UNITAS Amphibious é fundamental para Brasil atingir seus objetivos militares

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Marcos Ommati
 

O Brasil é o país-sede da UNITAS Amphibious (2015), que é um adestramento militar conjunto entre Fuzileiros Navais de diversos países das Américas. O evento, que está a cargo da Marinha do Brasil, por meio do Comando da Força de Fuzileiros Navais (FN) da Esquadra, está sendo realizado entre os dias 15 e 24 de novembro, no Rio de Janeiro.

Diálogo conversou com o Almirante de Esquadra Fuzileiro Naval Fernando Antonio Siqueira Ribeiro, Comandante Geral do Corpo de Fuzileiros Navais do Brasil (CFN), para saber mais sobre este que é o exercício multinacional naval mais antigo das Américas e outros temas atuais que afetam o CFN.

Diálogo: Qual é a importância para o Brasil em ser o país-sede da UNITAS Amphibious?

Almirante Fernando Antonio: O Brasil se posiciona dentro de uma diretriz que está prevista na Estratégia Nacional de Defesa, preocupado com seu entorno estratégico, leia-se Costa Atlântica da África, ou seja, países Língua Portuguesa que estão nessa Costa, mas também temos ainda Moçambique, Timor e Portugal e, obviamente, toda a América do Sul, e partes do Caribe. Este entorno estratégico é parte integrante dos nossos objetivos como país em termos de relacionamentos internacionais.

E um exercício como a UNITAS Amphibious é perfeito para que a gente exercite nossa contribuição para atingir este nosso objetivo de Estado, que é o de ter esse relacionamento com esses países do nosso entorno estratégico. Essa eu acho que é a importância maior.

Como a crise financeira pela qual o Brasil está atravessando tem afetado o Corpo de Fuzileiros Navais?

Almirante Fernando Antonio: Nós temos sido beneficiados com a realização dos grandes eventos aqui no Brasil, como os Jogos Mundiais Militares em 2011, a Copa das Confederações em 2013 e o Mundial de 2014. Então temos tido oportunidade de receber aporte de recursos financeiros da própria Marinha, bem como recursos do Ministério da Defesa e também de outros ministérios, como por exemplo, o Ministério do Esporte.

E, com isso, nós temos tido oportunidade de manter o Corpo de Fuzileiros em uma situação que eu diria muito boa em termos de equipamento. Quando eu falo equipamento, falo de viaturas leves, viaturas pesadas e os nossos blindados, além de equipamentos não só de comunicações, mas todos aqueles equipamentos que dizem respeito à defesa nuclear química, biológica e radiológica; de varreduras de estádios, descontaminação no caso de alguma ocorrência e também muito material específico da atuação de operações especiais, particularmente contra o terrorismo.

Pode dar um exemplo de aquisição de equipamento em curto prazo?

Almirante Fernando Antonio: A Marinha do Brasil está em procedimento da aquisição do navio Doca de múltiplo propósito, que será batizado com o nome de Bahia e será recebido por nós em poucos meses. Isso vai, sem dúvida nenhuma, conferir aos fuzileiros navais uma capacidade de projeção de poder muito grande.

Ampliar essa capacidade para a MB é importante porque é um meio que tem uma série de possibilidades que podem ser utilizadas no caso do atendimento em apoio à defesa civil em algum desastre natural, ou algo desta natureza. Algum desastre, por exemplo, em uma das nossas bacias petrolíferas. É um meio que tanto opera em situações de apoio à sociedade para facilitar qualquer problema que tenha ocorrido, como também, em operações anfíbias.

Resumindo, nós estamos em condições de executar nossas operações anfíbias dentro do efetivo, dentro de nossas capacidades. Não vejo, no momento, algum setor do Corpo de Fuzileiros que possa vir a ser preocupante, alguma queda na sua qualidade e condição de adestramento.

O Vice-Almirante Alexandre José Barreto de Mattos, Comandante da Força de Fuzileiros da Esquadra, presente à entrevista, fez um aparte.

Almirante Alexandre: A própria gestão de recursos está cada vez mais apurada, mais refinada, com modernas práticas de gestão; elas vão sendo empregadas cada vez com mais frequência e isso também auxilia nesse momento de crise para que não haja um reflexo tão grande assim na Força.

A Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH) deve ser extinta em 2016. Quais foram os principais legados para os militares brasileiros, em especial os Fuzileiros Navais, que participam desta importante missão de paz da ONU desde que foi estabelecida, em 2004?

Almirante Fernando Antonio: O mais importante foi o aspecto "lições aprendidas". Eu acho que ao estudarmos os procedimentos que nós tivemos nas diversas fases da MINUSTAH, inicialmente, com os confrontos com as gangues que estavam estabelecidas no Haiti, depois a atuação efetiva para legitimar um processo eleitoral que foi conduzido depois de muitos anos lá.

Depois, a própria estabilização, controle de áreas etc. aconteceu quando já se pensava em iniciar uma redução das forças militares no Haiti, mas aí veio o terremoto de janeiro de 2010. A partir daí houve uma mudança radical de procedimentos e novamente lições aprendidas. Lições aprendidas que nós acabamos por aplicar, infelizmente, aqui no Brasil. Aplicamos no Chile e temos aplicado em diversos, não só nós, Corpo de Fuzileiros Navais, mas também o Exército Brasileiro que está apoiando inclusive agora esse evento do rompimento da barragem lá em Mariana (MG); lições aprendidas no Haiti no atendimento das operações humanitárias pós-terremoto.

E depois, ao longo desse período, novamente a busca da estabilidade, a preparação da infra-estrutura no país para que possa prosseguir. A ideia da missão das Nações Unidas é essa, ou seja, garantir a estabilidade do país para que ele possa prosseguir com seus próprios meios. Então, um mandato da ONU que foi aprovado pelo Conselho de Segurança no dia 15 de outubro, que defini a atuação da MINUSTAH até o dia 15 de outubro de 2016, diz claramente que a parte das tropas militares será encerrada.

Ele vai mais longe: pretende estabelecer outra missão de paz. Com isso, nós teremos o retorno do nosso pessoal que está lá. Especificamente, para o Corpo de Fuzileiros, eu acho que fica esse grande legado das lições aprendidas. Mas tem muita coisa também da área de material que nós acabamos também tendo como benefício.

Nós nos vimos na necessidade de aplicar recursos muito rapidamente nos chamados equipamentos de proteção balística individual. Nós tínhamos já o nosso colete à prova de balas mas a modernidade dos equipamentos que foram surgindo, os armamentos, exigiram que nós também evoluíssemos na substituição do nosso capacete, na substituição do colete contra empate da placa balística para a proteção de áreas vitais.

Vários itens da equipagem individual foram utilizadas: joelheiras, cotoveleiras, ombreiras, enfim, houve uma preocupação com toda essa equipagem individual básica de combate para dar melhores condições de proteção balística ao combatente fuzileiro naval.

Na área de material, eu creio que o grande legado foi a entrada, ou o retorno, do Corpo de Fuzileiros Navais ao emprego de viaturas blindadas de transporte de tropas sobre rodas. Tivemos também legados na área de doutrina, a preparação do nosso pessoal, a atitude em determinados procedimentos, emprego de simuladores para as ações.

Nós treinávamos com o emprego de simulador tático de infantaria a laser, por exemplo. Eu acho que o conjunto da participação nossa na Missão de Paz do Haiti vai ter durante muitos anos ainda um apoio em tudo aquilo que a gente faz. Isso foi muito importante.

Qual é a participação efetiva do CFN na proteção da chamada Amazônia Azul?

Almirante Fernando Antonio: O Corpo de Fuzileiros Navais tem como vocação maior o seu aspecto anfíbio. Nós somos parte integrante, absolutamente intrínseca, à Marinha do Brasil. Nós somos Marinha do Brasil. Temos a participação em tudo aquilo que diz respeito à Amazônia Azul e mais, todo aquele aspecto do entorno estratégico nosso pressupõe o Atlântico Sul e o litoral da América do Sul, além do litoral da África.

O controle dessa região do Atlântico poderá ser necessário se fazer através do controle de determinadas bases, determinadas ilhas e determinados pontos estratégicos nesse litoral e é exatamente isso que está previsto na Estratégia Nacional de Defesa.

A Competência para as operações nas Ilhas Oceânicas é do Corpo de Fuzileiros Navais, e isso está claramente definido. A Estratégia Nacional de Defesa define, ainda, que a Marinha deve ter um Corpo de Fuzileiros Navais em permanente estado de prontidão operativo para atuar na proximidade da projeção do poder.

E essa projeção de poder se dará nessa circunstância sobre o litoral que será hostil, ou não, com consentimento ou não, do governo instalado lá para a realização de um daqueles tipos tradicionais de operações anfíbios e essa é a vocação natural do fuzileiro naval.

E como se dá essa presença?

Almirante Fernando Antonio: A presença nossa nesse entorno estratégico se dá através do que se chama hoje Soft Power; se dá na Costa da África, na Namíbia, auxiliando a Marinha deles a construir seu Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha. Ela se dá também em São Tomé e Príncipe na formação de Fuzileiros Navais da Guarda Costeira das Forças Armadas da República Democrática de São Tomé e Príncipe, enfim, nós temos realmente já essa participação no Oceano Atlântico.

No que diz respeito à Amazônia Azul nós temos a obrigação de garantir a segurança dos nossos meios, inclusive no que diz respeito às ameaças assimétricas. Nós vemos a ação da pirataria que, com certeza, exige que nós tenhamos gente habilitada para atuar nos chamados Grupos de Reações Assimétricas.

Então, o exemplo que eu dou é do nosso Navio Capitânia da Força-Tarefa Marítima que está no Líbano (UNIFIL), que tem um destacamento de Fuzileiros Navais embarcados, e uma parte desse grupo embarcado é justamente um Grupo de Reações a Ameaças Assimétricas.

E com relação à Amazônia verde?

Almirante Fernando Antonio: A Estratégia Nacional de Defesa estabelece os nossos limites de atuação: as Forças Navais, a Flotilha da Amazônia, os navios do grupamento de patrulha do Norte, enfim, a presença dos Fuzileiros Navais é para garantir o controle dessas vias navegáveis. A atuação na área interior da Amazônia pertence à Força-Terrestre, ao Exército Brasileiro. Nós temos que estar aptos a atuar no controle das margens que permitem o controle das vias navegáveis. É uma divisão de tarefas que existe entre o Grupamento Operativo dos Fuzileiros Navais e o Batalhão de Infantaria de céu do Exército Brasileiro claramente definido.

E qual a previsão de transformação dos grupamentos de FN de Belém (PA) e Ladário (MS) em Batalhões de Operações Ribeirinhas, para dar mais ênfase à presença militar na faixa de fronteira?

Almirante Fernando Antonio: Eu espero que o de Belém, dependendo da documentação e outros trâmites necessários, seja para 2017. Já o de Ladário seria um horizonte mais à frente que eu não imagino tão próximo. Classificaria Belém a curto prazo, Ladário a médio prazo e outro grupamento, que você não mencionou, o de Tabatinga, este sim a longo prazo, já que não temos nada lá em termos de Fuzileiros, a não ser o próprio Batalhão de Operações Ribeirinha de Manaus, que é destacado lá. Nós teríamos que construir instalações e etc. Essa é a estrutura que nós temos na região da Amazônia Verde.

Qual a importância de realizar exercícios conjuntos e outros entre o CFN e os Estados Unidos, de um modo geral, e com o Comando Sul (MARFORSOUTH) de uma maneira mais específica?

Almirante Fernando Antonio: Para mim é muito gratificante trabalhar com os Marines. Pessoalmente, desde que eu era segundo tenente, tive contato com os Fuzileiros Navais dos EUA, fazendo o Curso de Oficial de Estado-Maior. Imagine, um segundo tenente fazendo um curso de Estado-Maior de Logística específico para operações anfíbias! A nossa doutrina, hoje, é uma doutrina própria, mas nós absorvemos muita influência do Marine Corps e isso foi algo natural que ocorreu após as grandes campanhas anfíbias na Segunda Guerra Mundial.

Essa influência foi algo natural e a minha geração é uma geração pós-Segunda Guerra Mundial que quando profissionalmente começou a ocupar seus primeiros postos já tinha essa influência através de manuais, de cursos nos Estados Unidos, e assim por diante.

Fui oficial de intercâmbio no Second Marine Division, que é a principal unidade operativa do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos e ver hoje, como Comandante Geral do Corpo de Fuzileiros Navais e anteriormente como Comandante da Força de Fuzileiros da Esquadra, e comandando uma das Forças da Força de Fuzileiros da Esquadra, essa participação, essa integração com os Fuzileiros Navais dos Estados Unidos é bastante gratificante.

Também é bastante gratificante ouvir deles, com sinceridade, que nós estamos no caminho certo, que nós estamos com um nível de adestramento, de aprestamento operativo, de prontidão, num grau bastante elevado, à altura da necessidade estratégica do nosso país. Eles têm uma consideração bastante grande pelo Corpo de Fuzileiros Navais do Brasil.

Tanto é verdade que eles trazem o pessoal dos Estados Unidos aqui para fazer adestramento conosco, independente da UNITAS. Nós temos tido a participação deles em adestramentos normais do dia-a-dia no nosso pessoal aqui.

A presença de um oficial Fuzileiro Naval dos Estados Unidos dentro do Estado-Maior da Divisão da Força de Fuzileiro da Esquadra é uma prova disso.

Os Marines participam conosco nos exercícios anuais em Formosa (Brasília) e isso já vem de alguns anos. Então eu acho que essa integração vem acontecendo bem já há alguns anos.

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