Mark Magnier, de Pequim
A economia da China está andando numa corda bamba.
Preocupado com o fato de que seus fabricantes de baixo custo, que produzem artigos para as grandes empresas do mundo, estão perdendo terreno para países mais competitivos, o governo chinês vem dando incentivos para que esses fabricantes se mudem para regiões chinesas onde os custos são menores. Ao mesmo tempo, o país espera elevar salários e impulsionar o consumo interno ao desenvolver mais a manufatura em setores de alta tecnologia, como semicondutores e robótica.
As autoridades chinesas estão, portanto, buscando um equilíbrio delicado: por um lado, elas tentam impedir que os salários subam rápido demais e enfraqueçam a competitividade de um tipo de trabalho fabril. Por outro, procuram promover outros tipos de emprego para elevar a renda dos chineses e criar uma economia mais dirigida ao consumo.
A China não divulga dados sobre fechamentos de fábricas ou realocações. Mas, segundo uma análise que a pesquisadora Justina Yung, da Universidade Politécnica de Hong Kong, fez para a Federação das Indústrias de Hong Kong, o número de fábricas de propriedade de empresas de Hong Kong no delta do Rio das Pérolas, perto da ilha asiática, caiu em cerca de 35%, para 32 mil unidades, em 2013 ante o auge atingido em 2006. Muitas dessas firmas se mudaram para países com salários menores.
Os custos trabalhistas na China há anos crescem mais rápido que a inflação, segundo a consultoria BMI Research, e atualmente são o quádruplo dos registrados em Bangladesh, Laos, Camboja e Myanmar.
Alguns fabricantes de tecidos e roupas também veem vantagens no Vietnã. “Mudar para o Vietnã é uma tendência”, diz Wang Wei, gerente geral da Guangzhou Weihong Footwear Industrial Co., empresa de solas de borracha e outros componentes para calçados. Em 2013, ela abriu sua primeira fábrica no Vietnã para fornecer matéria-prima à NikeInc.,AdidasAGe Puma SE.Agora, a empresa planeja construir uma segunda fábrica para calçados e migrar várias unidades produtoras de tecidos da China para o Vietnã.
A participação da China na produção manufatureira global alcançou 25% no ano passado, comparado com 7% de 2000, segundo o banco HSBCLtd.Para conter a perda de fábricas para países com salários menores, a China tem oferecido subsídios e uma série de incentivos para as fábricas locais se mudarem para cidades das áreas central e oeste do país, onde os salários são até 30% mais baixos que nas províncias do leste.
A província de Xinjiang, bem a oeste, região que é grande produtora de algodão, recebeu 20 bilhões de yuans (US$ 3 bilhões) em subsídios fiscais, de aluguel e de energia para atrair empresas de tecelagem e confecções. “O país está fazendo coisas malucas para apoiar Xinjiang e a indústria têxtil”, diz Hu Yiteng, vice-gerente geral da Flying Eagle Textile Co., fabricante têxtil que está considerando se mudar para Xinjiang. “É quase lucro garantido.”
A China conseguiu manter sua manufatura de baixo custo por um tempo bem maior que seus vizinhos asiáticos em estágio semelhante de desenvolvimento. Incentivos governamentais, subsídios, um grande mercado doméstico e uma boa infraestrutura, que incentiva as empresas a permanecer no país, contribuíram, diz Karlis Smits, economista do Banco Mundial, autor de um estudo sobre a indústria em transformação da China.
“À medida que você enriquece, você sobe na cadeia de valor e espera que os fabricantes de baixo custo se mudem”, diz Smits. “Mas dados mostram que isso não está acontecendo tanto quanto o esperado” na China.
Ao mesmo tempo, contudo, a China está pressionando as empresas para que se automatizem, elevem seus orçamentos de pesquisa e fabriquem produtos com maior valor agregado. Isso tem incentivado empresas a comprarem concorrentes europeias e americanas com tecnologia avançada. Pequim fixou metas de crescimento anual de 7% para a manufatura e um salto de 15% no investimento corporativo para apoiar a modernização industrial até 2018.
O sucesso que a China teve até agora em agregar valor é visível nas exportações do setor de máquinas e equipamentos de transporte, que cresceram para 46% do total das exportações do país, ante uma média de 21% entre 1995 e 2015, ainda que a participação chinesa nas exportações de menor valor tenha caído, informa o HSBC.
Se a China for bem-sucedida em incentivar uma indústria mais avançada, isso pode sujeitar empresas de países desenvolvidos à competição em mercados que antes consideravam garantidos. Mas a estratégia tem seus riscos. Se a China fracassar em migrar de uma manufatura de base para a de alta tecnologia e seu custo continuar subindo, o país pode ficar preso àquilo que os economistas chamam de “armadilha da renda média”. Isso, por sua vez, poderia elevar as tensões sociais em um sistema monopartidário, cuja legitimidade depende de um crescimento sólido e ascensão social.
O descontentamento com a saída das empresas para o exterior, as demissões e o fechamento de fábricas tende a ser silencioso, considerando o controle sobre a mídia e a obsessão da China com a estabilidade social. A taxa oficial de desemprego do país permanece em torno de 4% há 20 anos, embora alguns analistas acreditem que o nível atual seja mais alto. No primeiro trimestre, 877 protestos trabalhistas foram registrados no país, 35% mais que no mesmo período de 2015, informa o China Labour Bulletin, grupo ativista de Hong Kong.
A frustração tem aparecido nas redes sociais, onde a informação é mais difícil de controlar. “Firmas estrangeiras e chinesas estão saindo da China. Vamos morrer de fome”, escreveu Zhoubo, colaborador do Zhihu, um fórum on-line de discussão.
“A produção de baixo custo vai para o Sudeste Asiático enquanto as indústrias de produtos de alto padrão estão voltando para a América do Norte e a Europa”, disse o usuário Nashuiren no Sina Weibo,uma plataforma de microblogs similar ao Twitter.“Nós, migrantes, não encontramos trabalho. A grande recessão vem aí.”