ROSANA HESSEL
A presidente Dilma Rousseff se aproveitou do isolamento do mandatário russo, Vladimir Putin, depois da crise com a Ucrânia, para lhe estender a mão e tirar vantagens nas relações comerciais com a Rússia. Diante da fragilidade da economia brasileira e da desconfiança do empresariado, a determinação do Palácio do Planalto foi mostrar que o governo está agindo para abrir mercados aos produtos nacionais no exterior.
Apesar do esforço, tudo, por enquanto, são promessas. Os dois presidentes assinaram oito acordos e memorandos para ampliar a cooperação entre os dois países em áreas nobres como defesa, ciência e tecnologia e energia. Eles já haviam se encontrado no domingo, durante a final da Copa do Mundo, e vão se sentar à mesa, hoje, em Fortaleza, durante a VI Reunião de Cúpula dos Brics, grupo que reúne, além das duas nações, China, Índia e África do Sul. Esses países respondem por 20% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. O evento contará com a segurança de 7,6 mil homens.
A reunião de ontem no Planalto, que era para durar 40 minutos, estendeu-se por uma hora e vinte e atrasou a ida dos dois líderes ao almoço com a comitiva russa no Palácio do Itamaraty, previsto para as 13h. Nessa hora, Dilma e Putin apareceram para a declaração à imprensa e o anúncio dos acordos. Alguns deles foram confeccionados às pressas. Tanto que autoridades que os assinaram nem sequer sabiam o conteúdo dos documentos faltando meia hora para o término do encontro.
Base de Alcântara
O principal desses atos, firmado entre os ministérios da Defesa dos dois países, dá continuidade nas negociações para a compra brasileira de um sistema antiaéreo russo. O valor da bateria não foi revelado, mas é pequeno, segundo fontes do setor. Mas o que interessa aos russos, conforme os mesmos especialistas, são os contratos de manutenção e de fornecimento dos foguetes, que criarão um vínculo do Brasil com os fornecedores por, no mínimo, 10 anos. Moscou tem interesse em substituir a Ucrânia como parceiro na empresa binacional na base de Alcântara, mas terá de ser paciente até que o contrato caduque por falta de investimentos de Kiev. As conversas têm avançado, contudo as autoridades evitam tocar no assunto.
O Brasil foi convidado pela Rússia para participar de exercícios militares com sistema Pantsir-S1, em agosto de 2014. Dilma demonstrou interesse na compra do equipamento. "Instruímos nossos negociadores a dar continuidade ao acordo para a aquisição, pelo Brasil, de unidades do sistema russo de defesa antiaérea. Isso porque buscamos com a Rússia uma relação de longo prazo", disse. O país de Putin é o principal destino de carne bovina brasileira. E esse é o maior poder de barganha dos russos em relação ao Brasil, tanto que um grande frigorífico nacional chegou a fazer lobby para que o Planalto comprasse os equipamentos russos.
A corrente de comércio entre as duas nações foi de US$ 5,65 bilhões, em 2013, e a meta é chegar a US$ 10 bilhões nos próximos anos, o que poderá ajudar a melhorar a balança brasileira, que caminha para um deficit histórico neste ano. As exportações para a Rússia somaram US$ 2,9 bilhões e as importações, US$ 2,6 bilhões, no ano passado. O saldo comercial foi positivo em US$ 300 milhões para o Brasil, US$ 50 milhões a menos que o registrado em 2012, e muito abaixo dos US$ 2,5 bilhões de superavit registrado em 2006.
Na área de energia, foi assinado um protocolo de intenção para o estudo, entre os dois países, para a exploração de gás no Projeto Solimões da Petrobras e para a formação de tarifas e o uso sustentável de energia.
Condições confortáveis
No almoço no salão Brasília, no Itamaraty, os dois presidentes, ao realizarem o brinde protocolar, destacaram a afinidade internacional e a cooperação, inclusive, econômica. Putin afirmou que seu país vai criar "condições confortáveis" para os empresários brasileiros no mercado russo. O presidente russo agradeceu a "acolhida calorosa" e o "ambiente construtivo das negociações". Destacou ainda as áreas de energia, da construção civil e farmacêutica com "enorme potencial econômico" em ambos os países.
Durante o discurso, a presidente afirmou que os dois países aprofundarão ainda mais a "parceria estratégica" em infraestrutura, energia, relações econômicas e comerciais. "Essa maior aproximação não é fato circunstancial, mas imperativo no mundo multipolar.
(Colaboraram Grasielle Castro e Gabriela Walker)