generais, sabe o que pensavam os militares venezuelanos, como eram seu treinamento e seus valores, até porque muitos deles faziam cursos no Brasil nas escolas de aperfeiçoamento e de Estado-Maior do Exército brasileiro antes que o coronel Hugo Chávez chegasse ao poder em 1999. Veja aqui como foi.
O que houve com eles desde então? O que pensam diante da catástrofe humanitária provocada pela crise política e econômica que se aprofunda no País? Muitos são os generais brasileiros que veem na cooptação dos colegas venezuelanos pelo chavismo um alerta.
A um amigo, Pujol disse: ‘Quando Chaves chegou ao poder, seus discurso era o do combate à pobreza e à corrupção’. O governo então passou a interferir nas promoções e a política invadiu os quartéis a tal ponto que faz Pujol descrer de que a solução para a crise no País vizinho venha da cúpula militar por meio do reconhecimento de Juan Guaidó como presidente legítimo do País, a exemplo do que já fizeram mais de 50 países, inclusive o Brasil, como você pode reler aqui.
A contaminação política tomou conta dos altos escalões das Forças Armadas venezuelanas. O mesmo, porém, não teria acontecido com os escalões intermediários. Tenentes e capitães estariam sofrendo as mesmas agruras que o restante da população e poderiam ter uma atuação descolada do governo em um processo semelhante ao que levou à queda do salazarismo em Portugal, com o 25 de abril de 1974. Relembre aqui.
A catástrofe que toma conta da Venezuela reforça no comandante do Exército a convicção de que os generais precisam estar atentos para impedir que a política entre no quartéis, mesmo diante da enorme presença de militares no Ministério de Jair Bolsonaro. Nesta semana, o oitavo general assumiu um assento no primeiro escalão.
Bolsonaro foi ao Comando do Exército assistir à posse de Pujol, seu colega de turma na Academia Militar das Agulhas Negras. Na cerimônia de passagem de comando, o general Eduardo Villas Bôas, que tanto advertira os colegas para os riscos da entrada da política nos quartéis, elogiou Bolsonaro, afirmando que ele havia tirado “o País da amarra ideológica que sequestrou o livre pensar” e retirado o Brasil do “pensamento único e nefasto”.
Não se sabe se o que Villas Bôas chamou de pensamento único era o que em política é conhecido como consenso ou o que na visão de mundo de Jair Bolsonaro é classificado como o “politicamente correto”. O fato é que Villas Boâs, que fora nomeado por Dilma Rousseff (PT) e mantido por Michel Temer (MDB), deixou o comando do Exército sem esclarecer se a frase era uma declaração política endereçada aos seu antigos chefes.
Agora, o general ocupa um lugar no Gabinete de Segurança Institucional, dirigido pelo general Augusto Heleno, no Palácio do Planalto. Tornou-se um assessor de um governo, cada vez mais identificado com os militares.