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CCT – Tamandaré a Projeção do Futuro

Pedro Paulo Rezende

Especial para DefesaNet

 

Brasília — A Marinha do Brasil partiu para uma aposta arriscada com o Projeto Tamandaré: construir unidades menores para recompor a capacidade da Força de Superfície. A decisão levou em conta o avançado estado de envelhecimento da esquadra e o excelente desempenho da corveta V-34 Barroso em duas comissões como capitânia do componente naval da Força Interina das Nações Unidas no Líbano (UNIFIL), em 2015 e em 2017, nas duas vezes substituindo a Fragata F-41 União, da Classe Niterói.

Não é exagero dizer que a sobrevivência da Força de Superfície depende da implantação da Classe Tamandaré. As seis fragatas da Classe Niterói e as duas fragatas da Classe Broadsword, adquiridas da Marinha Real na década de 1990, se encontram em avançado estado de envelhecimento.

As duas corvetas da Classe Inhaúma possuem sérios problemas de manutenção e seu comportamento em alto mar é sofrível. Hoje, a Barroso e o único vetor válido da Esquadra.

O feijão e o sonho

O Programa de Obtenção de Meios de Superfície (PROSUPER) da Marinha do Brasil previa a construção de cinco escoltas de 6 mil toneladas, praticamente o padrão das esquadras europeias, ao custo médio de US$ 700 milhões. Elas seriam complementadas por 12 corvetas (fragatas leves, na classificação internacional) de 2.800 toneladas embasadas no projeto da Barroso.

A escolha de navios de 6 mil toneladas para formar a espinha dorsal da Esquadra tinha sua razão de ser: as condições marinhas do Atlântico Sul, que podem se tornar extremamente agressivas para navios de pequeno porte.

Não se trata de uma questão de segurança apenas, a operação também e afetada: os sensores de bordo e os sistemas de lançamento vertical de mísseis não disparam em condições severas de mar.

Corrigindo erros

Concebidas a partir de um projeto de NaPaOc alemão, as corvetas da Classe Inhaúma foram redesenhadas sem levar em conta as limitações do casco. Ao colocar um canhão britânico de 4,5 polegadas na proa, a ENGEPRON ignorou o impacto que o peso da peça, cerca de 27 toneladas, teria sobre as qualidades marinheiras do navio.

Em alto mar e fora de zonas de combate os seis tripulantes da peça não podem permanecer em suas posições em virtude do volume de água que varria a proa.

O convés de voo instalado na parte traseira da superestrutura é extremamente reduzido e os radares foram colocados em mastros altos demais para garantir a estabilidade dos navios. Em função disto, apresentavam um comportamento deplorável. Em uma missão, a V-31 Jaceguai chegou a perder o ilhós da âncora em condições de mar pesadas.

O projeto da Barroso levou em conta estes problemas. O casco é maior e mais largo. A proa foi ampliada e recebeu “bochechas” copiadas da Classe Niterói para hospedar o canhão de 4,5 polegadas. A ENGEPRON também aumentou o convoo e redesenhou a superestrutura para diminuir a assinatura eletrônica do navio. De uma maneira geral, a corveta mostrou bom desempenho, mas a habitabilidade não está à altura de uma tripulação de 160 marinheiros e oficiais.

Corveta Barroso Foto – EMGEPRON

Tamandaré

A Classe Tamandaré é o primeiro desenho brasileiro desenvolvido para o moderno método de montagem modular. Em lugar de se construir um casco inteiriço em uma doca, ele é fabricado em conjuntos semiprontos com os equipamentos já instalados. Isto acelera e permite maior controle de qualidade o processo. Ao preço unitário de US$ 380 milhões, o navio apresenta grandes aperfeiçoamentos em comparação à Barroso.

A superestrutura foi deslocada para trás e o pesado canhão de 4,5 polegadas deu lugar a um OTO-Melara, de projeto italiano, de 76 mm.

Com a economia de peso e o maior espaço, o Centro de Projetos de Navios instalou três conjuntos de quatro células de lançamento vertical de mísseis MBDA CAMM-M SeaSceptor, de projeto britânico, com 25 quilômetros de alcance, superior ao sistema ASPIDE usado nas fragatas da Classe Niterói.

Sistema Sea Sceptor da MBDA, usa o míssil CAMM-M, adotado para as Fragatas Type 26 da Royal Navy e a futura Corveta Classe Tamandaré da Marinha do Brasil

O conjunto de armas ainda inclui um canhão de 40 mm BAE-Bofors Trinity, sueco, duas metralhadoras .50 belgas, dois lança-torpedos antissubmarinos triplos Mk46, estadunidenses, e quatro mísseis antinavio MANSUP, de fabricação nacional, ou Exocet MM40, da MBDA. O convoo e o hangar possuem capacidade de operar helicópteros Sikorsky SH-60 Seahawk norte-americanos.

O ponto fraco do projeto é o canhão BAE-Bofors Trinity. Há poucas dúvidas de que se tornou obsoleto em um ambiente em que mísseis antinavio supersônicos poderão se tornar a regra. A escolha do sistema de míssil MBDA SeaSceptor, por outro lado, é um armamento extremamente potente para a defesa aérea. Inicialmente, a Marinha do Brasil pretendia equipá-las com um radar de varredura eletrônica, mas, para facilitar a integração com o CAMM-M, terminou escolhendo o BAE Systems ARTISAN, um radar 3D britânico de varredura mecânica, o que ajudou a baixar o custo do projeto, mas com diminuição da capacidade operacional do navio.

Ao emitir os Requerimentos de Informação (RFI), a Marinha do Brasil surpreendeu: permitiu que os licitantes apresentassem produtos próprios como alternativa ao projeto desenhado pelo Centro de Projetos de Navios (CPN).

Esta liberdade permitiu que consórcios liderados por empresas da Alemanha, França, Holanda, Índia, Turquia e Ucrânia apresentassem propostas diferenciadas, muitas com sistemas de combate, canhões e mísseis antiaéreos diversos dos especificados originalmente para o programa. (Vídeo – Rússia Lança Mísseis desde Navios na Síria Link)

Um ponto, no entanto, sera definitivo para a escolha do projeto: o comportamento do navio nas condições severas do Atlântico Sul.

Realismo

A decisão da Marinha Brasileira de se priorizar o programa de construção de corvetas da Classe Tamandaré tem um mérito: é perfeitamente adequada ao quadro de restrição orçamentária, que será imposto às Forças Armadas nos próximos anos. A emenda que estabeleceu um teto para os gastos públicos congelou o orçamento da República por 20 anos em um momento de baixa arrecadação. As despesas serão corrigidas pelo valor da inflação e não serão revistas durante dez anos, mesmo que haja um aumento nas receitas do Estado.

Nesta situação, pensar em manter uma esquadra de alto mar, com porta-aviões e outros meios de projeção de poder, é uma meta irreal.

Isto não significa que os planos ambiciosos traçados pela Estratégia Nacional de Defesa foram abandonados completamente. O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), que visa à construção de quatro unidades convencionais, segue sem mudanças. O programa de construção do submarino atômico, que trouxe autossuficiência na produção de combustível nuclear, também. Ou seja, a força naval terá uma boa capacidade dissuasória em um futuro próximo, no entanto, há uma clara deficiência no número de navios-patrulha.

O quadro só não é mais grave graças à compra de oportunidade de três navios-patrulha oceânicos (NaPaOc) de construção britânica durante a gestão de Celso Amorim. Com 1.800 toneladas de deslocamento, são unidades extremamente capazes para a função.

Tamanho não e documento

Em 9 de outubro de 2015, a Marinha dos Estados Unidos retirou o porta-aviões USS Theodore Roosevelt do Golfo Pérsico, um fato inédito desde 2007. Por coincidência, dias antes, mísseis de cruzeiro Kalibr atingiram alvos na Síria, depois de disparados do Mar Cáspio. O vetor do ataque surpreendeu as marinhas ocidentais: duas pequenas corvetas Buyan-M, de apenas 560 toneladas. O ataque obrigou os peritos navais a uma completa revisão das potencialidades da Marinha da Federação Russa.

Mísseis Kalibr lançados desde plataformas navais.

Para cumprir missões de ataque a alvos terrestres, a Marinha dos Estados Unidos desenvolveu a Classe D-1000 Zumwalt, navios com mais de 14 mil toneladas construídos ao custo de US$ 4 bilhões cada. Perceber que pequenos navios patrulha podiam disparar mísseis de cruzeiro com alcance e poder destrutivo aos usados nos caríssimos super-contratorpedeiros foi um choque para os norte-americanos.

A Marinha do Brasil, em nenhum momento, foi tão ambiciosa. As futuras fragatas leves da Classe Tamandaré foram concebidas para dar proteção antiaérea de área limitada e contra alvos submarinos. A ideia é fornecer proteção a comboios e navios de combate maiores em operações de projeção de força. No futuro, haverá uma capacidade limitada de ataque terrestre a partir da navalização do míssil de cruzeiro AV-MT300, com 300 km de alcance.

 

Teremos um Missil Tático de Cruzeiro MTC-AV-300 Naval?

Duas versões navais estão sob análise: além de alvos terrestres, com guiagem por GPS, o míssil teria uma versão especifica para engajar navios com guiagem final a radar e atualização intermediaria por datalink empregando helicópteros ou submarinos.

Seria interessante que se realizassem estudos para versões mais capazes do navio que será a espinha dorsal da Esquadra, com silos adicionais para o lançamento de mísseis de cruzeiro, inclusive supersônicos, como os BRAHMOS, adotados pela Marinha da Índia. Seriam necessários reforços estruturais importantes, mas a sobrevivência da classe nas próximas décadas dependera, sem dúvida alguma, de sua capacidade de combate.

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